Texto de Catarina Fernandes Martins
A polícia dinamarquesa divulgou esta segunda-feira que Peter Madsen alterou a história que mantinha desde que foi detido preventivamente por suspeita de homicídio da jovem sueca. O inventor que primeiro disse que Kim Wall foi vítima de um acidente, diz agora que a jovem morreu por inalação de monóxido de carbono a bordo do seu submarino, continuando a negar ter assassinado Wall.
«Ele disse que Kim Wall morreu em resultado de uma intoxicação por monóxido de carbono a bordo do seu submarino», disse a polícia, citada pela AFP.
«Além disso, Madsen admitiu ter desmembrado o corpo de Kim Wall e espalhado os membros no mar», continua o comunicado das autoridades dinamarquesas.
A jornalista esteve desaparecida durante mais de dez dias, até que a 21 de agosto o seu corpo mutilado foi encontrado por um ciclista numa praia.
Kim Wall desapareceu na noite de 10 de agosto, depois de ter embarcado numa viagem ao largo da costa de Copenhaga num submarino artesanal para entrevistar o inventor Peter Madsen.
A jornalista esteve desaparecida durante mais de dez dias, até que a 21 de agosto o seu corpo mutilado foi encontrado por um ciclista numa praia 50 quilómetros a sul da capital dinamarquesa.
Kim Wall foi vista pela última vez a embarcar no submarino do inventor Peter Madsen, sobre quem estava a preparar um perfil jornalístico. Antes deste incidente, Madsen era já uma figura conhecida na Dinamarca devido aos projetos excêntricos e ambiciosos que levava a cabo.
Na sua página da Wikipedia, é descrito como um engenheiro aeroespacial autodidata, um artista e construtor de submarinos. Madsen orgulhava-se particularmente de ter construído o UC3 Nautilus, que garante ser o maior submarino do mundo de construção artesanal. Foi esse o submarino que Kim Wall visitou antes de desaparecer.
Madsen disse então que na noite de 10 de agosto havia deixado Kim Wall no porto de Copenhaga. Mais tarde contou às autoridades outra história.
O namorado de Kim Wall deu conta do seu desaparecimento na madrugada de dia 11. O submarino artesanal de Peter Madsen não estava equipado com um sistema de GPS pelo que levou muitas horas até ter sido encontrado. Inicialmente pensou-se que Peter Madsen tinha sido vítima de um naufrágio, mas quando as autoridades localizaram a embarcação, encontraram sangue no interior, o que levantou suspeitas.
Madsen disse então que na noite de 10 de agosto havia deixado Kim Wall no porto de Copenhaga. Mais tarde contou às autoridades outra história – um acidente no submarino havia provocado a morte da jornalista sueca. Madsen disse ter «enterrado» Kim Wall no fundo do mar.
A polícia de Copenhaga disse no dia 14 de agosto que o submarino afundou na sequência de um ato deliberado. Durante mais de dez dias, ignorou-se o paradeiro de Kim Wall.
O que aconteceu a Kim Wall?
Sabe-se que o corpo de Kim Wall sofreu a pressão de um metal para permitir que se afundasse. Uma autópsia revelou ferimentos de faca nos genitais e caixa torácica da jornalista.
Em agosto, a polícia de Copenhaga pediu a pessoas que viajaram com Peter Madsen antes do incidente para explicarem o que acontecia nessas viagens.
No início de outubro, as autoridades dinamarquesas encontraram vídeos de mulheres a serem torturadas, decapitadas ainda vivas e queimadas no disco externo de Peter Madsen.
O dinamarquês disse que o disco externo encontrado não lhe pertence. O procurador dinamarquês Jakob Buch-Jepsen disse que as suspeitas sobre o envolvimento de Peter Madsen na morte de Wall se adensaram depois de este ter comparecido em tribunal no dia 5 de setembro. O mesmo tribunal decidiu que Madsen vai continuar detido.
Quem era Kim Wall?
Kim Wall nasceu há 30 anos em Malmo, na Suécia, mas há muito que vivia fora do país de origem. Wall estudou Relações Internacionais na London School of Economics e fez o mestrado em Jornalismo e Relações Internacionais na Universidade de Columbia, em Nova Iorque.
Durante a sua curta carreira fez reportagem a partir da Coreia do Norte, Cuba, Sri Lanka, Uganda, e Haiti e as suas histórias foram publicados pelo New York Times, Guardian, Vice e South China Morning Post. Desde março de 2016, Kim vivia entre Nova Iorque e Pequim e planeava mudar-se para a capital chinesa com o namorado.
Entre os colegas e amigos, Kim Wall era conhecida pelo espírito aventureiro e por um olhar especial que encontrava histórias originais e fora do radar dos media tradicionais.
Entre os colegas e amigos, Kim Wall era conhecida pelo espírito aventureiro e por um olhar especial que encontrava histórias originais e fora do radar dos media tradicionais. Histórias que a levaram a todo o mundo. Como ela própria se descrevia na conta de Twitter, Kim interessava-se por «hackers, vampiros, vodu, Chinatowns, bombas atómicas e feminismo».
Como jornalista freelancer, Kim viajava geralmente financiada por bolsas de organizações internacionais e trabalhava em equipa para poupar custos.
A diretora executiva da International Women Media Fund uma dessas organizações, Nadine Ellen, disse à Notícias Magazine que a organização «está de luto» pelo «silenciamento» de um elemento da comunidade. «A Kim era uma contadora de histórias talentosa que nos encantou a todos com as suas bonitas reportagens que tantas vezes eram sobre temas fora do radar. A morte de Kim está a ter um efeito devastador na comunidade global de mulheres jornalistas que apoiamos», disse.
Amigos e familiares da jornalista sueca lançaram uma campanha de crowdfunding para angariar fundos para uma bolsa de reportagem em seu nome. Já juntaram 124 mil dólares.
No início de setembro, amigos e familiares da jornalista sueca lançaram uma campanha de crowdfunding para angariar fundos para uma bolsa de reportagem em seu nome. A bolsa pretende preservar a memória de Kim Wall e ajudar mulheres repórteres cujos interesses profissionais se assemelhem aos da jovem sueca. Até agora, os organizadores conseguiram juntar mais de 124 mil dólares (aproximadamente 107 mil euros), de um objetivo total de 200 mil (cerca de 173 mil euros).
«A bolsa de reportagem pretende financiar uma mulher repórter que queira cobrir temas de sub culturas, aquilo a que Kim chamava as “correntes subterrâneas da rebelião”», pode ler-se no site do memorial.