Cem anos de All Star

Texto Pedro Marta Santos

Os All-Star são como uma T-shirt ou um par de jeans: nunca passam de moda. Trata-se de um clássico. Tornando-se os ténis (ou sapatilhas, pouco importa) mais populares da história – chegaram a dominar 80 por cento do mercado norte-americano e, só nos EUA, 60 por cento da população tem ou teve pelo menos um par –, o seu percurso confunde-se com a implantação e êxito global do basquetebol. Mas é, sobretudo, um caminho indistinguível da cultura popular do século XX.

Talvez o segredo esteja na espantosa simplicidade: lona, um remendo no tornozelo, uma listra na sola e borracha vulcanizada, através de um design que, no essencial, não se altera desde 1949.

De obrigatórios no basquetebol a ubíquos no desporto, os Converse Chuck All-Star passaram para as ruas jovens do pós-guerra nos pés de Elvis Presley, levitados pelo rock e, a seguir, pela contracultura hippie dos sixties, que chegará à anarquia, ora reconstrutiva, ora demolidora do punk nos 70 – Johnny Rotten dos Sex Pistols e Tommy Ramone dormiam com os seus All-Star – tornando-se um amor assolapado de Kurt Cobain e do grunge (reveja-se Smells Like Teen Spirit) até ao rap e hip-hop militante dos NWA – Straight Out of Compton, lembram-se?

Hoje, os All-Star estão na alta-costura (parcerias com a Givenchy ou a Missoni), na red-carpet pelos passos de Jodie Foster, Kirsten Stewart ou Rihanna, nos videoclips dos Red Hot Chili Peppers (Californication), Justin Timberlake (Can’t Stop the Feeling) ou Kendrick Lamar (i) , nos passeios junto ao mar das supermodelos Gisele Bündchen e Karlie Kloss, nas tardes de verão de Sarah Jessica Parker e da ex-primeira-dama Michelle Obama ou nos pés invencíveis de Batman e da Wonder Woman graças a uma colaboração com a DC Comics.

A cada 43 segundos, um par é comprado algures no planeta. Quem diria que um pedaço de lona pode valer mais do que o seu peso em ouro?

UM JOGADOR SOFRÍVEL, UM VENDEDOR DE EXCEÇÃO

Charles Hollis «Chuck» Taylor (1901-1969) não poderia entrar na lenda do basquetebol apenas pelas suas façanhas no campo: originário do Indiana, templo espiritual deste desporto na América, foi um bom atleta de liceu, na Columbus High School, da pequena vila a sudeste do Estado, mas reclama ter feito parte, entre 1918 e 1930, das equipas profissionais dos Original Celtics e dos Buffalo Germans, embora não existam registos oficiais da participação.

Certo é que em 1921, com 20 anos, Chuck entrou nos escritórios em Chicago de uma jovem marca de sapatos, a Converse, e pediu um emprego como vendedor. S.R. «Bob Pletz», diretor da marca e entusiasta de basquetebol, ficou impressionado com a desenvoltura de Chuck – e contratou-o logo.

Começava uma das mais icónicas parcerias da história do desporto: entre as décadas de 20 e 50 do século passado, Chuck Taylor não só se tornou uma referência técnica junto dos atletas e treinadores das equipas profissionais e universitárias dos EUA (fez centenas de milhares de quilómetros ao volante do seu Cadillac branco com caixas de ténis na mala, vivendo em motéis, de cacifo na sede em Chicago por única morada fixa) como, ao fim de um ano ao serviço na Converse, as suas sugestões para alterar o calçado de desporto mais representativo da marca, os All-Star, criados em 1917, depressa foram introduzidas: caso do remendo lateral para reforço da proteção do tornozelo.

A partir de 1932, o seu nome era acrescentado ao dos ténis: nasciam os Chuck Taylor Converse All Star. Nunca recebeu um cêntimo de comissão. Meses antes de morrer, foi consagrado no Memorial Basketball Hall of Fame.

É da sua autoria outra relevantíssima novidade na história do desporto: em 1935, Chuck engendrara a primeira bola de basquetebol sem costuras.