Como se ainda não houvesse inferno suficiente para quem tenta encontrar o paraíso numas férias em agosto, eis que chegam as festas ao fim da tarde nos bares de praia. As sunset party. Dantes havia pores do Sol, e todos os dias. E os bares de praia serviam para comprar gelados aos miúdos antes do caminho para casa. Agora há sunsets. Chama-se assim, num inglês tão parolo como aquilo que descrevem. E os bares de praia, a partir das seis da tarde transformam-se em deslocadas discotecas de pés na areia.
A pessoa nem gosta de tirar férias em Agosto, já tem de levar com o trânsito, com as famílias, com o pó, com as filas em todo o lado, com rever as caras que já vê o ano inteiro – mas um qualquer azar do destino empurrou-a para aqui. Por isso a pessoa até escolheu um lugar mais recôndito – estrada de terra batida, parque sem vigilância, tudo muito pouco civilizado.
Claro que, nos dias que correm, percebe a pessoa, desde que o hippie se juntou ao chique, não há lugares recônditos, pelo menos nas mais fiáveis praias portuguesas, as mais a sul. As bolas-de-berlim multiplicaram-se, e os coros de Boli Berli não conhecem pausas. Os bares de praia abrem como se não houvesse lugares inacessíveis – e estes juntam betos e surfistas, gente com barriga com lipoaspirados. Hoje, as praias do Sul são simplesmente um interminável, ininterrupto, carreiro de gente.
Mas, vá lá. Se a pessoa encontra uma espreguiçadeira de boa localização, em que não tenha que ouvir os dramas da família do lado e possa olhar o mar de frente, tudo parece compor-se, não é? Dadas as circunstâncias não se pode pedir muito mais da vida, em agosto, no Sul. Pois está assim a pessoa na sua espreguiçadeira, pela qual pagou o preço de uma espreguiçadeira no pico do verão – ou seja, para cima de um balúrdio. Chegou à praia a uma hora tardia, de forma a que o sol não lhe adense as rugas que já vão sendo algumas – quer regressar ao trabalho com umas corzinhas que indiciem pelo menos algum descanso.
A pessoa não perguntou nada, e nada lhe foi dito quando alugou a cadeira. Apenas lhe indicaram qual o chapéu que devia ocupar, deixado vago por outros – talvez mais conscientes do que ela, claro, perceberá depois. A pessoa estica a toalha, espalha o seu protetor, vai dar um mergulho, regressa, sacode o cabelo, deita-se e… pum pum pum, começa a música no bar lá em cima, suficientemente alta para fazer acordar todas as pulgas da areia. É a essa hora que todo o novel dono de bar de praia considera começar o sunset e, hoje em dia, um sunset não é a melhor hora do dia para estar na praia. É a melhor hora para sair da praia e começar a beber uns copos – que, julgo, se prolonguem noite fora.
Os DJ saltam para as mesas de mistura e dão à grafonola insuportável. Podia perguntar: mas quem é que prefere música de martelinhos a ver um por do Sol apenas ao som do mar? Suspeito que a resposta não fosse a que eu esperaria, tendo em conta a quantidade de pessoas nas espreguiçadeiras ao lado que vi a abanarem a cabeça ou, até, as ancas, em poses que julgo elas considerarem ser modernas. Afinal eu é que sou a antiquada.
Resta-me, portanto, continuar a chamar por do Sol ao por do Sol. E encontrar um lugar onde possa apreciá-lo na areia, sem músicas. Num desses muitos lugares que ainda há em Portugal, que não o usam apenas como razão para uma festa. Mas fazem dele o que ele é: um autêntico espetáculo.
[Publicado originalmente na edição de 9 de agosto de 2015]