Margarida Rebelo Pinto

O género não apaga a biologia


Rubrica "A vida como ela é", de Margarida Rebelo Pinto.

Riley Gaines é um dos rostos públicos contra a participação de mulheres transgénero nos desportos femininos. Nascida no Tennessee, foi 12 vezes campeã do All-American e cinco na Universidade de Kentucky, pela qual competiu durante alguns anos. Em março de 2022, ganhou ex aequo a prova de 400 metros livres, mesmo nos centésimos de segundo, com a nadadora Lia Thomas, atleta trans da Universidade da Pensilvânia. A organização da NCAA (National Collegiate Athletic Association), informou-a que não iria receber a taça, porque a vitória de um atleta trans era importante para as fotografias. Riley foi para casa de mãos a abanar e declarou-se chocada não só pelo sucedido, mas também com o facto de ter de conviver nos balneários com Thomas, um homem de 22 anos com 1,80 metros, que mantém ainda a sua genitália masculina, sem qualquer aviso prévio por parte da organização. A partir daí, Riley nunca mais baixou os braços na sua cruzada para proibir que as mulheres trans sejam banidas das competições de natação nos EUA.

Numa audiência no Senado, o senador republicano Ted Cruz, eleito pelo estado do Texas e o primeiro cubano-americano a servir pelo seu estado, perguntou a Riley se existem diferenças entre homens e mulheres. Riley explicou que um homem tem os pulmões e a garganta de dimensões maiores, o que aumenta em cerca de 40% a capacidade de respiração, e claro, os membros maiores do que as mulheres. Imediatamente a seguir, o senador questionou Kelley Robinson, presidente da HRC, a Human Rights Campaign, uma empresa fundada em 1980 que constitui o maior grupo de defesa e de lobby dos direitos civis LGBTQ nos EUA, com a mesma pergunta. Era uma pergunta simples, de resposta binária. Após repetir várias vezes a questão, Kelly não formulou uma resposta conclusiva, tentando desviar o tema para as questões de género. Ted Cruz apresentou um relatório oficial que revela a disparidade de tempos nos recordes nacionais em várias modalidades desportivas consoante o sexo. O relatório indica que no ano de 2017 o recorde mundial feminino de 100 metros foi batido por mais de 124 rapazes. Nos 100 metros barreiras foi batido por um total de 2474 rapazes.

A discussão sobre a participação de atletas transgénero já tem alguns anos. É uma realidade complexa e sensível, porque a questão de género ultrapassa a questão sexual. Numa entrevista ao “The Telegraph”, o presidente da World Athletics, Sebastian Coe, afirmou: “Acho que a integridade do desporto feminino, assim como o futuro do desporto feminino, ficam muito frágeis se não nos acertarmos nisto. Para mim não existe qualquer questão sobre o facto de a testosterona ser dominante na performance. O género não pode apagar a biologia”. Numa entrevista a David Letterman, em 2017, Serena Williams, na época já com 16 vitórias no Grand Slam de ténis, disse que se jogasse com Andy Murray, número um do ATP (torneio mundial de ténis para homens organizado pela Association of Tennis Professionals) desse ano, seria impossível vencer. Para Serena, o ténis masculino e o ténis feminino nem sequer são o mesmo desporto.

O direito à inclusão não deveria ultrapassar as regras mais básicas do bom senso e da justiça. É aceitável que um ser humano que é biologicamente um homem compita de igual para igual com seres humanos com biologia feminina? Se não são iguais, não estão a competir como iguais. Tenho esta mania de apelar ao senso comum, como se fosse comum ao ser humano. Infelizmente, citando um provérbio espanhol que me é muito caro, “el sentido común es el menos común de los sentidos”.