Incontinência urinária. Faz força para esvaziar a bexiga?

Para prevenir a perda involuntária de urina, é necessário mudar hábitos e comportamentos entranhados no dia-a-dia

Mais de 200 milhões de pessoas, em todo o Mundo, sofrem com perdas involuntárias de urina. Em Portugal, estima-se que sejam 600 mil. A obesidade e as alterações hormonais estão na lista dos inimigos deste problema de saúde que piora à medida que se envelhece.

Incontinência urinária é uma condição fácil de perceber. É qualquer perda involuntária de urina que pode surgir num contexto de esforço, numa sensação de urgência, na dificuldade de esvaziamento vesical completo. Numa perda durante o sono e nas relações sexuais. Pode ainda ser funcional quando há dificuldade de chegar à casa de banho. “É um sintoma com um grande impacto negativo na vida familiar, social e ocupacional”, refere Mariana Pereira, fisioterapeuta especializada em saúde da mulher.

A lista de fatores de risco é considerável. O envelhecimento, a obesidade, a gravidez e o parto (bem como o tipo de parto), as alterações hormonais (especialmente na menopausa), as cirurgias ginecológicas (no caso da mulher), as cirurgias para o cancro da próstata (no caso do homem), o tipo de exercício físico (se for de grande impacto) ou até mesmo as alterações posturais e a dificuldade na marcha.

“No entanto, é muito importante salientar que a perda de urina poderá estar associada também a outras doenças, como a diabetes, a doença de Parkinson, a esclerose múltipla, o AVC, a depressão, a défices cognitivos e a demência, e também a infeções urinárias de repetição e a sintomas do trato urinário inferior ainda em criança”, adianta Mariana Pereira.

É um problema de saúde que tem grande impacto na qualidade de vida e em termos físicos, psicológicos e sexuais

Para prevenir a perda involuntária de urina, é necessário mudar hábitos e comportamentos entranhados no dia-a-dia. Há vários exemplos. Segundo a fisioterapeuta, é importante beber uma quantidade adequada de líquidos, adotar uma alimentação saudável, controlar o peso, evitar a obstipação, praticar exercício físico moderado e ter bons hábitos e posicionamento na utilização da casa de banho.

“Embora sejam indicações muito generalistas, na verdade, a grande maioria das pessoas, não sabe, por exemplo, urinar de forma correta, pois fazem força para esvaziar a bexiga, posicionam-se forma incorreta na sanita ou ficam longos períodos de tempo sem urinar, ignorando os sinais da sua bexiga, o que muitas vezes pode conduzir a perda de urina.” Hábitos que, muitas vezes, começam na infância e que podem e devem ser modificados.

Se, por um lado, o grande fluxo de informação disponibilizada relativamente à incontinência urinária pode ser benéfico, por outro, existe uma generalização da utilização dos exercícios de Kegel para resolver a incontinência urinária através da contração dos músculos do pavimento pélvico. Mariana Pereira deixa um aviso: “Esta poderá não ser a melhor solução em todos os casos, sendo até muitas vezes prejudicial, especialmente quando adotada sem supervisão de um profissional de saúde”. “Todos devemos ter um papel ativo na melhoria da qualidade de vida e, por isso, é fundamental recorrer a profissionais de saúde dedicados à área das disfunções do pavimento pélvico para avaliar e ajudar a prevenir a incontinência urinária, bem como para tratar quando necessário e apropriado”, sustenta.

Muitos doentes não procuram ajuda médica, seja por considerarem que é normal a partir de certa idade, seja por estigma social

O diagnóstico atempado é fundamental, uma vez que a incontinência urinária tem solução em 85% dos casos. O tratamento deverá ser, em primeira linha, conservador, mas também farmacológico ou cirúrgico. Neste contexto, a fisioterapia tem um papel fundamental no tratamento conservador através da reabilitação do pavimento pélvico. Segundo Mariana Pereira, até mesmo na presença de uma indicação cirúrgica, “a fisioterapia é uma mais-valia, pois sabe-se que pode existir alguma perda de suporte do pavimento pélvico decorrente da própria cirurgia”.

A fisioterapia é, portanto, recomendável não só antes, mas também, e principalmente, após a sua realização. “Por exemplo, em contexto de hiperatividade vesical é extremamente importante aliar à terapêutica médica o trabalho da fisioterapia de forma a garantir um esvaziamento eficaz da bexiga e promover um treino da bexiga adequado a cada caso específico”, reforça.

A fisioterapia tem um papel fundamental na mudança de hábitos e no controlo sobre as estruturas pélvicas, de modo a compreender os mecanismos que podem contribuir para a incontinência urinária e a identificar e integrar os músculos do pavimento pélvico, seja na sua capacidade de relaxar, como na de contrair e tonificar, de modo a utilizá-los de forma correta.

Não existem, no entanto, receitas ou exercícios específicos transversais a todas as pessoas. É importante que seja feita uma avaliação detalhada por um fisioterapeuta especializado em disfunções do pavimento pélvico. E o ideal, refere Mariana Pereira, “é que se trabalhe de forma integrada com uma equipa multidisciplinar, de forma a ajudar a prevenir e tratar situações, como a incontinência urinária, que variam muito de pessoa para pessoa”.