Diogo Ayres de Campos. O otimista ponderado

Diogo Ayres de Campos é coordenador da Comissão de Acompanhamento de Resposta em Urgência de Ginecologia, Obstetrícia e Bloco de Partos

Era uma criança ponderada e responsável, bom aluno. Aos 13 anos, passou com distinção o exame de acesso a um dos mais exclusivos colégios ingleses. Vê sempre o copo meio cheio. E nunca se irrita.

Do bisavô materno, monárquico convicto obrigado a uns tempos de exílio pela revolução republicana de 1910, herdou a vocação pela Medicina. Desde criança, que outra vontade não se lhe ouvia: queria ser cirurgião. A veia artística da mãe, portuense de origem minhota licenciada em Belas Artes, apenas se manifestava no gosto pela música. Tão pouco se deixava cativar pelas engenharias, caminho profissional do pai, nascido em Lisboa, que levaria a família a uma longa temporada em Inglaterra.

Tinha oito anos, tocava piano e falava inglês. “Um miúdo ponderado e responsável, bom aluno.” Aos 13, passou com distinção no exame de acesso a Eton College, escola interna para rapazes fundada no século XV, sinónimo de elitismo, desde logo financeiro. Acabaria a acompanhar o irmão, mais velho ano e meio, em Harrow College, sob protesto, adolescente muito marcado pela educação anglo-saxónica, que ficaria para sempre: a pontualidade, “autêntica obsessão”, diz o próprio, o sentido de humor seco, polido, sarcástico, típico dos habitantes da ilha, o padel e o críquete, ainda hoje práticas regulares.

Aos 14 anos estava de regresso ao Porto, a cidade onde nascera. Vivia na Foz, zona privilegiada, em frente ao mar da praia da Luz, cenário de juventude. Era o tempo das discotecas´ “queques” D. Urraca e Twin’s, da banda formada com amigos da Escola Inglesa, dedicada a êxitos pop dos anos 1980, da Faculdade de Medicina. Da descoberta do sofrimento e de que não fora feito para assistir ao fim. “Lido muito mal com a morte. A situação terminal custava-me horrores.” Trocou então a sala de operações pela de partos. “Um lugar onde não há rotina.” Um lugar de empatia e de comunicação obrigatoriamente eficaz por excelência. A personalidade egocêntrica não está talhada para a Medicina, defende. A pessimista não será a mais indicada para a obstetrícia, em particular, acrescenta. É, portanto, alguém que vê sempre “o copo meio cheio”, diz a amiga Luísa Pinto, também obstetra. A especialidade levá-lo-ia à investigação e à presidência de sociedades científicas, promovendo congressos e troca contínua de informação. Sempre com um cunho pessoal: recentemente, em Lisboa, tocava piano para os convidados. O coordenador da Comissão das Urgências de Obstetrícia, a braços com uma crise, raramente se irrita. “Nunca perde a calma nem abranda a resiliência”, acrescenta a amiga.

Há cinco anos, o médico trocava o Hospital de São João, no Porto, pelo cargo de diretor de Serviço de Ginecologia e Obstetrícia do Santa Maria. Foi no hospital lisboeta que se conheceram. Chegou reservado e um “pouco distante” a um grupo formado há muito tempo. “Hoje, está completamente integrado, os ares do Sul fazem-lhe muito bem”, brinca a amiga. Luísa Pinto destaca “a tenaz persecução dos objetivos e a rara capacidade de trabalho”.

Com ele, dizem, “o serviço melhorou muito”. Sobretudo disponibilizando ferramentas informáticas que sistematizaram o organigrama do departamento, os contactos do staff e de médicos de outras especialidades, os mapas de férias, a rotação dos internos. Mas, também, promovendo reuniões trissemanais, algumas delas faladas em inglês, nas quais uma das palavras mais ouvidas é “feedback”, criando folhetos informativos para as mulheres grávidas. “Nunca deixa cair objetivos, apesar de ser muito poupadinho”, diz a amiga. A banda de música, muito elogiada por outros serviços, serve a união do grupo. Diogo Ayres de Campos nas teclas, Luísa Pinto na voz, entre outros, ensaiam Coldplay, em letra adaptada, com frequência.

A par da sala de partos e da investigação, está a docência, outra paixão do médico, catedrático desde há três semanas. “Sou exigente.” Deu alguns vintes, poucos, pedindo participação, interesse, disponibilidade, estudo. E pontualidade, claro. Nada que não tivesse cumprido enquanto aluno. “Era muito atento, muito interessado nas questões científicas”, diz João Bernardes, professor da especialidade na Faculdade de Medicina do Hospital de São João. Recorda um jovem “muito culto e viajado, apaixonado pela música e pelo desporto”. Detesta perder. “Jogo padel com ele e é muito competitivo. Na verdade, ganha quase sempre”, diz Luísa Pinto.

Corre três vezes por semana na passadeira. Tem um interesse especial por arquitetura. Remodela há dez anos uma casa em Ponte de Lima, herança de um tio-avô e palco de duas semanas de verão, sagradas. Em família: a mulher e as filhas, advogada e gestora. João Bernardes é um dos convivas habituais do jantar anual. “Serve muita comida tradicional portuguesa. É um excelente anfitrião.” Também à mesa se nota o toque british. “É um dos raros portugueses que come sempre amêijoas de faca e garfo”, diz Luísa Pinto.

Diogo Matos Graça Ayres de Campos
Cargo:
coordenador da Comissão de Acompanhamento de Resposta em Urgência de Ginecologia, Obstetrícia e Bloco de Partos
Nascimento: 02/11/1962 (59 anos)
Nacionalidade: Portuguesa (Porto)