Para ganhar em 2021 só poupando desde já

Falar é fácil, fazer é que é mais complicado, quando as despesas devoram qualquer margem para pôr algum de lado. Recorremos, por isso, a especialistas em finanças pessoais para encontrar estratégias - até nos casos difíceis.

Quanto amor, saúde e dinheiro pediram os portugueses na passagem de ano? Não vale a pena fazer contas. Sabemos que representam toneladas de uvas-passas engolidas nas 12 badaladas. Mas, se amor e saúde não crescem nas árvores, o dinheiro, ao menos, pode ser cultivado no dia a dia para colhermos frutos todos os meses. Chama-se a isso poupar. E o início de 2021 é o momento para começar. Um fundo de emergência é obrigatório para as famílias. “Esta pandemia, aliás, veio relembrar a importância de ter uma reserva para fazer face aos imprevistos”, adverte Bárbara Barroso, fundadora do projeto de literacia financeira MoneyLab e especialista em finanças pessoais.

O primeiro passo é garantir uma retaguarda, algo equivalente a seis e 12 meses dos encargos mensais. “Uma boa prática é todos os meses retirar uma percentagem fixa antes de pagar as despesas, garantindo as poupanças à cabeça.” É um bom princípio, sim senhora, mas o que fazer quando as despesas tudo devoram? “Gastar de forma inteligente é a resposta”, destaca José Figueiredo, CEO da ComparaJá (comparaja.pt), a plataforma online de simulação e análise de produtos e serviços financeiros.

Chegou, então, a hora de passar 2020 em revista para saber onde se gastou, quanto se poupou e quanto se poderia ter poupado. Abra uma folha Excel e organize receitas para um lado e despesas para o outro, incluindo consultas, presentes de aniversário, férias, empréstimos, material escolar dos miúdos, tudo. Some as parcelas e subtraia o total aos rendimentos, chegando ao valor que lhe irá sobrar para aplicar nas poupanças. Desgostoso com o resultado? Não desanime, só conhecendo a sua real situação financeira poderá eliminar os tais gastos poucos inteligentes, atacando desde logo os monstros. “Há uma série de rubricas que podem ser revistas.” Da prestação da casa, aos seguros, passando pelas telecomunicações, pela energia até aos créditos pessoais (ver caixa).

Um grão de cada vez

Com os principais desperdícios identificados, poder-se-á então avançar para as pequenas coisas. Nem que seja um mísero euro por dia, insiste Bárbara Barroso: “Ao final de um ano, são 365 euros úteis para pagar o seguro do carro ou a prestação do IMI”. O fundamental é definir um valor mensal a depositar numa conta separada da conta-corrente. Aproveite, já agora, para improvisar um porquinho-mealheiro, tão sagrado como as vacas na Índia, e com missão super importante: um jantar, uma escapadinha na Páscoa, um gira-discos vintage, o que for necessário para manter os níveis de felicidade em alta em casa. O porquinho será alimentado com moedinhas esquecidas nos bolsos, poupanças que adultos e crianças consigam fazer durante a semana, envelopes que os avós passam aos netos por baixo da mesa, tudo é válido para criar hábitos de poupança na família.

Mais uma vez, não subestime a folha de Excel para organizar as finanças. Há templates com calculadoras de despesas pessoais da Microsoft gratuitos na net com gráficos, queijinhos e tabelas intuitivos mesmo para gente sem alma de contabilista. Arrume as despesas por categorias, percebendo para onde vai o dinheiro e, se necessário, reajustando as estratégias de poupança. Se preferir as apps, não faltam opções com versões gratuitas e pagas: Mint, Wally, Expensify, Organizze, MoneyBoard (iOS), As Minhas Finanças, entre outras.

Sabendo que a principal fatia das despesas é a alimentação, não caia no erro de ir às compras sem lista. Selecione as promoções de acordo com as necessidades predefinidas. Já sabe que refrigerantes, salgados e guloseimas todas as semanas arruínam a carteira e a saúde. Moderar é a saída (ou entrada, neste caso) para um 2021 também cheio de caminhadas nos percursos que antes fazia de carro, snacks de frutas da época e legumes do comércio local. Marcas brancas não é qualidade inferior, abuse delas para riscar os itens da lista.

O combustível, outro grande absorvedor de gastos, merece igual atenção. O arranque é perceber se não tem o passe de transportes públicos só por comodismo. Concluindo que não vive sem o carro, planeie o abastecimento. O portal da Direção-Geral de Energia e Geologia – precoscombustiveis.dgeg.pt – permite comparar os preços dos diferentes postos. O ganho é de cêntimos, mas, no final ano, terá valido a pena.

Prevenir para não desanimar

E porque há sempre eletrodomésticos que avariam, sapatilhas que se rompem ou um computador que pifa na pior altura, antecipe as manutenções. Aproveite os saldos e tire partido do e-commerce. O bom do online é poder comparar preços, aproveitando cupões e campanhas. Dica: ao adicionar os artigos ao cesto de compras virtual sem finalizar a transação, receberá emails dos sites quando surgirem baixas nos preços.

Artigos em segunda mão não são de menosprezar, seja no vestuário ou nos gadgets. E as inutilidades lá de casa vendidas online ou em lojas físicas também rendem extras para o porquinho ou a conta poupança. Para definir o preço, pesquise a concorrência na net e esteja disponível para negociar, tendo sempre presente os encargos com o envio. Promova o produto em diferentes categorias com boas fotos, detalhes relevantes, seja transparente e não aceite reservas. Lembre-se de que não conhece o comprador, nunca forneça, por isso, dados pessoais ou bancários. Por fim, se a entrega for feita cara a cara, marque encontros em lugares públicos ou leve um amigo para testemunhar a transação.

Com alguma imaginação, mais soluções serão possíveis até conseguir o tal fundo de emergência para os tempos incertos. Está de parabéns, mas a odisseia ainda agora começou. Fazer crescer o dinheiro é o patamar seguinte.

Habitação, comunicações e créditos pessoais na mira

Com a Euribor mais baixa de sempre e spreads com taxas comparáveis aos níveis de 2008, este é o momento de renegociar o crédito de habitação para quem tem valores a partir de 1.2%. “É importante estar muito bem informado para saber o que pode exigir do banco”, avisa José Figueiredo, recordando a vantagem de boa parte das instituições cobrirem os custos de transferência de outros bancos. As telecomunicações são outro campo com potencial de poupança. Deverá estar, por isso, atento à concorrência, podendo usar o simulador da Anacom: anacom.pt/tarifarios/CombinadosSimular.do. Por fim, a consolidação de créditos é mais um caminho para reduzir boa parte dos custos mensais. Aplica-se a quem contraiu três, quatro ou mais empréstimos, além dos cartões de crédito. Poderá negociar com o banco uma forma de juntar tudo no mesmo bolo com várias vantagens – desde aumentar o prazo de pagamento, baixando com isso a mensalidade, até reduzir a taxa de juro.

Investimentos a curto, médio e longo prazo

Depósitos a prazo

Com algumas centenas de euros já poderá recorrer a um depósito a prazo. Há soluções que permitem movimentar o dinheiro a qualquer momento e opções em que o capital só estará disponível no fim do período contratado. Os prazos vão dos três meses aos três anos. A plataforma ComparaJa.pt listou algumas das melhoras ofertas em: www.comparaja.pt/depositos-a-prazo

Certificados de Aforro

São subscritos nos balcões dos CTT, nos Espaços de Cidadão Online e através do sistema AforroNet, do IGCP. Os juros capitalizam trimestralmente. O montante mínimo é de 100 euros e o máximo é de 250 mil euros, não podendo levantar o dinheiro nos primeiros três meses. Caso não faça movimentações durante dez anos, receberá o total do valor investido, mais os juros (0,478% em dezembro 2020) obtidos ao longo do tempo.

Certificados de Tesouro

Mil euros é o investimento mínimo, mas poderá ir até um milhão de euros aplicados no prazo máximo de sete anos. Os juros são anuais com taxa a crescer a partir do segundo ano, entre 0,75% e 2,25%. A partir do segundo ano, há também um prémio de remuneração de 40% do crescimento médio real do PIB. Não pode ser mobilizado no primeiro ano e, se levantar algum montante antes do prazo e antes do aniversário da subscrição, perde parte dos juros correspondentes a esse ano.

Planos de Poupança Reforma (PPR)

As poupanças são levantadas perto da idade de reforma ou mediante condições excecionais. Os fundos PPR têm maior potencial de valorização, mas a rentabilidade não está garantida. Os seguros PPR têm retornos mais baixos, mas o capital está assegurado. A comparação entre os PPR deve ter em conta não só as taxas de juro, mas também as comissões cobradas. A plataforma ComparaJa.pt selecionou 35 seguros PPR que pode consultar aqui: comparaja.pt/blog/como-escolher-ppr

Investimentos de risco médio e alto

Quem não domina o segmento deverá ficar longe destas aplicações, a não ser que esteja disposto a estudar a fundo como funcionam, quais os riscos e, uma vez que o capital não está garantido, qual a tolerância para perder todo ou parte do dinheiro investido. Há opções que vão de bonds, às obrigações, passado pelos futuros até aos índices de ações. Não colocar o dinheiro em algo que não entende e arriscar só quando se está seguro são as advertências dos especialistas. “Para quem quiser seguir este caminho, aconselho a usar 1% das poupanças nesses mecanismos, aplicando o restante em investimentos de capital garantido”, diz José Figueiredo.