Comer bem é a chave de uma vida saudável. E quando a saúde já está posta em causa? Nem sempre a cura passa por tomar comprimidos ou fazer tratamentos complexos. Em muitos casos, aquilo que se come é uma parte essencial do tratamento – ou mesmo todo o tratamento necessário.
Habituámo-nos a ouvir a palavra dieta associada a planos de emagrecimento, a opções alimentares éticas e sustentáveis e à prevenção de doenças. Mas aquilo que comemos, além de as prevenir, pode também ser uma forma de as tratar.
Há dietas que são terapêuticas, prescritas como se fossem um medicamento, de forma a controlar doenças e os seus sintomas. Neste caso, é sempre prescrita e seguida por um profissional de saúde e costuma passar pela alteração de um ou mais parâmetros nutricionais em relação àquilo que é considerada a dieta-padrão, aconselhada à generalidade das pessoas. Epilepsia, hipertensão e doença celíaca são algumas das condições de saúde que podem ser controladas através do que comemos.
DIETA SEM GLÚTEN, o medicamento dos celíacos
A doença celíaca ocorre quando há uma predisposição genética para a sensibilidade permanente ao glúten. É uma doença autoimune que faz que a ingestão de glúten, mesmo em pequenas quantidades, desencadeie no organismo uma reação imunológica contra o intestino delgado, o que provoca lesões, diminuição da capacidade de absorção de nutrientes e, por vezes, uma série de outros sintomas como aumento de peso, diarreia e irritabilidade.
Não tem cura, mas tem solução: basta não ingerir a substância que provoca a reação imunológica extrema, o glúten. Os celíacos – após corretamente diagnosticados – devem cumprir este regime sem glúten para toda a vida e é a dieta, e apenas a dieta, que os mantém com a doença controlada e sem sintomas. Apesar de haver outras restrições, é no grupo dos cereais e derivados que encontram mais restrições: trigo, aveia, centeio e cevada estão absolutamente proibidos.
DIETA CETOGÉNICA, uma esperança para a epilepsia refratária
A epilepsia é uma doença do sistema nervoso central que causa alterações na atividade elétrica do cérebro e que afeta a forma como a pessoa pensa, sente, se move ou mesmo o seu estado de consciência. Para a maioria dos pacientes, os medicamentos antiepiléticos controlam as crises, no entanto, sete por cento sofrem de epilepsia refratária, ou seja, que não cede à medicação. Nesses casos, e sobretudo nas crianças, há uma dieta muitas vezes capaz de fazer o que os medicamentos não fazem: controlar as convulsões.
A dieta cetogénica (que é sempre iniciada em meio hospitalar, com o acompanhamento de um neurologista e dietista) é a mais completa inversão daquilo que é considerado saudável: dependendo das versões (umas mais restritivas, outras menos), cerca de noventa por cento das necessidades calóricas diárias passam a ser obtidas através de gorduras e apenas dez por cento através de hidratos de carbono e proteína. O jejum prévio e esta alimentação induzem o estado de cetose – em que o corpo converte gordura em corpos cetónicos que o cérebro usa como novo combustível, já que não há açúcares disponíveis no sangue para ele funcionar. As contas são feitas ao grama, é difícil para crianças e para pais, mas estudos demonstram que, com esta mudança da fonte energética do corpo, metade das crianças registam uma diminuição de mais de cinquenta por cento das crises, cerca de um terço terão uma melhoria em cerca de noventa por cento das convulsões e dez por cento ficam livres de crises epiléticas.
DIETA amiga dos rins
Nos doentes com insuficiência renal crónica, a dieta é tão importante como a hemodiálise e os medicamentos. A insuficiência renal é caraterizada pela incapacidade de os rins exercerem corretamente a sua função depurativa, eliminando os resíduos que já não fazem falta ao corpo. E isso significa que através da alimentação os pacientes podem restringir os nutrientes que favorecem essa acumulação, nomeadamente o potássio, o sal e o fósforo.
Os alimentos permitidos e os cuidados necessários não são iguais para todos porque depende da gravidade da doença, mas a dieta deve ser hipoproteica (porque restringe o consumo de fósforo e sódio) e baixa em sódio (porque a hipertensão aumenta à medida que a função dos rins piora). Quando a doença já está num estado avançado e o paciente começa a fazer hemodiálise, o potássio também costuma ser reduzido.
Laranja, kiwi e banana, que fazem parte de uma alimentação saudável para a maioria das pessoas, são alguns dos alimentos que costumam ser postos de parte. Além da restrição de certos alimentos, a dieta também implica formas específicas de preparar o que é consumido, por exemplo, os legumes devem ser cortados finos para haver maior superfície de contacto com a água e mais perda de potássio e a água da cozedura deve ser mudada pelo menos uma vez.
BAIXAR O SÓDIO PARA BAIXAR A TENSÃO
Toda a gente tem uma avó ou um tio mais velho que diz que só pode comer peixe cozido com legumes (sem sal!), por causa da tensão. Não quer dizer que seja sempre assim, mas os princípios da uma dieta contra a hipertensão são estes: muitos legumes, mais peixe do que carne, cozidos e grelhados em vez de fritos e muito pouco sal. A pressão arterial é a força com que o sangue circula no interior das artérias no corpo. A hipertensão acontece quando esta pressão está alta de forma crónica, implicando um esforço do coração para bombear o sangue através do corpo. Considera-se hipertensão a mínima (diastólica) acima de 90 e a máxima (sistólica) acima de 140. E estima-se que quarenta por cento da população portuguesa tenha hipertensão, embora grande parte não o saiba. A alimentação, uma vez mais, é parte da solução. E o inimigo a abater é o sal, que está carregado de sódio, um mineral que é essencial à vida mas que em excesso faz o corpo reter mais líquidos e sobrecarrega o sistema circulatório. A dieta para controlar a hipertensão consiste em cortar as fontes de sódio: deixar de usar sal de mesa, substituindo-o por outros temperos (ervas aromáticas, algumas especiarias, sumo de limão), evitar enchidos, queijos curados, enlatados e outros produtos pré-preparados, bem como águas com gás.
ALIMENTAÇÃO CONTRA A DIABETES
Tem tido um crescimento explosivo nos últimos anos e a razão parece estar no nosso estilo de vida sedentário e no que comemos. Há dois tipos de diabetes: o tipo 1, em que o pâncreas deixa de produzir insulina, pelo que tem de ser sempre feita a sua substituição com insulina, e o tipo 2, o mais comum, em que o corpo não produz insulina suficiente ou não consegue usar adequadamente a que produz. No tipo 2, muitas vezes, uma alimentação equilibrada e exercício físico podem bastar para manter os níveis de glicemia estabilizados.
Ao contrário de outras dietas, as recomendações não são muito diferentes das aconselhadas para o resto para população: fazer seis refeições diárias com horários fixos, comer sempre sopa e vegetais às refeições principais, fugir de gorduras e açúcares simples, substituir os hidratos de carbono refinados por ricos em fibras, ser moderado no sal e no álcool e preferir cozidos e grelhados a comidas condimentadas.
Assim, aumentam as probabilidades de manter as glicemias normais ao longo do dia, ter níveis corretos de colesterol e triglicerídeos no sangue e reduzir os riscos e as complicações da doença.