Clã Figo: a moda é um assunto de família

O pai, Luís, ainda era um menino no futebol e já dava nas vistas pela “ganda pinta”. A mãe, Helen, foi top-model reconhecida mundialmente. Os genes fizeram o resto. As filhas, Daniela, Martina e Stella, herdaram-lhes a elegância e, mesmo sem descurar os estudos, já brilham em produções de várias marcas. Como a família do antigo jogador conquistou o meio publicitário.

Paulo Futre, colega de seleção durante mais ou menos três anos, amigo há já nem sabe quantos, não recorda outro Figo que não o impecavelmente aprumado, um misto de imagem cuidada e bom gosto. “Sempre se vestiu bem, a alto nível. Mesmo quando era menino já tinha aquele cuidado com o cabelo, andava sempre bem arranjado”, conta à “Notícias Magazine” o antigo internacional português, que, em 2000, até intermediou a transferência do craque do Barcelona para o Real Madrid. Quando se cruzavam ou conviviam, o elogio era quase certo. “Eh pá, estás com ganda pinta”, dizia-lhe Futre com frequência. A possibilidade de se aventurar na moda nunca foi assunto que surgisse entre ambos, garante o agora comentador televisivo, mas o “estilo” que conheceu a Figo desde sempre já ia anunciando que ele havia de se dar bem na “fashion scene”. O mesmo se aplica ao resto da família. “Já não estou com todos há uns anos, mas pela carreira da Helen [Helen Svedin, esposa de Figo e ex-manequim sueca] e pela personalidade de ambos, não me surpreende nada que todos se saiam bem no mundo da moda”, diz Futre, reconhecendo “a pinta e a elegância” que conferem ao clã Figo um ADN favorável ao sucesso perante as objetivas.

A predisposição da família para a moda exponenciou-se no último mês, com uma campanha da marca de joias espanhola Rabat. Com uma novidade: pela primeira vez, Daniela (21 anos), Martina (18) e Stella (15), as três filhas do casal, protagonizaram uma produção fotográfica conjunta. Pela primeira vez também, a mãe, Helen, surgiu ao lado das filhas numa campanha publicitária. A junção, que mereceu destaque em publicações cor-de-rosa de Portugal e Espanha, surge depois de outras parelhas familiares bem-sucedidas. Entre Daniela e Martina, por exemplo. Ou entre Martina e Stella. Ou mesmo entre Helen e Luís. Tudo experiências que confirmaram a vocação do clã Figo para os holofotes.

Daniela, Helen, Stella e Martina (no sentido dos ponteiros do relógio) juntaram-se recentemente para uma produção de uma marca de joias
(Foto: redes sociais da família)

A história começa inevitavelmente com Helen, a ex-manequim sueca que, durante anos, foi uma das grandes top models mundiais. A mulher de Figo começou nas passarelas suecas logo aos 16 anos e aos 21 já brilhava em Espanha. Os anos seguintes contam-se com uma lista de sucessos quase interminável. Helen não só foi capa das mais prestigiadas revistas de moda – “GQ”, “Marie Claire”, “Elle”, entre outras – como deu rosto a campanhas de grandes marcas internacionais, como a L’Oréal, a Land Rover, a Nike ou a Giorgio Armani. Além, claro, da H&M, a marca de moda mais global da Suécia. Também Figo, casado com Helen desde 2001, foi, ao longo dos anos, protagonizando campanhas de um leque alargado de marcas, beneficiando, em parte, da aura proporcionada pelo título de melhor jogador do Mundo, que lhe foi atribuído pela FIFA em 2001. Danone, BPN, Delta Cafés, Galp Energia e Nike são algumas das marcas já representadas pelo ex-internacional português. Para se perceber o valor da imagem de Figo, basta recordar que em 2004 a revista “Focus” garantia que o jogador gerava, entre salários e publicidade, 2,4 milhões de euros por mês. Qualquer coisa como 80 mil euros por dia.

Mas a moda nunca foi uma prioridade para um dos melhores de sempre do futebol português. Depois de terminar a brilhante carreira futebolística, em 2009, Figo afirmou-se como empresário e empreendedor social, lançando várias academias de futebol e até uma fundação (Fundação Luís Figo), para ajudar crianças desfavorecidas. Pelo meio, investiu no setor imobiliário, com imóveis na Suécia, em Portugal e em Espanha, no setor da exploração mineira e até no universo digital, lançando uma app de caçadores de talentos denominada Dream Football. Entre compromissos com a UEFA e a FIFA (chegou a anunciar a candidatura à presidência do organismo que tutela o futebol mundial, mas acabou por desistir), só pontualmente ia tendo pequenas colaborações com Helen. O cenário inverteu-se no ano passado quando o casal foi o grande protagonista de uma campanha lançada pelo grupo espanhol Cortefiel.

Luís Figo e Helen Svedin protagonizaram, no ano passado, uma campanha conjunta para a marca Cortefiel
(Foto: redes sociais da família)

Nessa campanha, que lançou a coleção outono-inverno da temporada 2019/20, Luís e Helen surgem lado a lado, sorridentes e cúmplices, como que dando corpo ao argumento invocado pela marca para justificar a aposta no casal. “Eles irradiam magnetismo”, fizeram então saber os responsáveis da Cortefiel. Também o antigo craque da equipa das quinas se pronunciou sobre as motivações que o precipitaram para tal aventura. “Fizemos algumas campanhas em Itália, mas é a primeira desta dimensão. Fizemo-lo pelos valores da marca, pela sua história e pela ligação que tem com Portugal e Espanha. Decidimos aceitar o desafio porque achámos que era uma coisa boa para a nossa imagem”, assinalou Figo em conversa com uma revista.

Desporto e moda, atração irresistível

Mas o antigo número sete da seleção nacional está longe de ser o único desportista de alta competição a dar cartas no mundo da moda. O internacional português Cristiano Ronaldo, os antigos futebolistas Xabi Alonso e Iker Casillas, os treinadores de futebol Pep Guardiola, Zidane e Andrea Pirlo, o basquetebolista LeBron James, o tenista Roger Federer ou o golfista Tiger Woods são só alguns dos exemplos mais mediáticos de atletas (ou antigos atletas) que transportaram o mediatismo obtido na esfera desportiva para a face das objetivas, com benefício de grandes marcas internacionais ou mesmo de marcas próprias. Sinergias felizes, que estão longe de cair do céu. Ana Paula Cruz, professora do IPAM e especialista em planeamento estratégico de comunicação, aponta duas grandes explicações para essa espécie de atração irresistível.

Uma, frisa, prende-se com um fenómeno de dimensão internacional, particularmente vincado nos Estados Unidos, que é o peso crescente do estilo “athleisure” no mundo da moda. “Um estilo mais desportivo, que na faixa etária entre os 16 e os 30 anos começa a ser algo hegemónico. Os homens com calças de fato de treino, até um bocadinho mais descidas, as jovens com tops e leggins, por exemplo”, pormenoriza. Nesse contexto, o recurso a figuras emblemáticas do desporto que funcionem como líderes de opinião é quase intuitivo. “Na área mais casual a aproximação tem sido simplesmente natural”, resume, comparando a aposta em grandes desportistas à que é feita por essas marcas em influenciadores digitais que se destacam na área do fitness. “A ideia é que acabem por arrastar os seus públicos-alvo, até por serem experts na área.”

Foto de família de umas férias no Algarve, ainda as filhas de Figo eram crianças
(Foto: Global Imagens)

Mas voltando a Figo e a Helen e à campanha protagonizada pelo casal no ano passado, que nada teve a ver com este registo “athleisure” em crescendo pelo Mundo fora. Aí, ressalva a especialista, entramos numa justificação distinta. “Nesse caso falamos de uma influência mais alargada, que é a intenção das marcas de capitalizarem aquilo que é a notoriedade, a visibilidade e a influência de uma determinada figura mediática. No caso os desportistas de alta competição.” Até porque, realça, quando se estabelece uma ligação de patrocínio entre as partes, a mais-valia da notoriedade faz-se sentir em diversas vertentes. “Nas festas, nos grandes media, nas redes sociais. No fundo, é o que acontece em relação às estrelas de Hollywood.” Aliás, o impacto alargado das redes sociais só veio exponenciar o fenómeno. “Estamos a falar de figuras com milhões de seguidores, em todo o Mundo.” No caso dos atletas, juntam a esse impacto alargado nas redes os atributos fitness, “o corpo como símbolo de elegância”. Tudo fatores que alimentam a vertente aspiracional tão intimamente associada à publicidade. “É sabido que a publicidade vende sonhos, daí colocar-nos sempre perante o cenário ideal”, sublinha Ana Paula Cruz, recordando que todos nós, enquanto consumidores, temos um grupo de pertença e um grupo de referência. “O lado aspiracional, de ‘um dia vou querer ser assim’ que nos leva a pretender mimetizar dadas figuras.”

E a incursão das filhas de Figo na moda – e a tal campanha recente que protagonizam a quatro, mãe incluída – , onde é que entra? “São os valores da família, da juventude, da continuidade, que também são importantes, sobretudo nesta época de incerteza em que vivemos. É uma fase em que os valores reconhecidos são bem-vindos. Por isso, tem-se notado uma preocupação das marcas em passar uma imagem de estabilidade e segurança, uma tentativa de tranquilização, a quererem transmitir uma ideia de ‘nós vamos continuar por aqui’.” A isso, há que juntar o inegável peso feminino neste universo. “É incontornável que as mulheres são quem mais faz mover este mundo da moda porque são quem consome mais. Há estudos que chegam a estimar que elas sejam responsáveis por 80% das compras no Mundo.” Ou como os Figo, que já foram apelidados de família-revelação do meio publicitário e comparados aos Beckham – que se tornaram uma referência na área da moda -, parecem ostentar com invejável facilidade a fórmula perfeita do sucesso para este universo.

Quem sai aos seus…

E se a campanha recente das mulheres Svedin deu nas vistas pela inédita “reunião familiar”, os rebentos do casal já foram esboçando, ao longo dos últimos anos, passos mais ou menos subtis nesse mundo. Em outubro de 2016, Martina e Stella, as filhas mais novas, foram notícia por terem protagonizado um editorial de moda para crianças e adolescentes da edição espanhola da “Vogue”. A mãe fez questão de exibir com orgulho o desempenho das caçulas nas redes sociais. Um mês depois, era Daniela, a mais velha, que fazia títulos em sites especializados e revistas. Acompanhada pelos pais, a jovem marcou presença no “Le Bal”, baile de debutantes organizado desde o século XVIII em Paris, que é uma espécie de apresentação à sociedade das novas gerações das elites mundiais. Nessa edição, em que Daniela brilhou com um vestido do estilista francês Jean-Paul Gaultier, participaram apenas 17 jovens de todo o Mundo, entre aristocratas, descendentes da realeza e filhos de estrelas de Hollywood. Pouco depois, Daniela estreava-se como modelo nas páginas da revista “Fashion”, da “Hola”, dando corpo às tendências outono-inverno 2019. A jovem integra hoje a agência de modelos Wild MGMT.

Individualmente ou em conjunto, os vários elementos da família Figo são hoje uma mais-valia apetecível para as grandes marcas
(Foto: redes sociais da família)

Quanto a Martina, a irmã do meio, que partilha com Daniela o tom do cabelo (loiro) e a cor dos olhos (castanhos), estreou-se ainda garota, no tal editorial de moda para crianças e adolescentes, mas só em 2018 teve a primeira experiência mais a sério, quando foi rosto da marca espanhola NAC. Hoje, Martina, que fala seis idiomas e é amante do piano, é representada pela Uno Models, uma agência de modelos de topo, e exibe nas redes sociais vários trabalhos que foi fazendo ao longo dos últimos dois anos. Um deles aconteceu há mais ou menos um ano, por esta altura, quando protagonizou com a irmã mais velha, Daniela, a primeira campanha para a marca de joias Rabat. As duas filhas mais velhas do casal coincidem, garantem as publicações especializadas, no perfil discreto e elegante e na versatilidade, tão importantes para qualquer modelo. A esses atributos juntam a popularidade de que gozam nas redes sociais – sobretudo Daniela, que tem 80 mil seguidores no Instagram.

Neste puzzle, falta ainda encaixar Stella, a mais jovem das irmãs Figo. Com apenas 15 anos, e traços físicos bem distintos das irmãs – mais morena, mais parecida com o pai -, Stella só no mês passado se estreou numa grande produção de moda, quando posou ao lado das irmãs e da mãe para a marca de joias espanhola. Não é público que seja já representada por qualquer agência nem é sequer claro se tenciona repetir a experiência. Certo é que os pais parecem, para já, cautelosos em relação ao futuro de qualquer uma delas no mundo da moda. “São pequenas coisas que fazem porque gostam, mas só como hobby”, disse aos jornalistas Figo, a propósito do assunto. Helen alinha em uníssono, mesmo que, no caso dela, o currículo profissional ostente uma palpitante carreira na moda. “Não creio que seja esse o caminho de que estão à procura. Estão muito centradas nos estudos e, para já, essa é a prioridade”, destacou. E o percurso académico das descendentes até ao momento cobre-a de razão. Daniela já completou um curso de Biomedicina em Londres e prepara-se para prosseguir com os estudos de Medicina na Universidade de Navarra, enquanto Martina segue o sentido contrário, estando de partida para Londres, para ingressar num curso de Farmácia (Stella, com 15 anos, ainda frequenta o Ensino Secundário). Resta saber se a moda continuará a encontrar espaço por entre as exigentes ambições profissionais.