Gémeos&Sócios

Não faltam casos de irmãos gémeos que se lançam juntos em projetos empresariais. No entanto, dizem os especialistas, a genética não é a alma do negócio.

Teresa e Rita Horgan despertaram cedo para os negócios. Em pequenas, montaram um café em casa e obrigavam os familiares a ir lá comer. E a pagar. Também tinham uma banca no terraço da casa de férias onde vendiam colares e pulseiras de missangas. Depois, passaram a ir vender para a praia. O exemplo familiar acicatou o empreendedorismo. “O nosso pai começou nos negócios aos 14 anos”, sublinha Teresa.

Atualmente, as irmãs gémeas têm 26 anos e gerem a Slow Closet, uma plataforma online em que é possível vender e comprar roupas, sapatos e acessórios em segunda mão, que lançaram em outubro do ano passado. “Estamos a mudar mentalidades”, afirmam, empenhadas em incrementar a economia circular. O conceito inspirou-se na própria vivência, até por serem “as primas mais novas”. “Somos muitos primos e sempre herdámos roupas uns dos outros. A nossa mãe também comprava roupa nova, mas a maior parte era usada. E sempre achámos estranho as pessoas comprarem roupa nova todas as semanas.”

Teresa e Rita Horgan mostraram desde cedo queda para os negócios em conjunto. Os familiares foram os primeiros clientes
(Foto: Rui Oliveira/Global Imagens)

Por enquanto, Teresa é quem se dedica integralmente ao projeto, depois de se ter licenciado em Marketing e feito mestrado em Gestão. É a porta-voz. Enquanto isso, Rita, nutricionista, trabalha na Direção-Geral da Saúde, conciliando responsabilidades. E tudo corre pelo melhor. “Conhecemo-nos muito bem e somos um bocado ‘furacão’. Juntas somos muito eficientes, muito metódicas e muito práticas”, garante Teresa, embora diga que são “diferentes em muita coisa”.

Aos 30 anos, Marco e Nuno Moreira andam sempre juntos. São os melhores amigos. Desde 2010, têm a Escola de Dança Gémeos Moreira, em Gondomar. Recentemente, arriscaram na área do Alojamento Local e lançaram o projeto Maria Vinagre, com a mãe, onde o destaque vai para peças de alta bijuteria em aço. “Fomos sempre parceiros em tudo. Ainda muito novos, organizávamos espetáculos. Aos 12 anos, tínhamos um viveiro em casa com aves e hámsteres e, sem os nossos pais saberem, íamos às lojas vendê-los”, confidencia Marco, certo de que a atitude já não merece castigo.

Marco e Nuno Moreira têm uma escola de dança, arriscaram na área do Alojamento Local e ainda lançaram um projeto com a mãe
(Foto: Rui Oliveira/Global Imagens)

Assim como Teresa e Rita, começaram novos a querer conquistar alguma independência, mas também não descartam que o ambiente familiar os influenciou. Aliás, o facto de os pais andarem nas danças de salão acabou por atrair Marco e Nuno. “Inicialmente, pensávamos que era para meninas, mas fomos ver um espetáculo da professora dos nossos pais e foi aí que decidimos que queríamos praticar.” Tinham oito anos e depressa se afirmaram na competição, sempre perto um do outro. Assim como se tornaram próximos também como modelos em desfiles ou em campanhas.

Genética ou ambiente

Especialista em genética no Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra (CHUC), Fabiana Ramos explica que “gémeos monozigóticos [os chamados gémeos verdadeiros] partilham quase 100% da informação genética”. “O óvulo é único. Por isso, têm mais motivos para crescer de forma semelhante.” Do ponto de vista médico, mesmo que sejam separados à nascença e cresçam em ambientes diferentes, os gémeos idênticos “têm tendência a desenvolver doenças semelhantes”. Assumindo que a partilha de material genético pode levar a “respostas idênticas às influências externas”, a médica vê as coincidências profissionais como uma “questão social”.

Natureza (biologia), meio, genética ou ambiente é uma equação que, segunda a psicóloga Filipa Rouxinol, “não é tão linear como se gostaria”. “A verdade é que, no início do desenvolvimento da criança, o ambiente acaba por refletir/reforçar a genética de uma forma passiva, ou seja, são os pais que fazem as escolhas pelos filhos – vestir roupas iguais, frequentar as mesmas atividades e as mesmas turmas/escolas. Mas, mais tarde, principalmente na adolescência, o que se verifica é uma correlação ativa, em que a maturação e a maior liberdade de escolha permitem uma seleção de atividades de acordo com os gostos e com as tendências genéticas mais marcantes, o que pode aproximar ainda mais os gémeos no empreendedorismo.”

Corroborando do ponto de vista da geneticista Fabiana Ramos, Filipa nota que “os estudos com gémeos permitem perceber que as diferenças em monozigóticos são principalmente causadas pelo ambiente não partilhado, pois partilham o mesmo código genético”. Por outro lado, nos gémeos dizigóticos, “as diferenças são causadas tanto pelo ambiente não partilhado como pela própria genética”. Assim, “o desenvolvimento do ser humano é produto de uma interação dinâmica e contínua entre o próprio e as experiências que o contexto lhe fornece”, o que pode justificar algumas das decisões que vão para além dos laços de sangue ou até mesmo do ADN.

No caso de Carlos e Rui Fragoso Malato, de 49 anos, foram fatores externos que levaram ao fim da relação profissional, sem nunca os distanciar a nível pessoal. Gémeos verdadeiros, têm “uma empatia nata” e até tiveram “dois negócios juntos”. Primeiro, na área da jardinagem; depois, na Casa das Queijadas de Oeiras, onde trabalharam de 2006 a 2008. “Acredito que se tivéssemos tido mais sorte a nível financeiro, a coisa teria corrido melhor. Mas, como se diz, ‘em casa onde não há pão, todos ralham e ninguém tem razão’. De resto, temos uma grande afinidade”, assegura Carlos. Os dois têm formações diferentes, mas os percursos acabam sempre por se cruzar e ambos são, atualmente, chefes de cozinha, mas em separado.

Falsos, mas inseparáveis

Filipa Rouxinol constata que, “na sociedade, há uma pressão para que os gémeos sejam iguais”. Assim foi com Bianca e Cláudia Silva, que, mesmo inconscientemente, sempre fizeram “tudo juntas”. Gémeas falsas, partilham o lado mais criativo da vida e, em julho deste ano, lançaram a marca de meias Kinda Socks, inspiradas por uma paixão que vem de infância. “Se havia crianças que odiavam receber meias na noite de Natal, nós éramos o oposto e, nos dias de hoje, sempre que vamos visitar um país diferente, o nosso ‘guilty pleasure’ são meias”, relatam. O percurso escolar foi o mesmo. Ambas formaram-se em Ciências da Comunicação e especializaram-se em Photoshop e em Marketing Digital. A par do negócio, aos 25 anos, trabalham na mesma empresa de marketing e publicidade.

Inspiradas por uma paixão que vem da infância, Bianca e Cláudia Silva lançaram em julho uma marca de meias
(Foto: Carlos Pimentel/Global Imagens)

A cor do cabelo serve para as distinguir e Bianca jura que é fácil trabalharem juntas, embora possam surgir pequenas quezílias perante opiniões divergentes. “Se não fôssemos gémeas, não seria a mesma coisa”, jura Cláudia. Escuteiras durante uma década, sentem que isso “fortaleceu o sentido de resiliência, persistência, companheirismo e espírito de equipa”.

Jonathan e Kevin Sampaio são igualmente gémeos dizigóticos. Mas, mesmo provenientes de óvulos diferentes, são inseparáveis. “Vivemos sempre juntos”, justificam. Nascidos em França, cresceram em Felgueiras onde criaram a marca Deux Sampaio Sneakers & Wine, dedicada a calçado e vinhos, e querem “lançar outros segmentos”. “A ideia a longo prazo seria ter uma marca completa (roupa, cosmética…). Para além deste projeto, estamos a trabalhar num outro nos Estados Unidos”, antecipam. Jonathan e Kevin poderiam ter arriscado com outros sócios ou a solo, mas concluíram que fazia “todo o sentido” estarem lado a lado nos negócios. “Começámos juntos enquanto modelos, criámos um nome no mercado nacional e internacional, não faria sentido não avançarmos juntos neste momento.”

A mais-valia de serem iguais

Catarina e Raquel Jacob estrearam-se em “Morangos com açúcar”, pois “as personagens precisavam de ser mesmo gémeas para poder haver ligação com a história”. A série juvenil da TVI abriu-lhes as portas para outros trabalhos, inclusive na moda, mas, 13 anos depois, aos 30 de idade, é no Centro Laser de Matosinhos que estão focadas. Têm uma sócia que “serve como mediadora” quando têm “opiniões divergentes”, mas Raquel não duvida que só poderia ter a irmã a gerir e a fazer crescer um negócio próprio, até por viver dividida entre Portugal e a Grécia.

Catarina e Raquel Jacob, que foram atrizes em “Morangos com açúcar”, são sócias no Centro Laser de Matosinhos
(Foto: DR)

Gémeas verdadeiras, sempre foram muito unidas e até ambicionavam “construir uma casa suficientemente grande para as duas famílias ou ter uma casa em cima da outra”, para “nunca estarem longe”, revela Catarina.
Teresa Horgan também considera que é uma mais-valia para o negócio ser gémea de Rita. “As pessoas têm curiosidade e sentem-se mais familiarizadas. E também aparecemos mais nos media.” Pois parece que sim.