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Manuel Pizarro: o otimista que não sabe dizer não

Fotos: Ilustração: João Vasco Correia

Manuel Pizarro é ministro da Saúde

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Dialogante, conciliador, hesitante no momento de decidir. Trocou a tranquilidade de Bruxelas pelo cargo governamental mais complicado nesta fase da governação. Pizarro não foi capaz de recusar.

Em 2019, aceitou o nono lugar na lista do Partido Socialista ao Parlamento Europeu, correndo o risco de uma não-eleição, vendo à sua frente, em posição elegível, uma camarada estreante. O PS Porto baixaria armas a pedido seu, líder destacado da Distrital. Dois anos antes, quando PS e Rui Moreira rasgaram a coligação e o Largo do Rato decidiu retirar o apoio ao candidato independente, ficou entre a espada e a parede. Incapaz de dar um murro na mesa, aceitou ser o candidato do partido, sabendo que as circunstâncias ajudariam muito a uma derrota. Agora, que estava no Parlamento Europeu a fazer o que gosta, a pensar, dizem amigos, numa terceira candidatura (2013 e 2017) à câmara da cidade onde nasceu, António Costa apresenta-lhe uma proposta indecente – o cargo governamental mais difícil nesta fase da governação, deixado vago por Marta Temido. Manuel Pizarro não foi capaz de recusar o lugar “a que nunca aspirou”, garantem-nos.

“Não sabe dizer não”, afirma quem o conhece, dando como exemplos os atrás descritos. Há nele “incapacidade de “cortar a direito”. “Hesitação”, nos momentos em que a decisão urgente e difícil se impõe. Com o setor e os atores políticos, da esquerda à direita, a exigirem respostas e sinais rápidos de mudança, essa “incapacidade” pode tornar-se um problema. A natureza dialogante e conciliadora e a experiência acumulada podem não chegar caso venha a perceber-se a ausência de peso político para impor em Conselho de Ministros uma política própria para a Saúde. “Não estou a vê-lo a dar um murro na mesa”, diz António Araújo, diretor do Serviço de Oncologia Médica do Centro Hospitalar Universitário do Porto. “Tentará fazer o melhor, mas duvido muito que consiga a autonomia administrativa e financeira dos hospitais e do Ministério da Saúde.” O irmão de Fernando Araújo, o desejado de António Costa para CEO do SNS, confessa: “Não estou otimista”. Considera que o amigo aceitou o cargo para fazer a vontade ao líder do Governo. Um grande favor. “O primeiro-ministro precisava de alguém consensual, que fosse capaz de cumprir a linha política que tem vindo a seguir. Não era, de maneira alguma, uma aspiração do Manuel”, diz o também dirigente do PSD.

Conhece o novo ministro da Saúde desde os bancos do Liceu Rodrigues de Freitas, época em Pizarro defendia as cores da Juventude Comunista Portuguesa. Seguiram juntos na faculdade. O curso seria interrompido por três anos “em parte devido à enorme atividade política” recorda o amigo. Então, já como militante socialista.

O fervor ideológico foi-se perdendo. “É um socialista moderado”, frisa António Araújo. “Um social-democrata do meio da tabela”, na definição de um outro amigo. “Um político que luta até a exaustão pelas suas ideias. Ficou nele o melhor do passado no PCP”, acrescenta Rui Moreira. A Esquerda está pessimista: “Como não? Sempre se opôs à abertura de vagas em exclusividade e é muito favorável à gestão privada dos hospitais públicos”, sublinha José Gusmão. Para o dirigente do Bloco de Esquerda, é claro: “Se as coisas ficarem na mesma, é o suficiente para ficarem piores”.

Miguel Guimarães e Manuel Pizarro foram colegas de faculdade. O bastonário da Ordem dos Médicos recorda as competências do novo ministro como médico. E como político, na Assembleia da República, no Governo – foi secretário de Estado em 2008 e em 2011 -, no Parlamento Europeu, sempre com especial dedicação à área da Saúde. “Tem experiência política, tem algum peso político e, julgo, capacidade para passar as suas ideias. Sabe o que é preciso fazer. Mas precisa do apoio do primeiro-ministro. E do conselho de ministros”, advoga o bastonário. Miguel Guimarães salienta “o enorme sentido de dever cívico, que o levou a aceitar um lugar que lhe vai trazer dissabores e dificuldades” quando tinha em Bruxelas “uma posição confortável”. Amigo antigo, o bastonário divide as águas: “Negócios à parte e Manuel Pizarro sabe que será assim”.

A medicina, a literatura e a política são os grandes interesses do novo ministro. A cidade do Porto e o F. C. Porto, duas paixões. Que partilha com Rui Moreira. “Em termos políticos é brilhante. Extremamente trabalhador, é das pessoas mais competentes com quem trabalhei. Tenho saudades da competência dele”, admite o presidente da Autarquia. “É, ao contrário de Marta Temido, avesso a conflitos. Bom negociador, bom conciliador vai tentar pacificar o setor, mas não sei se será eficaz quando for preciso cortar a direito. Se puder aplicar a sua visão correrá bem. Se for apenas para executor de uma lógica de continuidade, não terá sucesso.” Convém lembrar: Manuel Pizarro é um otimista.

Manuel Francisco Pizarro de Sampaio e Castro
Cargo:
ministro da Saúde
Nascimento: 02/02/1964 (58 anos)
Nacionalidade: Portuguesa (Porto)