Publicidade Continue a leitura a seguir

O café nunca poderia ser uma bebida de lata

Conhecido pelas suas propriedades estimulantes, por espevitar a atividade intelectual e física, o café é rotulado de excitante e, muitas vezes, considerado culpado pelas insónias. Mas o que acontece numa pessoa não é obrigatoriamente o que acontece noutra. Num ponto há consenso: nada de exageros.
Café com cheirinho (leia-se, com bebida alcoólica) é uma velha tradição que ganhou raízes. É considerada uma feliz união entre café e seus acompanhantes que podem ser aguardente, conhaque, uísque, brandy.
Como surge o descafeinado? Há dois métodos para descafeinar um grão verde. Ou amolece-se o grão em água quente ou em vapor, tornando-o poroso e logo a seguir mergulha-se num solvente para diluir apenas a cafeína - e é lavado mais uma vez antes de secar. Ou mergulha-se o grão durante várias horas em água para que a cafeína se dissolva naturalmente. Em ambos os métodos perde-se algum perfume e sabor.
Um cafeeiro tem as suas necessidades. Quanto maior a altitude, mais lenta a maturação dos frutos, maior a riqueza do café em elementos aromáticos.
O Blue Mountain da Jamaica é chamado o caviar do café. Fruto de colheitas de exceção, das mais caras do Mundo, é transportado em toneis de madeira branca e não em sacos de serapilheira.
Caracoli é o nome do fruto do café quando tem apenas um grão, em vez de dois como é mais habitual. Não se sabe se será uma anomalia botânica. O que se sabe é que o caracoli tem um sabor mais concentrado, mais intenso e dá origem a um café bastante apreciado no Brasil, na Colômbia e na Alemanha.
Chicória é uma planta herbácea, um sucedâneo do café. Aquando do bloqueio a França, Napoleão I impôs o seu consumo e alguns franceses tomaram-lhe o gosto.
Ideia biológica, ideia genial. Na década de 80 do século passado, em Chiapas, México, foi feita uma experiência em que se substituíram os inseticidas por abelhas ávidas pelos minúsculos insetos que atacam os cafeeiros. Resultou e a tática foi adotada na Colômbia e noutros países da América Central.

Publicidade Continue a leitura a seguir

Texto de Sara Dias Oliveira

O café é uma bebida que exige atenção, dedicação, tempo. E a sua história é rica, suculenta, aromática, pelo menos desde o século XV. Conta a História que os grãos dos cafeeiros não passaram despercebidos aos camponeses e pastores da Etiópia que começaram por moê-los para comer em papas. Os grãos atravessaram o mar Vermelho, chegaram ao Iémen, daí não demoraram a instalar-se em Meca e no Cairo, espalhando-se depois por todo o mundo muçulmano. Chegou à Europa no século XVII e ainda hoje, onde quer que esteja, nunca se deixou enlatar ou engarrafar. Os seus aromas, perfumes, sabores, qualidades e intensidades, não vivem bem em latas fechadas. A bebida do convívio, da proximidade, das conversas, do lazer e do prazer precisa de liberdade para mostrar o esplendor dos seus sabores. O seu poder.

Duas em cada três pessoas bebem café, mais de 2,5 mil milhões são servidos num único dia em todo o Mundo, 70 países produzem cerca de 100 milhões de sacos de café por ano que representam seis milhões de toneladas. É obra. Um cafeeiro dura, em média, 15 anos, e aguenta seis a oito colheitas por ano. O fruto do café, a cereja como é conhecida, tem dois grãos. Os grãos são lavados, secos, triados, selecionados e depois torrados. São estas etapas que conferem qualidade e personalidade.

O café chegou a ser o segundo produto mais usado nas transações comerciais, logo a seguir ao petróleo.

O café tem os seus segredos, os seus mistérios. Não é uma bebida banal. Precisa de uma boa água sem cloro, de nascente mineral ou filtrada. Deve ser preparado entre 90 e 95 graus, deve levantar fervura mas com cuidado. Água demasiado fria não consegue extrair os compostos aromáticos do café. Água a ferver quebra esses compostos e torna o café amargo. O café tem a sua ciência e fechá-lo numa lata seria, na verdade, contrariar a sua própria natureza.

Ar puro, entre 800 e dois mil metros de altitude, temperatura média entre 20 e 25 graus, chuvas regulares, mas não muita humidade. Estes são alguns dos requisitos que os cafeeiros valorizam. No entanto, não são muito esquisitos, tanto se dão nas florestas no Brasil, como nos socalcos do Iémen, ou nas escarpas na cordilheira dos Andes.

Uma bebida tão apreciada espicaça a imaginação. Foi isso que aconteceu em várias partes do Mundo. A primeira máquina de café, uma cafeteira com filtro, foi inventada em França, em 1800, por Jean-Baptiste de Belloy. Tinha duas partes sobrepostas com água na parte de cima que escoava através do café moído colocado sobre um filtro. A cafeteira foi um êxito e imitada em várias partes do mundo.

Em 1908, a alemã Melitta Bentz, mãe de família, cansada de café com borras, picou uns pequenos orifícios numa vasilha de cobre, colocou um papel mata-borrão e filtrou o seu café. Melitta percebeu que a sua invenção iria dar que falar e registou a patente em Berlim. Pouco depois, surgia a Bentz a vender filtros de papel e suportes para filtros. Os filtros Melitta. O método de fazer café com filtro a alta pressão foi criado anos mais tarde pelo italiano Achille Gaggia, em 1948.

O segredo de um bom café: água de qualidade, lote selecionado, moagem adequada.

As inovações à volta do café não param. Não há café em lata, porque o café não é uma bebida pronta a beber, exige preparação e até um certo ritual – por muito rotineiro que seja -, mas há cápsulas com café que vieram alterar hábitos de consumo. O novo método, que permite tomar café sem sair de casa, surgiu há vários anos e tornou-se um negócio que está instalado em vários países. Portugal que o diga. O sistema é prático e cómodo. Ou seja, pó de café dentro de uma cápsula, injeção de água sob alta pressão durante alguns segundos. E o café pinga para uma chávena estrategicamente colocada.

O café não é todo igual. Um café, várias modas: “petit noir” em França, “ristretto” em Itália, “irish coffee” na Irlanda, café “brûlot” com aguardente queimado com açúcar em New Orleans, café vienense com natas batidas na Áustria. Café curto, café comprido, café pingado em Portugal. E o café turco, o único café servido em borras que permitem a arte da adivinhação, a chamada “cafeomancia.” Volta-se a chávena no prato logo que é bebido e os desenhos, reza a tradição, adivinham o futuro. Uma cruz é sinal de cuidado com a saúde. Um traço que parece uma borboleta assinala a presença de inimigos por perto. Uma cabeça de cavalo é bom sinal para os assuntos amorosos e um peixe indica sorte no futuro.