Crítica musical, por Jorge Manuel Lopes.
A ideia da compilação “Finally enough love – 50 number ones” (Warner) é engenhosa: olhar para a tabela Dance Club Songs da Billboard, baseada nas canções mais populares em discotecas americanas, de acordo com os disc jockeys, e alinhar a meia centena de primeiros lugares alcançados por Madonna. Engenhosa porque recontextualiza a sua obra, sublinhando uma presença cintilante na cultura da música de dança nos últimos 40 anos. Os três CD são dominados por uma diversidade de remisturas a cargo de mãos mais ou menos familiares da cultura dançável.
Alinhados cronologicamente, os 50 temas são uma narrativa possível do caminho feito pela eletrónica que faz mexer os corpos. Uma narrativa mais variada e disponível para surpresas até ao final do século passado. Shep Pettibone liberta uma feitiçaria de estúdio jubilosa sobre “Into the Groove”, em 1985; Bill Bottrell dá um suplemento de linhas de baixo e percussão a “Like a prayer” (89) que a transporta para outra dimensão; a dupla Masters at Work aplica uma transformação radical a “Erotica” (92), acelerando-a a golpes de garage house; David Morales imprime músculo e glitter a “Deeper and deeper” (93); Junior Vasquez traz soberbas cavalgadas tribais e mutações profundas a “Secret” (94) e “Bedtime story” (95) e Sasha aplica uma dose de big beat espacial a “Ray of light” (98).
Apesar de pontuais momentos de inspiração, como o drama que os Deep Dish trazem a “Music” em 2000, a partir desse ano acentuam-se as remisturas saídas de linhas de montagem trance, electro house e EDM, com escassa imaginação e ainda menos nuance. Ainda assim, Eddie Amador confere urgência a “Give it to me” (08) e Avicci monta uma sinfonia cósmica com “Girl gone wild” (12). A coletânea termina com sinais de esperança, trazidos pela versatilidade do trabalho de Tracy Young em “I rise” e “Crave” (19) e, acima de tudo, pela viagem que Honey Dijon oferece a “I don’t search I find” (20), através de um longo túnel house iluminado com néon verde.