Publicidade Continue a leitura a seguir

Maskne, o acne destes dias

Fotos: Artur Machado/Global Imagens

A máscara é um corpo estranho sobre a pele, que causa fricção mecânica, calor, falta de ar fresco

Publicidade Continue a leitura a seguir

A par de palavras como confinamento ou quarentena, a pandemia também lançou o termo “maskne”. Refere-se ao acne provocado pelo uso da máscara facial. Médicos e doentes falam dos novos problemas de pele e dos cuidados para os prevenir.

A máscara tornou-se acessório obrigatório em 2020, à conta da covid-19. Protege do novo coronavírus mas também potencia problemas de pele. De tal forma que a pandemia acabou por cunhar um novo termo: “maskne”, que resulta da junção das palavras mask (máscara em inglês) e acne.

A verdade é que “o aparecimento e/ou agravamento de acne devido ao uso prolongado de máscara está documentado na literatura médica, existindo diversos estudos observacionais que demonstram a ocorrência desta associação”, sublinha a dermatologista Helena Toda Brito, com base num “estudo recente publicado no jornal da Academia Europeia de Dermatologia e Venereologia”. Analisados os efeitos adversos cutâneos provocados pelo uso de máscara em 1 231 participantes, o trabalho concluiu que o agravamento de acne foi a queixa cutânea mais frequente (32,2%).

Joana Beltrão Martins, de 42 anos, não integra a amostra deste estudo, mas consta do rol de casos de “maskne”. “Senti-me recuar no tempo”, conta a engenheira têxtil, referindo-se às memórias de acne que lhe marcaram a adolescência, apesar de a reação “não ter comparação”. Foi no final do verão, sem ter feito praia, que começou a sentir algo semelhante a “uma reação alérgica”. “Era próximo do cieiro, como os bebés ganham, mas doía. E, a certa altura, apareceram borbulhas grandes”, recorda Joana, notando que, “quando mais sintético era o tecido da máscara, mais agredida ficava”. Por isso, passou a priorizar materiais com mistura de viscose e linho, sentindo que, “quanto maior a percentagem de fibra natural, melhor a pele respira”. As máscaras laváveis e certificadas também se revelaram as melhores opções.

Para Constança Firmino, de 29 anos, o problema revelou-se ainda durante o confinamento, quando já protegia a face para ir ao supermercado ou nos passeios higiénicos que realizava. Nessa altura, “começaram a aparecer borbulhas muito esquisitas no queixo e maçãs do rosto”, relata a influencer e relações públicas, agora já sem marcas do que viveu.

“Maskne” ou dermatite?

Apesar de se ter popularizado, o termo “maskne” não reúne consenso, explica a dermatologista Paula Quirino. Para esta especialista, “as máscaras são responsáveis por uma patologia que é uma dermatite periorificial e, mais frequentemente, perioral, que é diferente do acne”. Ou seja, na sua opinião, “o que a máscara desencadeia e/ou agrava não é acne”.

“O acne é uma doença de pele que se apresenta com lesões retencionais (pontos negros) e/ou inflamatórias (espinhas) na zona médio-facial do adolescente, focalizando-se na zona perioral/mandibular na mulher adulta, havendo relação com estímulo hormonal”, pormenoriza a médica, realçando que “as pessoas com suscetibilidade para agravamento da pele da face com a máscara são as que têm tendência para a couperose/rosácea”. Nestes casos, a pele “fica a vermelha facilmente perante qualquer fonte de calor e as crises de inflamação evoluem por surtos ao longo da vida”.

Segundo Helena Toda Brito, “o que distingue o acne associado ao uso da máscara é a localização das lesões”. Ao contrário do juvenil, que afeta sobretudo a fronte; quando as lesões são causadas por máscara “surgem tipicamente na área coberta”, podendo manifestar-se através de pápulas (borbulhas vermelhas), pústulas que podem ser dolorosas, comedões abertos (pontos negros) e comedões fechados (pontos brancos)”, clarifica.

Importa esclarecer, porém, que nem todos os problemas de pele são acne. “Há outras doenças de pele que podem assemelhar-se clinicamente a acne e que podem igualmente agravar com a utilização de máscara, mas cujo tratamento é diferente”, por isso o diagnóstico deve ser confirmado por um médico, recomenda Helena Toda Brito. Neste ponto, Paula Quirino ressalta que, “na fase inicial de crise grave, pode ser necessária medicação oral associada a medicação tópica, que deverá ser mantida de forma a prevenir a recidiva das lesões”.

Limpar, sem agredir, é a chave

“Maskne” ou dermatite, a verdade é que a máscara é um corpo estranho sobre a pele, que causa fricção mecânica, calor, falta de ar fresco. O suor e a humidade proveniente da respiração criam o ambiente ideal para a multiplicação de microrganismos e o entupimento dos poros. A limpeza da pele é fundamental e é indicada por quem sofre e por quem trata. Como assume Joana Beltrão Martins, agora é feita “a dobrar, assim como a hidratação com produtos para peles extremamente sensíveis”.

Constança Firmino soma à rotina, após o ritual de higienização, “óleo de Tea Tree por causa da sua componente anti-inflamatória e hidratante, assim como cremes de CBD”. A criadora de conteúdos fez “duas limpezas faciais”, que considera terem ajudado “muito a melhorar”. Um hábito que a médica Paula Quirino desaconselha, pois “a utilização de esponjas, esfoliações, limpezas de pele são completamente contraindicadas”. A justificação é simples: “provocam uma irritação que vai ter como consequência a descompensação na flora microbiana”.

Limpar a pele sem a agredir é o segredo. “Água morna e um produto de limpeza suave, com pH neutro, hipoalergénico e sem perfume”, seguindo-se um creme hidratante “de composição simples, sem ingredientes potencialmente irritativos” é o essencial, sustenta Helena Toda Brito. “No caso de existir acne preexistente, manter os tratamentos indicados pelo dermatologista, de modo a minimizar o risco de agravamento da doença”, sugere a médica.

Já a maquilhagem “deve ser evitada pela complexidade dos cremes com cor e pela agressividade dos produtos que terão de ser utilizados para remover a maquilhagem”, reforça Paula Quirino. Assim, até mesmo bases e corretores não são recomendados, já que “representam um fator potencial de obstrução dos poros e irritação da pele”, acrescenta Helena Toda Brito.

Se a máscara é uma inevitabilidade, pelo menos nos tempos mais próximos, ter a pele seca, inflamada e com lesões é evitável. Com os cuidados corretos e na hora certa.