Venâncio Mondlane. O pastor evangélico que faz ferver Moçambique

Espalha a palavra de Cristo na igreja Ministério Divina Esperança e a dos homens em vídeos nas redes sociais. Tornou-se o principal rosto da oposição e recusa a derrota nas presidenciais.

“Sou o presidente eleito pela vontade genuína do povo. Juro pela minha honra respeitar a constituição e as leis, usar todas as minhas energias físicas, psicológicas, intelectuais e até emocionais em benefício desta terra para que, em cinco ou dez anos, ela se torne uma das maiores nações do Mundo.”

Foi assim, de Bíblia na mão, que Venâncio Mondlane fez uso da sua experiência como orador evangélico e a 9 de janeiro se dirigiu a quem o esperava no Aeroporto Internacional de Maputo, no seu regresso a Moçambique após dois meses em paradeiro incerto por questões de segurança. Durante esse período de ausência, gravou dezenas de vídeos que se tornaram virais e em que apelou à revolta dos compatriotas perante o que apelidou de “fraude eleitoral” ocorrida nas presidenciais de 9 de outubro. Clamou por manifestações, pediu greves, fez chamadas à resistência dos compatriotas. À distância, assistiu aos mais de 300 mortos nas ruas em protestos populares que terminaram em violentas intervenções policiais, conforme cálculos da plataforma independente Decide.

Segundo a Comissão Nacional de Eleições moçambicana, Venâncio Mondlane terá ficado em segundo lugar com 20,32% dos votos. O vencedor anunciado foi Daniel Chapo, da Frelimo, com 70,67%. Os resultados nunca o convenceram, que sempre falou em “manipulação”. Foi a primeira vez que concorreu a chefe de Estado, num processo que não se afigurou fácil. A Coligação Aliança Democrática (CAD), que fundou, foi excluída por “não reunir requisitos legais”. Acabou por obter o apoio do Povo Otimista pelo Desenvolvimento de Moçambique (Podemos), partido fundado por dissidentes da Frelimo. O mesmo a que esta semana acusou o seu presidente, Albino Forquilha, de traição por autorizar a tomada de posse dos 43 deputados no Parlamento, “violando a letra e o espírito” do pré-acordo eleitoral traçado.

A proximidade a uma força considerada de Esquerda socialista fez levantar ainda mais dúvidas sobre o posicionamento político de Venâncio Mondlane, que, ao mesmo tempo, se diz admirador do ex-presidente brasileiro Jair Bolsonaro e que numa visita a Portugal realizada no último verão foi recebido pelo Chega. A primeira experiência partidária teve-a com o democrata-cristão Movimento Democrático de Moçambique (MDM), pelo qual obteve surpreendentes 42% nas autárquicas de 2013 em Maputo e foi depois deputado nacional. Incompatibilizou-se e inscreveu-se na Renamo, de Direita conservadora, que também representou no Parlamento e a cuja liderança tentou concorrer, sendo afastado por não ter os anos suficientes de militância para o efeito, o que o levou a formar a CAD.

Nascido em Lichinga, no noroeste de Moçambique, numa família de cinco irmãos, notabilizou-se como bom estudante e pelo amor a Cristo. Apesar da coincidência de apelido, Venâncio não é parente de Eduardo Mondlane (1920-1969), primeiro líder da Frelimo e considerado um dos pais da luta pela independência de Moçambique. Mas, num comício eleitoral realizado em setembro passado na cidade de Morrumbala, o então candidato não resistiu e afirmou que “55 anos depois do assassinato de Eduardo Mondlane, não imaginavam que surgiria um Mondlanito”. A citação, publicada nas páginas do jornal “Folha de Maputo”, não agradou à família do Mondlane original, que fez sair um comunicado no qual criticou o “uso indevido” do nome.

Venâncio Mondlane formou-se engenheiro florestal e no início da década de 1990 iniciou a participação em ações cívicas, notabilizando-se como coordenador do movimento “Jovens Solidários”, que ganhou destaque pela sua ação na ajuda às vítimas das violentas cheias de 2000. Pastor na igreja evangélica Ministério Divina Esperança, casou-se e teve três filhos.

Ao mesmo tempo que crescia na carreira como bancário no grupo português Millenium BCP, a que entretanto acedera, intensificou a participação nos média como comentador político. Ganhou fama e consolidou popularidade. Até se tornar o principal rosto da oposição num Moçambique dividido.

Cargo: Candidato derrotado às eleições presidenciais de Moçambique

Nascimento: 17/01/1974 (51 anos)

Nacionalidade: Moçambicana (Lichinga)