
O Consultório de Sustentabilidade desta semana por Joana Guerra Tadeu, ativista pela justiça climática e autora de “Ambientalista Imperfeita”.
Os produtos sustentáveis são muito mais caros que os convencionais? Ou seja, para viver de forma sustentável, é preciso gastar muito mais dinheiro?
Tiago Sequeira
Apesar de os produtos vendidos como ecológicos serem, em média, 75 a 85 por cento mais caros do que os produtos convencionais, uma vida sustentável é muito mais barata do que uma vida com elevadas emissões de carbono.
A ideia de que viver de forma sustentável é mais caro parte de uma visão distorcida, e altamente influenciada pelo mercado, do que significa “sustentabilidade”, que a define como uma categoria de consumo premium, geralmente associada a certificações e rótulos que posicionam produtos e serviços como escolhas superiores e associadas a um estilo de vida aspiracional, em que a adoção de determinadas práticas está ligada a valores de exclusividade, modernidade, inovação e ética.
O mercado apresenta soluções tecnológicas, como veículos elétricos ou painéis solares domésticos, como fundamentais para sermos sustentáveis, ignorando opções mais acessíveis e de impacto coletivo como os transportes públicos e a produção descentralizada da energia. Com este foco na responsabilidade individual, a contribuição para a sustentabilidade é reduzida a uma escolha do consumidor, perpetuando a lógica da necessidade de consumir para pertencer e participar na sociedade. E é por isso que 52% dos consumidores afirmam que ainda não adotaram um estilo de vida mais sustentável devido ao custo elevado das alternativas ecológicas – estamos tão habituados a vermo-nos como consumidores que nos esquecemos que há outras formas de avaliarmos o nosso estilo de vida e o impacto que tem na sociedade e no Planeta.
Muitas práticas sustentáveis podem não só reduzir o impacto ambiental como também aliviar o orçamento familiar: reduzir o consumo de carne e aumentar a ingestão de vegetais, saber fazer uma bainha, reparar o fio elétrico de um candeeiro ou selar as janelas para maior eficiência energética, encher o balde da esfregona com a água que corre enquanto esperamos que aqueça para começar o duche, reutilizar a caixa de gelado como tupperware, deixar de comprar guardanapos e papel de cozinha e usar panos, utilizar os transportes públicos em vez de investir em transporte próprio.
Estas práticas, há muito enraizadas nos hábitos de famílias mais poupadas, de classes média e baixa, surgem transformadas pelo mercado em produtos de luxo, embrulhadas em embalagens bonitas e vendidas como inovações ecológicas, ignorando a simplicidade e a acessibilidade com que sempre foram feitas. Quem consome de forma moderada e ponderada – por escolha ou necessidade – já tem um impacto ambiental reduzido e não precisa de mudar hábitos de consumo para contribuir para uma transição ecológica.
Só é mais caro ser sustentável para quem adota um estilo de vida insustentável como padrão. Em vez de criar novos nichos lucrativos, temos de aprender a viver dentro dos limites do Planeta, assegurando que essa transição não se faz à custa dos direitos dos mais vulneráveis, mas dos privilégios de uma minoria rica e poluidora. A sustentabilidade não é uma mercadoria nem um privilégio; deve ser a base de uma sociedade justa, onde viver dentro dos limites do Planeta é possível para todos, independentemente dos seus rendimentos.
*A NM tem um espaço para questões dos leitores nas áreas de Direito, jardinagem, Saúde, finanças pessoais, sustentabilidade e sexualidade. As perguntas para o Consultório devem ser enviadas para o email [email protected]