Miguel Arruda. Dos Açores para o Parlamento de malas na mão

Enamorou-se pelo PS, casou com o Chega, as autoridades suspeitam que se tenha apaixonado por bagagens alheias. Antes da política, foi expulso de uma tuna e serviu as Forças Armadas.

Corria o dia 19 de dezembro do ano passado e, numa das últimas intervenções na Assembleia da República antes de rebentar o escândalo que o viria a colocar nas bocas do Mundo, Miguel Arruda parecia premonitório ao arrancar uma fala dizendo que “todos os santos têm um passado e todos os pecadores têm um futuro”. Pouco mais de um mês depois, a 21 de janeiro, era alvo de buscas policiais por suspeita de furtos de malas nos aeroportos de Lisboa e Ponta Delgada. Doze foram-lhe apreendidas nas suas casas em ambas as cidades e outras cinco no seu gabinete parlamentar. Há suspeitas de que venderia a preços baixos na aplicação Vinted roupa desviada, o que sempre negou, aliás como todos os crimes de que é acusado.

André Ventura, líder do Chega, retirou-lhe a confiança política, apelou “encarecidamente” a que renunciasse ao lugar de deputado – ficou como não inscrito –, apontou-lhe “problemas psíquicos”. De um momento para o outro, Arruda viu-se isolado. A bancada do seu ex-partido disse mesmo não se responsabilizar pelo que lhe poderia acontecer. Foi o ponto mais baixo na carreira política deste antigo sargento do Exército que um dia escandalizou ao surgir de bandeira dos Açores enrolada à cintura da farda.

Casado e pai de duas filhas, Miguel Arruda lamenta as consequências que todo o caso das malas tem provocado nos seus mais próximos. “A família está um caco”, segundo definiu o próprio à SIC Notícias. “Rebentei psicologicamente”, admitiu o homem que nas redes sociais nunca escondeu admiração pelo polémico neonazi Mário Machado. Vai embora sem promessa de regresso breve. “Não sei quando volto”, deixou no ar.

Para trás ficam cinco comissões parlamentares, nomeadamente a de “Acompanhamento Integrado da Execução e Monitorização da Agenda Anticorrupção”, tema que lhe é caro. Durante a caminhada para as legislativas de março de 2024, quando encabeçou a lista do Chega pelos Açores e garantiu o lugar de deputado, visitou as obras do futuro Estabelecimento Prisional de São Miguel e gritou: “A máquina da Justiça vai começar a funcionar e colocar aqui ou noutra cadeia qualquer os corruptos da nossa terra”. Na noite eleitoral em que soube ter sido eleito, com 15,7% e terceiro maior partido no arquipélago, deixou a promessa de que “ninguém vai fazer pouco dos Açores”.

A iniciação política começara-a com uma longa e assumida simpatia pelo PS. Em 2021, já caído de amores pelo Chega, foi candidato à Câmara de Nordeste. Durante a campanha, pediu a redução do IMI no concelho – “o mais caro da ilha de São Miguel” –, atacou os beneficiários de Rendimento Social de Inserção – “a maior parte destas pessoas tem condições para trabalhar” –, acusou PS e PSD de “andarem como cão e gato”. O discurso não colheu. Dos 4753 eleitores inscritos, apenas 31 votaram nele, o que lhe valeu a última posição com pálidos 1,31%, atrás da CDU (3,21%), PS (21,37%) e PSD (69,96%).

Na ficha biográfica que assina oficialmente no site da Assembleia da República, Miguel Arruda diz ser licenciado em Ciências Biológicas e da Saúde, possuir duas pós-graduações, em “Segurança Alimentar e Saúde Pública” e em “Ambiente Saúde e Segurança”, além de dois mestrados, em “Ambiente, Saúde e Segurança” e em “Ciências Biomédicas”. Em seu nome, a NM encontrou duas teses no repositório da Universidade dos Açores, onde efetuou o Ensino Superior, defendidas em 2011 e 2014. O percurso universitário foi longo e ficou marcado por forte atividade extracurricular. Tão forte que acabou afastado da tuna por alegado mau comportamento.

Antes de enveredar pela vida política ativa, trabalhava na empresa intermunicipal Musami, que trata os resíduos ambientais de seis concelhos da ilha de São Miguel, depois de uma longa passagem pela SIGA, ligada à mesma área e igualmente de gestão pública. Tem, segundo a revista “Sábado”, uma dívida de cerca de seis mil euros em créditos acumulados em instituições financeiras, além de uma outra de 28 mil euros contraída na Caixa Geral de Depósitos. E agora um futuro incerto pela frente.

Cargo: Deputado não inscrito

Nascimento : 27/03/1984 (40 anos)

Nacionalidade: Portuguesa (Nordeste, Açores)