Uma casa para sempre
Na Aldeia de Melo, a autarquia de Gouveia recuperou e abriu agora ao público a casa de família de Vergílio Ferreira. Entre as montanhas, elegante levantada no largo, a casa não é para ser modo de visitarmos o passado. É para sempre. Torna-se agora uma máquina de perdurar e ir ao futuro.
A ansiedade de Ferreira pelo futuro era premente e tudo quanto escreveu pretendeu ser auscultação da essência para não se desperdiçar com o acessório nem caducar no típico de alguma época. Ferreira queria saber do futuro. Queria saber do que seria quando já não pudesse responder, para que sua resposta já estivesse dada através dessa intuitiva fortuna de ler a humanidade.
A Aldeia de Melo tem, por isso, uma espécie de lugar de nascer e de ressuscitar. Um lugar de não haver morte. A casa que agora está disponível para exposições e debates albergará também artistas e estudiosos para criar todo o tipo de arte e pensamento, uma residência como maternidade para que nada se detenha mas tudo se potencie, tudo comece e recomece, sem fim.
Tenho entendido que este poderá ser o autor que mais nutre na formação de um leitor. Talvez a par com Sophia, Ferreira tem a capacidade de convidar um novo leitor à avidez. O jeito que traz de seguir pelas ideias, adentrando assuntos enquanto sugere alguma trama, é meditação perfeita para que alguém se renda ao pensamento livre, lógico, construindo o inesgotável edifício da humanidade. Que tragédia não o termos obrigatório nas escolas, onde haveria de ser fertilidade pura para gerações despertas e sensíveis, gerações profundas e intrigadas.
A Casa Para Sempre vai convidar as escolas e acredito que se tornará uma maravilha para mostrar aos mais novos como a memória e a arte podem ser fundamentais para a identidade e estima das populações. De certa maneira, a casa, como a obra de Vergílio Ferreira, levanta-se contra o apagamento e a leviandade. A casa e a obra estão contra tudo quanto queira rasurar a identidade e a dignidade, estão contra tudo quanto impeça a liberdade e a estupidez.
Faltava a casa de Ferreira. Não porque o queiramos ver fantasma a ressurgir pelas portas. Mas porque queremos materializar o desejo de haver mais. Mais do que ele próprio buscou: humanidade, conhecimento, sonho, amor, futuro, lucidez.