Taylor Swift, uma história interminável
Crítica musical, por Jorge Manuel Lopes.
Vai para duas décadas que Taylor Swift é lida como uma narrativa infinita, uma obra em múltiplos e densos volumes escritos pela própria, pelos incontáveis fãs, pelos media. Cada fio de cabelo, real ou imaginário, e sua floresta de interpretações semióticas, é vertido em capítulos. Cabe ao resto do Mundo manter o foco nas canções, algo que se vai tornando cada vez mais difícil, e nunca tão difícil como em “The tortured poets department” (Republic/Universal), álbum de originais número 11, lançado em dois extensos blocos, com 122 minutos e 31 canções.
O primeiro bloco, dominado pela parceria habitual com Jack Antonoff, é sobretudo synthpop. A segunda parte, subintitulada “The anthology”, menos pop e mais inspirada, vive essencialmente da coabitação com um colaborador mais recente, Aaron Dessner, com cenários digitais mais abstratos, rusticidade analógica, piano e guitarras elétricas indie. Em comum, a copiosa evocação diarística, amarga e doce, de relações pretéritas. Neste disco há uma média de uma epifania ou catarse por tema. A escrita de Taylor Swift permanece vívida (e vivida, aparentemente), abundam os pormenores sónicos, mas é aflitiva a falta de nuances ao longo de um registo tão extenso, aliada a uma sensação de reciclagem de ideias musicais dos discos anteriores.
Dito isto, encontra-se aqui matéria para um álbum mais económico e satisfatório. “My boy only breaks his favorite toys” ganha um certo ânimo entre camadas espessas de sintetizadores e caixas de ritmos. Uma narrativa cinematográfica de amantes juvenis ilícitos atravessa “But daddy I love him”, com uma massa instrumental mais épica. Há uma bem-vinda injeção de ânsia, de respiração acelerada, durante a 583.ª dissecação de uma relação amorosa finada em “Guilty as sin?”. Apetece repetir “So high school”, que é elevada por um esqueleto dream pop. Em “Chloe or Sam or Sophia or Marcus” cintila o fantasma do country e há uma pungência, a raiar o desespero, na memória de uma relação colapsada e nas vidas entretanto refeitas. “I hate it here” é um elogio à fuga salvadora para um universo interior. São canções de mestre, diluídas num calhamaço repetitivo.