Criou o Telegram, deu-lhe asas para voar, mas não se livra de polémicas e acusações. Solteiro, pai de uma centena de filhos por via da doação de esperma, adora ser comparado à personagem que Keanu Reeves interpretou no filme “Matrix”.
Sábado, 24 de agosto. Pavel Durov chega a Paris vindo do Azerbaijão, no seu jato privado, para jantar. Mas a refeição planeada haveria de ficar fria. Em plena pista do aeroporto de Le Bourget, o presidente executivo do Telegram acabaria detido pelas autoridades francesas por crimes alegadamente cometidos na plataforma digital que em 2013 fundou com o irmão mais velho Nikolai, matemático e programador. Fraude, tráfico de droga, assédio cibernético, crime organizado e apologia do terrorismo são algumas das acusações que lhe são imputadas. Por agora, depositou cinco milhões de euros para ficar em liberdade e não pode sair de França.
A vida polémica de Durov não começou em 2013, nem principiou com o Telegram. Ainda muito jovem, já depois de ter vivido em Itália, onde o pai deu aulas, regressou à São Petersburgo natal e deu nas vistas como prodígio da programação. Invadiu o sistema informático da escola que frequentava e inseriu no ecrã de boas-vindas dos computadores um insulto dirigido a um professor de Ciências da Computação com quem se incompatibilizara. O docente proibiu-o várias vezes de aceder aos computadores, mas Pavel acabava sempre por conseguir entrar no sistema.
Em 2006, com 22 anos, logo após terminado o curso superior de Filologia da Língua Inglesa e Tradução, em São Petersburgo, fundou a rede social VKontakte, direcionada para utilizadores de língua russa, que rapidamente ultrapassou o Facebook em toda a ex-União Soviética. Oito anos depois, após diversas batalhas travadas com as autoridades locais, por se recusar a entregar aos serviços de segurança russos os dados pessoais dos internautas e por não encerrar os grupos de oposição ao Governo, vendeu a plataforma e deixou o país. Antes, certamente para celebrar o destino que já havia reservado para si próprio, fez chover notas sobre quem passava na Avenida Nevsky Prospekt, em São Petersburgo.
No entanto, o que acabaria por vir teria tanto de sucesso como de controverso. Foi desenvolvendo o Telegram enquanto viajava de país em país. Andou por Berlim, Londres, Singapura, São Francisco. A plataforma foi ganhando força e faturando milhões, mas também se revelando polémica pela falta de controlo dos conteúdos. Durov radicou-se no Dubai, obteve cidadania dos Emirados Árabes Unidos e do arquipélago caribenho de São Cristóvão e Nevis, e, em 2021, num processo pouco claro, que Paris não esclarece, conseguiu a nacionalidade francesa.
O Telegram continuou a crescer, muito à custa das polémicas permissões aos utilizadores, protegendo a sua confidencialidade e recusando colaborar com as autoridades. Essa postura anarquista fez com que colecionasse inimigos de estimação. A começar pela Rússia. Em 2018, um tribunal de Moscovo ordenou o bloqueio da aplicação. Mas a imposição da medida revelou-se caótica e, três dias depois, manifestantes “bombardearam” a sede dos serviços de segurança russos com aviões de papel (símbolo do Telegram). O Governo de Putin desistiu de a tentar bloquear, acabando por a adotar, assim como a oposição. Entretanto, a plataforma ganhou destaque em diversos conflitos globais, incluindo a guerra na Ucrânia, onde tem sido fonte crucial de informações e de… desinformações.
A vida pessoal de Durov é pouco conhecida desde que se tornou num dos homens mais ricos do Mundo – possui uma fortuna estimada em quase 14 mil milhões de euros, mas a toncoin, a criptomoeda que criou, caiu mais de 15% desde o anúncio da detenção. Sempre acompanhado de um guarda-costas e de uma assistente, raramente dá entrevistas, limitando-se a declarações, por vezes enigmáticas, no Telegram ou a publicações nas redes sociais de fotos sem camisa com frases motivacionais. Solteiro, levou uma vida solitária. No entanto, nos últimos tempos, tem sido visto com Yulia Vavilova, uma investidora russa de 24 anos que atua no ramo das criptomoedas e que o estaria a acompanhar nesta viagem a França.
Pavel não come carne e não bebe álcool nem café. Veste-se de preto, cultivando, assim, as semelhanças físicas com Keanu Reeves e a personagem que o ator interpretou no filme “Matrix”. Em julho, gabou-se de ser pai biológico de mais de 100 crianças, graças às doações de esperma que fez numa dúzia de países. E não há dia que não se gabe dos milhões e milhões de utilizadores que o Telegram conquistou ao longo destes 11 anos e que pretende ver crescer até aos mil milhões em 2025. A vingança serve-se tão fria como acabou o tal jantar que não comeu quando chegou a Paris. Isto se a Justiça o permitir.
Cargo Fundador e CEO do Telegram
Nascimento 10/10/1984 (39 anos)
Nacionalidade Russa, emiradense, são-cristovense e francesa