Assuntos de dinheiro são temas delicados, não propriamente românticos, numa relação a dois. O que fazer se um é muito poupado e outro bastante desprendido? Alinhar expectativas costuma funcionar.
Pode ser um assunto tranquilo, sem ondas, sem problemas de maior. Ou pode ser complexo e até um rastilho de discussões. Temas de dinheiro não são fáceis de gerir. Há várias questões em cima da mesa. Dividir despesas, abrir uma conta em conjunto para um futuro em comum, definir ou não metas de poupança, partilhar gastos a dois, estabelecer percentagens consoante mesadas ou rendimentos, ou cada um paga o seu. Há decisões a tomar, umas mais difíceis do que outras.
No início de um romance, é normal que as finanças não criem desentendimentos de maior entre namorados. E depois? Depois, é preciso gerir expectativas para evitar conflitos e conversar porque a falta de comunicação compromete o amor. Objetivos divergentes podem significar caminhos diferentes.
Neste assunto, Bárbara Barroso, especialista em finanças pessoais, fundadora do laboratório de literacia financeira Money Lab, destaca vários aspetos: gestão de expectativas, prioridades individuais e a dois, perspetivas financeiras, confiança, comunicação, partilha. “Falar de finanças no relacionamento, especialmente no início, é sempre um tema sensível. No entanto, evitar o tema pode gerar mal-entendidos e expectativas desalinhadas, conduzindo a desentendimentos”, avisa. O que fazer? “A abordagem ideal é falar de maneira gradual e aberta, até para entender os modelos de dinheiro de cada elemento. No fundo, ambos partilharem as suas perspetivas sobre dinheiro, sejam gastos, poupança ou mesmo prioridades financeiras.” Falar sobre o tema evita situações desagradáveis e que o dinheiro seja um problema na relação.
Natália Nunes, coordenadora do Gabinete de Proteção Financeira da DECO – Associação Portuguesa para a Defesa do Consumidor, admite que o tema ainda causa desconforto entre namorados, lembra que o tempo de o rapaz pagar o jantar está ultrapassado (“e ainda bem”), e salienta a importância do diálogo. “Acaba por ser uma matéria ainda tabu, de que não se fala muito, mas é um assunto que faz parte da vida e que deve ser abordado de uma forma natural”, refere. Nas ações que a DECO faz em escolas e universidades, vai percebendo que finanças entre namorados não são tópico de conversa. Em seu entender, apesar de algum trabalho feito, este ponto devia ter um lugar de maior relevo nos currículos escolares. “Durante muito tempo, não houve esta preocupação. Os jovens tinham baixas competências em matéria de literacia financeira”, repara. É preciso falar de questões de dinheiro. Ponto.
Um programa a dois, um jantar, uma ida ao cinema ou a um concerto. Quem paga? “Se os dois trabalham e têm rendimentos próprios, o casal pode definir como dividir as despesas. Pode ser dividir todas as despesas ao meio, ser proporcional ao salário de cada um, ou um assume umas despesas e outro outras. A ideia é chegar a um consenso sobre como essas despesas em comum são geridas, sem gerar ressentimentos e conflitos”, aconselha Bárbara Barroso, que dá palestras pelo país e pelo estrangeiro sobre finanças, autora de vários livros sobre o assunto.
Para Natália Nunes, é preciso fazer contas. “Não vivendo juntos, mas já tendo os seus orçamentos, o seu dinheiro, partilhar informações, preocupações, e até de projetos para o futuro, seria bastante positivo.” Se os dois estudam, não têm trabalho em part-time, vivem em casa dos pais, o cenário muda de figura. Se há mesada ou não, quem pode e não pode pagar. “É necessário ter tudo isso em conta.” E chegar a um consenso sem complicações e aborrecimentos.
E se um é mais poupado e outro mais desprendido? É uma questão importante. Como chegar a um equilíbrio? É uma dúvida recorrente. “Haver diferenças de hábitos financeiros é muito comum nos relacionamentos. Quando um é mais poupado e o outro mais desprendido, a chave está no diálogo e na negociação”, adianta Bárbara Barroso. “O casal deve falar sobre as suas expectativas e tentar encontrar um meio-termo. Pode ser útil que o poupado ajude o outro a adotar alguns hábitos de maior controlo financeiro, enquanto o mais desprendido pode ensinar o poupado a relaxar um pouco e aproveitar mais os momentos de lazer.” O propósito é o mesmo de sempre. “O objetivo é alinhar expectativas e evitar que a diferença de estilos crie atritos.”
Despesas conjuntas, contas separadas?
Não há um manual de instruções com fórmulas únicas (e mágicas) para gerir finanças entre namorados. “O ideal é que haja uma comunicação aberta”, avança Natália Nunes. Perceber o que funciona a dois e para os dois. “Falar deste tema até para evitar alguns constrangimentos”, acrescenta. Conversar é meio caminho andado para contornar possíveis embaraços. Até porque, lembra a responsável da DECO, há casamentos que terminam precisamente por aqui. “A questão do dinheiro, nos casais, é um fator de rutura da própria vida em casal”, alerta.
Quais as opções de gestão financeira mais adequadas para namorados? Como fazer cálculos a dois? Bárbara Barroso tem alguns conselhos. “Para casais que ainda estão na fase de namoro, o ideal é manter as finanças pessoais separadas, especialmente se ainda não há planos para morarem juntos. No entanto, é possível criar uma espécie de ‘fundo de casal’ para despesas conjuntas, como viagens ou presentes.” Mas, atenção, uma conta conjunta para essas situações pode ser útil, desde que ambos contribuam proporcionalmente. “Outro modelo é a divisão direta de gastos sem uma conta em comum, ajustando mês a mês quem paga o quê.” Uma outra forma de gerir o assunto.
A DECO tem recebido cada vez mais pedidos de jovens que procuram aconselhamento sobre medidas e planos para compra de habitação. É uma inquietação que pode mexer nas finanças de namorados que planeiam uma vida na mesma casa, debaixo do mesmo teto. O que significa planeamento e gestão de orçamentos em comum. Abrir uma conta poupança em conjunto pode ser uma opção. “Depende do comprometimento dos jovens e da forma como participam na gestão das despesas”, observa Natália Nunes. “Mas deve ser um assunto a ser falado abertamente em todas as fases da vida, seja no namoro, seja depois no casamento”, defende.
Contas separadas ou em conjunto? A resposta pode ser simples para uns e um quebra-cabeça para outros. “Antes de viverem juntos, é recomendável que o casal fale abertamente, e de forma clara, sobre como as finanças serão geridas”, reforça Bárbara Barroso. É como uma espécie de treino para a vida que se segue. “Este ‘treino’ pode incluir a divisão de despesas maiores (renda, despesas da casa) e como cada um contribuirá.” “Contas separadas ou em conjunto é uma decisão que varia conforme o casal, mas manter uma conta conjunta apenas para despesas da casa e/ou comuns pode ser uma boa solução, mantendo uma conta individual para as despesas pessoais. O importante é haver transparência e alinhamento sobre o orçamento e as expectativas de cada um”, refere Bárbara Barroso.
É sempre delicado falar de dinheiro, mas não falar também pode ser um grande problema. “Nas finanças em casal não há certo nem errado. Há o que funciona para ambos”, resume Bárbara Barroso. Mais uma decisão para ser tomada a dois.