Odisseias no espaço
A música de Jon Hopkins vem perdendo contacto com assuntos terrenos, optando por explorações minuciosas do cosmos, a partir de um corpo sonoro sobretudo eletrónico. Com formação em piano, o músico e produtor inglês deu os primeiros passos no final do século passado, estreou-se em 2001 com o álbum “Opalescent”, tornou-se próximo do também músico e compositor eletrónico David Holmes e trabalhou com Brian Eno, tanto em discos do ex-Roxy Music como em diversos registos dos Coldplay, de “Viva la vida or death and all his friends” (2008) a “Ghost stories” (2014).
Há uma notória evolução na continuidade na obra de Hopkins, um refinar de texturas e orquestrações que transporta as composições para um lugar emocionalmente denso, onde a música erudita se abraça a efeitos digitais de alta definição – e, sim, mais entranhada no espaço exterior -, com uma carga evocativa que torna a sua linguagem matéria propícia para bandas sonoras (surpreendentemente, uma área pouco explorada) ou viagens interiores (o seu álbum de 2021 intitula-se “Music for psychedelic therapy”).
Em “Ritual” (Domino), Jon Hopkins tece uma peça contínua, dividida em oito partes. Começa austera, com “Altar”, assente em ecos e murmúrios gregorianos e acordes expectantes de uma escala quase industrial, antes de adquirir uma pulsação cósmica próxima do batimento cardíaco em “Palace/Illusion”, “Transcend/Lament” e “The veil”, com um fantasma reconfortante de voz a flutuar. Vangelis, Jean-Michel Jarre ou a new age não estão a distâncias intransponíveis. As lentas mutações no quadro sonoro fazem com que, chegados a “Evocation” e “Solar goddess return”, estejamos mergulhados numa intoxicante cerimónia mística de um culto alienígena, rodeados de desconhecido e desconfiança.
“Dissolution” é um suave finamento, longe do temor dos capítulos iniciais, enquanto o derradeiro “Nothing is lost”, o piano com o toque da rugosidade humana, sugere que, afinal, se tratou de uma odisseia num espaço íntimo. Na verdade, percebe-se bem a escassez de música de Hopkins para filmes. Imagens em movimento, em discos como “Ritual”, seriam redundantes.