O objeto escolhido pelo escritor.
“Oriundo das florestas da Turíngia no centro-leste da Alemanha, o Coelho Dourado fugira à brutalidade nazi, a qual nele detectara sinais de rácica degenerescência, e indícios de inabilidade procriativa. Preferiam os cinzentos de pelagem, e por regra gigantes, que se mostravam afins do uniforme da Wehrmacht, e da parede dos bunkers, coisa que conduziria os bárbaros a condenar os diferentes ao extermínio radical.
Quanto ao bebé que eu era, tendo caído doente de broncopneumonia, prognosticar-lhe-iam os médicos o desfecho que haveria de o transformar em anjinho. Olhando-me porém de cima para baixo, suspenso das cortinas do meu berço, e atento ao latejo das minhas narinas, o Coelho Dourado nem por um instante contemplaria a ideia de abandonar o seu posto.
Arribei para galgar casas demolidas, caixas e caixotes de madeira ou cartão, mas arrastando sempre comigo, e quase sem me dar conta, o seráfico Coelho Dourado. Avisto-o agora aos pés da cama, oitenta e três anos transcorridos, a pontificar entre ursos, macacos e gatos, todos em peluche. Apresso-me logo a chamar o trenó que nos leve, aos dois, à eterna e luminosa infância de que nunca mais sairemos.”
Escritor
82 anos