
O "Consultório de Sustentabilidade" desta semana.
Inteligência Artificial: aliada ou ameaça à sustentabilidade?
Sara Borges
Lamento, mas, para já, a Inteligência Artificial (IA) está a criar mais problemas do que soluções no que toca ao ambiente e à crise climática. Por um lado, a IA oferece poderosas ferramentas no combate às alterações climáticas e à perda de biodiversidade: algoritmos avançados permitem monitorizar ecossistemas em tempo real, prever desastres naturais com maior precisão e otimizar o uso de recursos naturais; pode facilitar a gestão eficiente de redes elétricas e a integração de fontes de energia renovável com menos desperdício; também pode ajudar a criar software para melhorar a produção de bens de consumo ou apoiar formas alternativas de economia (como partilha, empréstimo, troca, reparação e reutilização).
Por outro lado, os consumos de energia e água da IA são tão elevados que criam problemas ambientais e sociais: além do medo de perder empregos para a IA, temos de temer perder o acesso aos recursos que permitem a vida como a conhecemos.
Primeiro, esta tecnologia está a causar um aumento considerável do uso de energia. Em 2022, os centros de dados para funcionamento da IA, representaram cerca de 2% da procura global de eletricidade; só na União Europeia, consomem entre 1,8% e 2,6% de toda a energia consumida no espaço comunitário; em comparação, as redes de telecomunicações consomem atualmente entre 1% e 1,2%. Mais: calcula-se que a IA será responsável por cerca de 85% do aumento da necessidade energética para armazenamento de dados até 2026, igualando a energia usada hoje por todo o Japão; e esta revolução está apenas a começar.
Se fizermos uma transição total dos motores de busca normais (como o Google) para serviços de IA, aumentamos a procura de eletricidade em 10 terawatts por ano, a mesma que milhão e meio de europeus usam num ano. Este aumento no consumo energético resulta em significativas emissões de gases com efeito de estufa, sobretudo tendo em conta que hoje, tal como em 1960, 80% da energia utilizada é proveniente de combustíveis fósseis; a IA vai contribuir muito mais para a expansão energética do que para a transição energética.
Segundo, a IA utiliza quantidades obscenas de água, numa altura em que dois terços da população mundial enfrentam grave escassez de água. Por cada 100 interações com modelos como o ChatGPT, é consumido cerca de um litro de água. A cada quilowatt de energia utilizado, evaporam nove litros de água para arrefecer os data centers. Ou seja, até 2027, só a IA irá consumir 66 mil milhões de litros água por ano, mais de metade da água consumida no Reino Unido a cada ano. A falta de monitorização e transparência dos data centers fazem acreditar que estes valores podem ser ainda maiores!
Outro impacto relevante é a geração de resíduos eletrónicos, devido à rápida obsolescência do hardware, impulsionada pela necessidade de equipamentos mais potentes para suportar sistemas de IA. Estima-se que, sem medidas adequadas, os resíduos eletrónicos associados à IA possam multiplicar-se por mil até 2030, atingindo entre 1,2 e cinco milhões de toneladas métricas.
Por muito promissoras que pareçam as ferramentas de Inteligência Artificial, os custos ecológicos e sociais atuais superam, e muito, os benefícios.

*A NM tem um espaço para questões dos leitores nas áreas de Direito, Jardinagem, Saúde, Finanças Pessoais, Sustentabilidade e Sexualidade. As perguntas para o Consultório devem ser enviadas para o email [email protected].