Rita Alarcão Júdice. A ministra que não gosta de falar por falar

Na faculdade, namorou muito e estudou pouco. Advogada no escritório do pai durante 25 anos, especializou-se no setor imobiliário. Acabou nomeada para a pasta da Justiça.

Três dias depois da espetacular fuga de cinco reclusos do Estabelecimento Prisional de Vale de Judeus, a ministra da Justiça convocou uma conferência de imprensa para, pela primeira vez, explicar publicamente o que sucedera. Sentou-se, colocou um ar grave que nunca lhe desapareceu do rosto durante os longos minutos da intervenção, apontou o dedo, detalhou pormenores, respondeu a todas as questões, não poupou na dureza das palavras. “Houve uma cadeia sucessiva de erros e falhas graves, grosseiras e inaceitáveis”, descreveu. E não parou. “Desleixo”, “facilidade”, “irresponsabilidade”, “falta de comando”, foram algumas das expressões que utilizou para classificar o grave episódio. Também não se furtou a explicar porque não dera a cara mais cedo: “Não quis contribuir para o ruído, falar por falar não é o meu timbre”.

O caso de Vale de Judeus foi o mais delicado com que Rita Alarcão Júdice se confrontou desde que tomou posse como ministra da Justiça, em março passado. Nascida em Coimbra, cujas raízes aponta com orgulho – é adepta da Académica, a popular “Briosa” –, é filha do advogado José Luís Alarcão Júdice, de quem herdou o prazer da advocacia e os dois apelidos para fazer nome profissional. Depois do envolvimento com a organização nacionalista de extrema-direita MDLP após o 25 de Abril, o que o levou a ser preso durante um curto período, Júdice fundou, em 1977, a sociedade de advogados PLMJ, que se viria a afirmar como uma das mais influentes do país e onde a filha trabalharia durante 25 anos, até 2023, na área de imobiliário e turismo, na qual se especializou. “A Rita faz parte da história da PLMJ e estamos-lhe reconhecidos pelo seu contributo”, comentou fonte do poderoso escritório ao site Advocatus, o mesmo onde ela revelara a sua postura religiosa e a participação em Equipas de Nossa Senhora vocacionadas para a espiritualidade conjugal.

Casada com um também advogado e mãe de três filhos, Rita Alarcão Júdice formou-se em Direito pela Universidade Católica com média de 13 valores. Admite que poderia ter tido melhor aproveitamento, reconhecendo que nesses tempos “namorava muito e estudava pouco”.

Deixada a PLMJ, Rita Alarcão Júdice iniciou uma colaboração próxima com o PSD, partido com o qual sempre se identificou mas de que nunca se tornou militante. Foi convidada para cabeça-de-lista do partido pelo distrito de Coimbra às eleições legislativas de 10 de março.

“Não podemos ficar indiferentes ao que se está a passar em Portugal. Há muita pobreza, há muito abandono, muitos jovens estão a deixar o país. Eu, como mãe, não consigo não me interpelar por este problema”, disse num vídeo de campanha. “Quero recuperar a cidade e o distrito de Coimbra, fazê-las maiores”, acrescentou. Praticamente nem se sentou na cadeira de deputada, dado ter sido indicada ministra da Justiça por Luís Montenegro.

Não sem alguma surpresa, pois Rita Alarcão Júdice fora coordenadora do Conselho de Estratégia Nacional (CEN) do PSD para o setor da… habitação. Aliás, foi nessa qualidade e dessa especialidade que falou na Convenção da Aliança Democrática (AD) realizada a 21 de janeiro deste ano e tida como o grande evento de arranque da coligação para caminhada que viria a terminar com um triunfo eleitoral à justa, ganhando assim direito a formar Governo.

Quando foi nomeada para a Justiça, surgiram reações de espanto e expectativa. Porque durante os meses que precederam as eleições raramente falara da matéria que viria a tutelar, sendo uma autêntica incógnita o programa que pretendia apresentar. Apesar disso, recebeu elogios. “Tem um profundo conhecimento do sistema judicial”, considerou António Marçal, presidente do Sindicato dos Funcionários Judiciais. “Será possível consensualizar soluções que permitam aumentar a confiança, a credibilidade, a celeridade e a eficácia do sistema de Justiça”, anteviu Paulo Lona, líder do Sindicato dos Magistrados do Ministério Público.

Como que a parecer adivinhar o que viria a acontecer em Vale de Judeus, o presidente do Sindicato Nacional do Corpo da Guarda Prisional foi premonitório: “Temos que falar seriamente dos serviços prisionais antes que uma catástrofe aconteça”, solicitou Frederico Morais à recém-nomeada ministra. Não demorou até o futuro confirmar a maior prova de fogo de Rita Alarcão Júdice.

Cargo Ministra da Justiça
Nascimento 08/12/1973 (50 anos)
Nacionalidade Portuguesa