A minha tia Milinha
A minha tia é muito melhor do que a vossa tia. A menos que também sejam sobrinhos da minha tia, a vossa tia não tem jeito nenhum comparada com a minha. A minha tia Emília, a tia Milinha, vai completar 90 anos de idade agora no dia 29, e o que toda a gente sabe é que ela é uma alma de cristandade pura, uma que verdadeiramente se ocupou com ajudar os outros.
Tenho tanto orgulho na minha tia Milinha porque ela sempre nos quis bem e nos ajudou. A irmã mais velha da minha mãe é uma figura de juízo e benignidade que melhorava tudo em redor. Para mim, bastaria o seu prato de sopa, a melhor sopa do Mundo, e a sua conversa perguntando pelas saúdes e pelos amores. Era muito importante que todos casássemos para não sermos sós.
Quando eu era pequeno, a vida levou a família a perder-se da minha madrinha de baptismo. Na Páscoa, diante dos folares das crianças, eu encolhia por não ter mais madrinha. A minha tia Milinha mandou que nos comprometêssemos dali em diante e imediatamente me entregou um folar que, mais do que ser de pão e dinheiro, era de auto-estima. Senti que alguém me deu paridade, me incluiu naquela coisa festiva e dignificante que queria ser a Páscoa. A minha criança em perigo agarrou melhor a vida.
Ter madrinha era ter mais uma mãe e nada há de mais precioso, mais caro, mais belo do que isso. Por isso, voltávamos da sua casa cheios de batatas e couves, cebolas e ovos. A fartura das suas hortas repartia-se. A tia Milinha sempre repartiu sua fartura. Eu penso que ela fez família de verdade com a vizinhança. A vida toda lhe pareceu destinada a praticar a generosidade e o cuidado.
Eu já contei muito que a tia Milinha emprestou suas casas aos professores. Vindos de longe e a terem de habitar por salários estreitos, a minha tia deixava-os sem pagar rendas e ainda lhes fazia a mesma sopa com que a mim me convencia a salvar o Mundo. Ela dizia: coitadinhos dos professores, educam nossas criancinhas e andam sozinhos pelo país, a pagar duas casas e a sofrer de saudades. Ela dizia: ajudar os professores é uma coisa de Deus.
Um dia, sonhei que o ministro da Educação condecorava a minha tia. Sonhei que os professores que ela ajudou eram agora todos felizes de volta a suas terras, com suas famílias, seus filhos, seus destinos bonitos.
A minha tia maravilhosa vai completar a idade linda de 90 anos e eu acredito que até os anjos vão fazer um banzé de alegria e orgulho. Como nós. Uma enorme alegria e orgulho por termos uma tia assim.