A enciclopédia pop dos Pet Shop Boys
Crítica musical, por Jorge Manuel Lopes.
Em “Nonetheless” (x2/Parlophone), a pop é tratada nas palmas das mãos pelos Pet Shop Boys, numa coleção de canções clássicas, que passa por diversas sonoridades dos 40 anos do seu percurso para construir algo fresco, fulgurante e familiar. Um álbum enxuto, dez canções em 44 minutos, na estreia de Neil Tennant e Chris Lowe com o produtor James Ford (Depeche Mode, Blur, Arctic Monkeys).
Ford tem mão nos arranjos orquestrais nas secções de cordas e metais do Elysian Collective, um elemento sonoro crucial em “Nonetheless” desde a abertura, com “Loneliness”: dinâmica rítmica a remeter para um Giorgio Moroder vintage, cascatas de violinos, montanha-russa emocional na melodia; uma ferida aberta, todavia dançável até ao abandono. As cordas são abstratas mas vívidas na sensual “Feel”, com um otimismo radioso no refrão. Violinos, violas e violoncelos dão asas a “A new bohemia”, meio balada eurovisiva, meio pop barroca sessentista, o protagonista uma alma perdida nos restos de um passado fulgurante.
Os fãs encartados da dupla britânica serão assolados por vagas de memórias proustianas. Entre eurodisco e ambiente de apoteose de musical, “Why am I dancing?” é tão garrida como o álbum “Very” (1993). Deslumbrante, neorrealista, arrancada ao fim da noite, “New London boy” recupera o registo rap com que Neil Tennant se revelou em “West End girls”. Homenagem a Rudolf Nureyev, “Dancing star” revisita o freestyle de “Domino dancing” (1988). E há house robusto com cordas disco em “Bullet for Narcissus”, continuação dos álbuns finais dos anos 1990 dos Pet Shop Boys.
Sobram três maravilhosas anomalias. “The schlager hit parade” é pop festiva, de novo com muita Eurovisão, e uma cautelosa celebração política: “The future is forever/ Let’s not dwell on the past/ Gesundheit to Europa!/ Let’s hope it’s gonna last”. “The secret of happiness” soa a óvni neste contexto, meio lounge, meio Burt Bacharach, lânguida e enigmática. Synthpop sombria e em lume brando, “Love is the law” mostra o que poderiam ser os Abba no rescaldo de “The visitors”. Álbum enciclopédico, “Nonetheless” é como regressar a casa e encontrar quase tudo no sítio.