Tiago Lobo-Dos-Santos mudou-se para os Estados Unidos para fazer investigação científica. Mas o plano é voltar ao Bairro do Cerco, no Porto.
Esta é uma história que começa e acaba no Bairro do Cerco, no Porto. Na verdade, ainda não chegou ao fim, só que Tiago Lobo-Dos-Santos já tem tudo pensado (e sonhado) ao milímetro. Está do lado de lá do Atlântico, no Kentucky, Estados Unidos, a fazer doutoramento, com um objetivo claro: melhorar a vida de crianças e jovens de etnia cigana. Mas comecemos pelo princípio. Tiago nasceu em Esposende e cresceu a admirar o pai, advogado. Descobriu a Criminologia, não que fosse fascinado pelo CSI, interessava-lhe antes perceber o que leva alguém a tornar-se criminoso. Licenciou-se e fez-se mestre, na Universidade do Porto. O resto é uma catadupa de acasos que pareciam destinados a acontecer.
“Geralmente, quando as pessoas ouvem criminologia não associam a um trabalho social. Mas é um caminho natural, porque aprendemos muito sobre prevenção precoce da delinquência juvenil, sobre criminologia desenvolvimental”, conta ele. De facto, Tiago acabou a fazer um percurso muito focado na área social, de intervenção comunitária, com crianças e jovens de contextos desfavorecidos, particularmente de etnia cigana. Apaixonou-se pelo Bairro do Cerco, num amor que nunca mais largou, quando estagiou no projeto “Cercar-te” do programa Escolhas. “Este estágio mudou a minha trajetória, aqueles miúdos fascinaram-me, se não fosse a minha experiência no Cerco, não estaria agora nos EUA”, confessa. Nessa altura, Tiago trabalhava num espaço dentro do próprio bairro, onde treinava competências socioemocionais com as crianças, ajudava-as a fazer trabalhos de casa também. Continuou a fazer projetos ali, através de bolsas do IPDJ – Instituto Português do Desporto e Juventude, depois com a Teach for Portugal – que combate as desigualdades educativas, à qual se candidatou em 2019, foi selecionado para ser mentor pedagógico e pediu especificamente para ir para o Cerco. Aí, passou a trabalhar a partir de dentro da escola. “Mas já tinha relações estabelecidas com a comunidade. Quando cruzamos a ciência com a cultura do bairro, é possível fazer a diferença.” Interessa-lhe o trabalho educativo de rua, o combate ao absentismo escolar, a prevenção de comportamentos de risco.
Os EUA surgem depois de, em abril de 2020, Tiago publicar um artigo científico numa revista brasileira sobre a influência das características da comunidade na vida das crianças e jovens. Um dos autores que citava no trabalho, Alexander T. Vazsonyi, contactou-o e foi então que decidiu fazer doutoramento em Ciências da Família na Universidade de Kentucky, onde Vazsonyi trabalha. “Queria trabalhar diretamente com ele, aprender ciência social. Investigar as causas, motivos e fatores que levam crianças e jovens a enveredarem por trajetórias de absentismo, delinquenciais e criminais. E como podemos prevenir.” Conseguiu entrar e ainda foi distinguido com uma bolsa da Fundação La Caixa. Está no 2.º ano. Kentucky é o lado mais profundo dos EUA, o choque cultural foi grande. Já dá aulas de Desenvolvimento Adolescente aos alunos de licenciatura. Mas voltar ao Cerco para aplicar os resultados da sua investigação foi sempre o plano. Agora, está a criar uma associação sem fins lucrativos focada em minorias étnicas em Portugal. “Há o risco de ficar confortável nos Estados Unidos, mas tenho aquele bairro muito presente em mim. É missão.”
Tiago Lobo-Dos-Santos
Localização: Kentucky, EUA 37° 30’ 0’’ N 85° 0’′0’’″O (GMT -5)
Profissão: Criminólogo e investigador
Idade: 28 anos