Profissões tradicionais ganham asas com a internet

Profissões artesanais e domésticas anunciam serviços e fazem publicidade na extensa e global autoestrada da comunicação. A procura aumenta, os negócios crescem. Os cartões nas caixas do correio caem em desuso, as plataformas digitais vingam e captam clientela. O marceneiro Cristiano Silva, o construtor e pintor Rui Sequeira, a empresária de transportes e mudanças Gilciara Bertolani, os jardineiros José Manuel e Carminho, o canalizador Diogo Silva contam como é. Qual o alcance, qual o impacto.

Cristiano Silva é carpinteiro há oito anos. Faz aparadores, estantes, bancos, mesas, camas, mobiliário em madeira de vários tamanhos e feitios no seu ateliê na zona de Alcântara, Lisboa. Marcenaria personalizada ao gosto do cliente, feita à medida, projetos desenhados de raiz para casas, restaurantes, empresas. Para todo o lado porque a sua filosofia é que há sempre uma peça para qualquer lugar. “É um tipo de trabalho em que há sempre solução, dá sempre para jogar”, explica. Neste momento, anda à volta de uma grande cómoda em carvalho e da remodelação do interior de uma autocaravana. Gosta de variedade e o negócio está a crescer. Muito graças a uma plataforma de serviços domésticos que disponibiliza uma aplicação que acompanha cada passo. “Consegui trabalhos de maiores dimensões”, conta. Está convencido.

Por estes dias, Rui Sequeira anda por aquela área de Alcântara na remodelação de um prédio. Os dias nunca são iguais na sua arte. Sempre de um lado para o outro, num dia está em Aveiras, noutro no centro de Lisboa. A sua empresa Globiprata é familiar, já passou os 100 funcionários, são 120, começou em Santarém, mudou-se para Lisboa, dedica-se à construção civil, tanto a obras de raiz chave na mão, do início ao fim do projeto, das fundações ao telhado, bem como a reconstruções e remodelações de casas e prédios. Trabalha em todo o país, ilhas incluídas.

António José Sequeira, o pai, e Rui Sequeira, filho, comandam as operações num setor em que não falta trabalho, mas a mão-de-obra escasseia. Rui Sequeira ainda resistiu a entrar nessa nova forma tecnológica de anunciar trabalho através de uma plataforma digital. “Estava um bocado cético”, admite. Em setembro do ano passado, cedeu e muita coisa mudou. Mais 22 funcionários, um crescimento de mais de 35% na faturação. E mais tempo livre.

Mais a Norte, Diogo Silva, de Vila Franca do Lima, anda numa roda-viva e por vários lados, Viana do Castelo, Porto, Valença, Esposende. É um faz-tudo. Canalizador, monta painéis solares e trata da manutenção, faz trabalhos em pladur, serviços de eletricidade. Repara motores de estores elétricos, monta máquinas de lavar roupa e louça, fogões, fornos, esquentadores. Instala cortinados e candeeiros, limpa chaminés, recuperadores de calor e salamandras. Há dias em que não tem mãos a medir. “Há meses bons, há meses razoáveis”, refere.

Gilciara Bertolani gere uma empresa de transportes e mudanças e garante que a YourHero tem tido mais impacto do que as redes sociais
(Foto: Carlos Pimentel/Global Imagens)

Diogo Silva trabalha sozinho, ferramentas na carrinha, vai atendendo os pedidos conforme as necessidades e as possibilidades. Quando não pode, passa a empreitada a trabalhadores que recomenda e eles fazem o mesmo. “É uma parceria com conhecidos”, especifica. Tem apenas uma página profissional no Facebook. O primeiro anúncio que fez foi no OLX há algum tempo, agora, mais recentemente, três meses, mais coisa menos coisa, entrou numa outra plataforma. “A minha esposa viu, falou-me disso, vamos ver e que seja o que deus quiser.” O tempo é curto para avaliações, se a faturação se ressente. “Ainda não dá para saber ao certo”, comenta. O que fica claro nessa plataforma é a polivalência de Diogo Silva, tudo o que consegue fazer.

José Manuel Pereira é jardineiro, Carminho Fernandes é decoradora de jardins, ambos apaixonados pela natureza e design de exteriores, andam por Lisboa e arredores, Oeiras, Cascais, Sintra, Colares, Loures, Costa da Caparica, a cuidar de espaços verdes. José Manuel conhece técnicas, plantas, flores, como podar, como semear, como manter tudo bonito. Trata de tudo desde a raiz, tem curso da área da Escola de Formação Profissional de Alverca. Carminho ocupa-se dos detalhes da arte de jardinar, escolhe flores e plantas, trata da parte administrativa, do contacto com os clientes, da contabilidade.

A J.P. Carminho Jardins é uma empresa familiar e está em cinco plataformas digitais a anunciar os seus serviços. Não funcionam todas da mesma forma, há umas experiências melhores, outras piores. “Por vezes, investimos e não há retorno”, comenta José Manuel. Seja como for, não há volta a dar. “É importante, o nosso logotipo fica à vista em pesquisas que são feitas”, adianta o jardineiro. Carminho fala das aceleradas rotinas da vida moderna e de como a tecnologia facilita o quotidiano. “Hoje em dia, as pessoas estão cada vez mais ocupadas e contactam as plataformas”, refere. Ambos concordam: já não é viável ficar fora da Internet.

Carmo Fernandes e José Manuel têm uma empresa de jardinagem. Estão em cinco plataformas digitais, sabem o alcance da Internet
(Foto: Reinaldo Rodrigues/Global Imagens)

A necessidade de expandir, a vontade de crescer, o desejo de potenciar o negócio. Estes ingredientes juntaram-se, as condições também, Gilciara Bertolani deixou o emprego de assistente administrativa para se juntar ao marido Marcos Bertolani na empresa de transportes e mudanças a partir de Lisboa para todo o país e Europa fora, sobretudo Espanha, Suíça, Alemanha. Mudanças e transportes de todo o género, particulares e empresariais, casas e escritórios, do início ao fim, embalagens, etiquetagens, cargas, descargas, montagens. Reuniram forças e decidiram aprofundar as virtudes da comunicação online que permitiu ao casal aumentar a capacidade, comprar mais um veículo, o segundo, contratar mais funcionários, de dois para seis.

“Deu muito certo”, adianta Gilciara Bertolani. Em maio do ano passado, a Ágil Transportes e Mudanças, instalada na Amadora, entrou na plataforma internacional de serviços domésticos YourHero. “Temos uma estrutura comercial para dar atenção imediata ao cliente. Temos expandido a nível de angariação de clientes, funciona muito bem, dividimos esforços.” Previa que essa aposta ia funcionar, alinhou um plano para crescer. Com outra tranquilidade, com maior fluidez. E mais faturação. “Um aumento de 30% desde o início deste ano”, revela.

Mão na roda: angariar e gerir clientes

Desde os oito anos que Rui Sequeira conhece o meio da construção civil, nas férias ia com o pai para a empresa e ajudava a organizar o armazém. Estudou Desporto, nunca exerceu, entrou na firma familiar, foi condutor e manobrador de máquinas industriais, entretanto tirou um curso de pintura e decoração, dedicou-se a essa área da empresa, tem 36 funcionários consigo.

Rui Sequeira está no ramo da construção civil. A sua empresa tanto ergue casas de raiz, como trata de remodelações. Contratou mais funcionários depois de ter aderido a uma plataforma digital
(Foto: Reinaldo Rodrigues/Global Imagens)

Cristiano Silva também deu algumas voltas antes de se fixar por conta própria. Estudou Arquitetura, não acabou o curso, desistiu no terceiro ano por um certo desencanto e outra forma de pensar. Mas sempre interessado e fascinado pela parte construtiva. Muito bom a geometria, criativo, bastante habilidoso e jeitoso de mãos para as maquetes e outras componentes que dão origem à obra. Ainda foi comercial numa empresa de vinhos, até que se virou para o que gosta mesmo de fazer: carpintaria. É como um sonho viver do que realmente lhe dá prazer fazer. Assim não custa. Esteve dois anos e meio na Nova Zelândia a construir casas de madeira, tem lá família, queria aprender a arte, desenvolver competências, voltou a Lisboa em 2017. Virou-se para a marcenaria, criou a marca Zubazu, peças em madeira, depois abriu a empresa. Entretanto, o ateliê na Penha de França começou a ficar pequeno, mudou-se para a zona de Alcântara. A procura aumentou desde que se inscreveu na plataforma YourHero, em outubro de 2022. Conseguiu trabalhos maiores, outros valores. Trabalhava sozinho há dois anos, contratou um funcionário a tempo inteiro, quando é necessário tem um ajudante. A faturação aumentou. “Duplicou, pelo menos”, garante. Está satisfeito com a organização, a seleção, o sistema dessa plataforma. “É uma mão na roda, arranja clientes, gere clientes.”

A opinião de Rui Sequeira não é muito diferente. “Mudou muita coisa. Consigo fazer quase tudo numa aplicação, gerir tudo, clientes, orçamentos – 70% na app, o restante trato numa agenda”, adianta o empresário da construção civil. O objetivo de aumentar o número de trabalhos mais pequenos, mais técnicos, não tanto grandes remodelações, tem sido atingido. A rentabilidade é, assim, mais imediata, pequenas obras, menos tempo, dinheiro a entrar com mais regularidade. “Conseguimos chegar a mais pessoas do que chegávamos”, assegura. “O portefólio é o nosso trabalho.”

A aplicação da plataforma de serviços domésticos facilita-lhe a gestão do negócio, regista tudo ali, apontamentos de uma reunião, dia e hora em que fala com os clientes, os planos, as propostas. Tudo numa app na palma da mão, no seu telemóvel. Rui Sequeira está satisfeito com as vantagens. Um modelo justo, em sua opinião. “Ajudamo-nos uns aos outros.” No primeiro semestre deste ano, a plataforma onde está duplicou a procura de serviços de renovação de casa, mais de 1600 pedidos, mais do dobro dos 700 registados no mesmo período do ano passado.

Diogo Silva anda na sua vida, tem 30 anos, a plataforma digital apresenta-o como “jovem dinâmico, responsável”. Trabalhou numa empresa de energias renováveis, em Viana do Castelo, na parte da manutenção. Saiu. “Não gosto muito de estar fechado”, explica. Em 2009, estava a trabalhar por conta de outrem, fazia de tudo um pouco, foi percebendo o mercado, ganhando clientes. “Até que comecei por minha conta a ver como corria e tem corrido bem.” Em 2017, Diogo Silva estabeleceu-se em nome próprio.

Diogo Silva é canalizador no norte do país. Trabalha sozinho e ainda está a avaliar o retorno que as plataformas podem dar ao seu negócio
(Foto: Ivan Del Val/Global Imagens)

José Manuel Pereira e Carminho Fernandes gerem o negócio a quatro mãos. Trabalhar em jardinagem exige dedicação, empenho, pegar em enxadas, cavar a terra, vergar o corpo. Há serviço, mas não há assim tanta gente a querer dedicar-se à jardinagem. “Não há mão-de-obra qualificada. Esta arte está a perder-se”, avisa José Manuel. “São trabalhos pesados, não é só plantar, não é fácil, as pessoas não querem, é complicado arranjar gente”, observa Carminho Fernandes. Um rolo de relva não pesa menos de 15 quilos.

“Todo o mundo fatura, todo o mundo ganha”

A J.P. Carminho Jardins investiu em cinco plataformas, há as que levam créditos mesmo que depois os trabalhos não sejam adjudicados, há as que cobram mensalidades para tratar da publicidade, há as que cobram uma comissão por cada serviço concretizado. Recentemente aderiu à encontreaqui.pt, que fez um texto de apresentação da empresa. “Damos luz ao seu espaço verde, tornando-o um local de paz, beleza e inspiração”, lê-se na plataforma que realça o atendimento personalizado e os serviços de alta qualidade desta equipa profissional. Carminho Fernandes reconhece a importância de estar nestas montras digitais acessíveis em qualquer lugar. Mas não é tudo. O saber-fazer é o que realmente conta, o impacto que se deixa nos clientes, a avaliação feita depois do serviço. E os métodos mais terra a terra não estão assim tão fora de moda. “O passa a palavra, devido ao profissionalismo, também é importante”, adianta a decoradora de jardins. E funciona. Cativar clientes, deixá-los satisfeitos, deixar o contacto, fidelizá-los, construir um naipe de fregueses. Tudo isso dá trabalho e só se consegue com suor, esforço, empenho. Um jardim não é apenas um jardim, é também um lugar de experiências e um regalo para os olhos. A dupla sabe disso.

Antes de chegar à YourHero, Cristiano Silva usava outras plataformas digitais. Decidiu ligar. “Devolveram-me logo a chamada, marcaram uma reunião para explicar o conceito.” Ficou convencido. “Pagamos uma comissão que é adequada, uma proporção justa para os serviços, há outro tipo de envolvimento e de proteção.” Uma forma mais profissional, menos referências boca a boca. Cristiano Silva não usa redes a nível pessoal, só na vida profissional, admite que tem de investir mais nesta área, sabe que estar nas redes e ter um site é um “bom cartão de apresentação”. “A YourHero ajuda-me a complementar essa parte”, comenta. Alguns dos seus préstimos estão nos mais de 1300 pedidos contabilizados na sua área, nessa plataforma, no primeiro semestre deste ano.

Cristiano Silva faz marcenaria personalizada, o seu negócio tem crescido, mudou de ateliê, tem mais clientes
(Foto: Paulo Spranger/ Global Imagens)

A plataforma de serviços domésticos YourHero chegou a Portugal em novembro de 2021 e, desde então, criou uma rede que, neste momento, conta com mais de 420 profissionais inscritos em mais de 70 categorias, seis mil trabalhos concluídos, receita total de três milhões para os profissionais inscritos até agora. Criada em 2017, ajudou mais de 500 mil clientes em quatro países: Grécia, Chipre, Irlanda e Portugal – na Grande Lisboa e no Grande Porto, por enquanto.

Gilciara Bertolani não quer crescer depressa demais, dar um passo maior do que perna. Manter a qualidade é ponto de honra. “Não adianta crescer muito e perder a qualidade”, defende. Uma coisa são as redes sociais, outra coisa é uma plataforma com uma aplicação para dar a conhecer a empresa, captar o interesse de clientes, assegurar trabalho. Gilciara Bertolani fala dessa diferença, pela sua experiência. “O alcance das redes sociais não tem dado tanto resultado como a YourHero, nada que passe à frente desta plataforma.” O que faz toda a diferença, em seu entender. “É uma plataforma que tem um bom alcance, a captação de clientes é um conforto para nós, o contacto é rápido.” E destaca a apresentação da informação, o descritivo, a transparência de saber o que vai pagar, o atendimento, haver gente de carne e osso do outro lado da linha, esse contacto pessoal. “Todo o mundo fatura, todo o mundo ganha.” É um percurso com todos a remar para o mesmo lado. “Temos conseguido caminhar juntos”, conclui.

Em 2014, Ricardo Borges, diretor geral da plataforma YourHero em Portugal, estava a tirar um MBA de Gestão em Londres, ficou amigo de um grego que viria a criar a plataforma. Quando a vontade de abrir novos mercados se manifestou, o convite surgiu, e Ricardo Borges tornou-se sócio da empresa. O que os distingue? “O que nos diferencia é um contacto muito próximo com o cliente, há uma cara por detrás da plataforma. Acompanhamos todo o projeto, ligamos aos profissionais, perguntamos quais são as suas dificuldades, temos uma app apenas para os profissionais inscritos na plataforma.” Tudo isso permite monitorizar projetos, trabalhos, números e tempos de resposta, comparar preços, verificar prazos de execução.

A ideia é clara. “Criar um ecossistema de pequenos empreendedores que cresçam connosco, que colaborem connosco, e que seja uma relação de proveito para ambos”, resume Ricardo Borges. O mercado tem potencial, os ofícios mais tradicionais mostram abertura a estas novas ferramentas digitais, a YourHero cresceu em Portugal, pensa expandir-se geograficamente, Espanha está no horizonte, pretende abrir uma escola para os profissionais com formações em áreas como gestão e contabilidade. Quanto mais ferramentas, mais profissionais, mais clientes, mais rentabilidade. Mais retorno. A lógica é esta.

O trabalho continua. Os ofícios tradicionais, manuais e domésticos, sabem que têm mercado, que têm procura. Sabem também que remar contra a maré e ignorar a tecnologia não faz sentido. Tradicionais, mas atentos à modernidade.