O mau estado da nação política

Mais de uma dezena de baixas em nove meses e um Executivo emaranhado em polémicas destaparam a fragilidade, a falta de escrutínio. Entre indemnizações milionárias da TAP e contas arrestadas, os “casos e casinhos” da maioria absoluta socialista podem parecer ficção, mas levantam questões éticas que deixam cair as instituições no pântano do descrédito. E abrem a porta a riscos para a democracia.

Um presente de Natal que chegava atrasado e envenenado. Talvez tenha nascido aí o ponto de viragem num Governo de maioria absoluta que caiu no marasmo de “casos e casinhos” – palavras (irónicas) do próprio primeiro-ministro, António Costa – e que abriu as portas a uma crise governativa. Mesmo que não seja assumida assim, ipsis verbis. Marcelo Rebelo de Sousa terá dado um ano a Costa para arrumar a casa, para segurar a legislatura. Mas avisou: “Não contem com a ideia de dissolver o Parlamento. Os portugueses não querem crises evitáveis”. Ainda assim, o presidente da República parece não excluir eleições antecipadas em 2024, deixando no ar uma espécie de Executivo a prazo se a história continuar a repetir-se numa catadupa de polémicas que parece não ter fim.

Recuemos, nesta timeline que se embrulha no caos, a 27 de dezembro, quando Alexandra Reis, secretária de Estado do Tesouro, saía do Governo menos de um mês depois de ser convidada. Até podia ser o ponto final em quatro longos dias de contestação em torno da indemnização de 500 mil euros que a gestora de carreira recebera da TAP (vai haver uma comissão de inquérito proposta pelo Bloco de Esquerda sobre a transportadora aérea nacional) – e que fez também cair, qual efeito dominó, o ministro das Infraestruturas, Pedro Nuno Santos, nome de peso no Governo -, só que o caso era sintomático. Tudo porque para trás estava um rasto de demissões em barda. A mais emblemática? A de Miguel Alves, em novembro, logo depois de ser acusado do crime de prevaricação pelo Ministério Público.

Ano novo, vida nova, diz o povo. Mas não. A profecia popular não haveria de se cumprir e o caldo de polémicas continuava a borbulhar. Ainda mal tinha sido dado o pontapé de saída em 2023 e um novo caso abalava o Governo para desenhar um cenário pintado a negro. Carla Alves, acabada de ser nomeada secretária de Estado da Agricultura, demorava-se apenas 26 horas no cargo, depois de ser noticiado que tem contas arrestadas desde março, na sequência de uma investigação judicial ao marido, ex-autarca de Vinhais. Nem a defesa aguerrida da nova governante pelo primeiro-ministro, durante o debate de uma moção de censura ao Executivo motivada pela Iniciativa Liberal, haveria de a segurar.

Em pouco mais de nove meses, o Governo acumula 13 baixas, num vaivém acelerado, num entra e sai permanente em portas giratórias que mais parecem ficção. “Esta é uma situação de perplexidade. Sobretudo porque um primeiro-ministro que lidera um Governo com maioria absoluta, por regra, tem uma capacidade de recrutar grande, porque as pessoas vão com uma perspetiva de longo tempo. É surpreendente que, no início desta maioria, se sucedam tantos casos que criam instabilidade política, que só pode ser assacada ao primeiro-ministro por fragilidade no recrutamento”, aponta José Fontes, professor catedrático, politólogo e constitucionalista.

A falta de escrutínio aos membros do Governo está a ser o calcanhar de Aquiles de António Costa, experiente político, famoso pela oratória, que se deixou cair num emaranhado ruidoso. E está a tentar sair dele. Costa propôs a Marcelo criar um mecanismo de fiscalização entre a proposta do primeiro-ministro e a nomeação dos novos membros pelo presidente da República, para prevenir estes casos. E o desaguisado surgia. O chefe de Estado contrapôs logo que o escrutínio “tem de ser antes de o Governo propor, não é depois”. E lembrou que “o presidente não se pode substituir ao primeiro-ministro, se o presidente passa a formar os governos o sistema passa a ser presidencialista”. Ainda assim, Belém e São Bento acabariam por entrar em sintonia e, no último debate no hemiciclo, Costa anunciava que apresentou uma solução alternativa (não se conhece a primeira), que já mereceu o acordo de Marcelo e que ainda não tinha sido divulgada no momento em que este texto é escrito.

Depois de o país ter sido chamado às urnas para eleições antecipadas, o XXIII Governo Constitucional (terceiro de António Costa) tomou posse, a 30 de março do ano passado, no Palácio Nacional da Ajuda, em Lisboa. Desde então, já caíram 13 governantes debaixo de um clima de polémicas
(Foto: Paulo Spranger/Global Imagens)

Às críticas sonantes por atirar responsabilidades para o chefe de Estado neste tema, Costa ainda deu troco à Oposição. Afinal, sugeriu, Marcelo não se limita a pôr um carimbo nos nomes propostos. “A Constituição é muito clara. O presidente da República dispõe de poder substancial e não apenas formal de controlo político dos membros do Governo propostos pelo primeiro-ministro.”

José Fontes entende a ideia. “Parece-me que António Costa tentar envolver o presidente da República, ainda que de forma não direta, na escolha dos membros do Governo é o reconhecer de uma dificuldade que existe hoje na vida política.” Mas a fiscalização dos perfis e currículos, defende, deve ser feita a priori “pelo primeiro-ministro, é a ele que compete apresentar as propostas”. “E isso agora não está a ser feito. De manhã os nomes são propostos, à tarde tomam posse e à noite são demitidos. O país não pode viver permanentemente nesta situação de tiro ao alvo.” Só que, admite, este não é um exercício fácil nos dias que correm. “Estamos noutros tempos, com outras formas de escrutínio, outras sensibilidades para assuntos que antes nem tinham grande relevância.”

A ética de quem é convidado, o alto nível de vigilância

Olhemos para fora de portas. Nos Estados Unidos, “acontece os membros da administração irem ao Congresso para serem ouvidos e validados”. “E temos também alguns exemplos no caso português de alguns altos funcionários do Estado que são ouvidos na Assembleia da República. Mas não me parece o modelo ideal. Não é fácil que seja o Parlamento agora, através de uma comissão, a verificar os currículos dos candidatos. Os escolhidos também têm eles próprios, por mais desafiante que seja o convite, que fazer um exercício de autoavaliação profundo, que verificar se têm condições não só judiciais, mas éticas, políticas. Tem de ser uma ação coordenada entre o primeiro-ministro e quem é escolhido.”

José Fontes sugere mesmo que o gabinete de António Costa crie uma carta de boas práticas com uma série de questões. E os casos que já existem são lições aprendidas, por mais risíveis que sejam. “É casado com alguém que tem processos judiciais pendentes? Recebeu alguma indemnização da TAP? Parece brincadeira, mas isto está a tomar uma proporção que afeta muito o prestígio das instituições. Hoje olhamos para o Governo e o sentimento é de humor.” Tanto que ele entra mesmo em campo. Os casos atuais do Governo são terreno fértil para a comédia. Os memes circulam pelo mundo virtual à velocidade da luz, deixando cair o Executivo no caldeirão do ridículo. Já há até músicas – como a “Mambo n.º 13” de Vasco Palmeirim na Rádio Comercial – dedicadas ao insólito do momento atual.

Felisbela Lopes, doutorada em Ciências da Comunicação, alerta que estes casos “passam para a opinião pública um descrédito enorme da classe política, que é extremamente perigoso e que não é de agora”. E o desplante de quem tem telhados de vidro e aceita os convites é, para a docente da Universidade do Minho, o ponto principal. “Há uma questão que não tem sido muito enfatizada, que é a responsabilidade individual de cada uma destas pessoas. Além do primeiro-ministro e do Governo, há que acentuar o ónus nestas pessoas também, que não são vítimas nenhumas e têm que sentir que são penalizadas, até em termos de agenda mediática. Como é que ousam aceitar integrar um governo quando têm tantas sombras negras no seu percurso? Claro que isto provoca revolta.” O problema, aponta, não é do partido A ou B. A questão “é transversal”.

A verdade é que há um dado que pesa na equação: o nível de vigilância a que hoje assistimos, seja pelas mãos do poder judicial, dos media, das redes sociais, não parece ter paralelo na nossa história democrática. Basta ver o último caso divulgado de que a ex-secretária de Estado do Turismo, Rita Marques, pode ter violado a lei (o próprio primeiro-ministro o admitiu), já que, depois de deixar o Governo em novembro, assume agora o cargo de administradora de uma empresa privada, à qual, como governante, atribuiu um benefício fiscal. As polémicas chovem ao ritmo diário. “Este escrutínio que os media estão a fazer de forma mais apertada é bom, porque dá um sinal vermelho de que não vale tudo na vida pública. E obriga as pessoas a pensar duas, três, dez vezes antes de aceitarem cargos públicos.”

Mas é possível recuperar a credibilidade, a autoridade política do Governo? “É. Primeiro, afastando-se imediatamente estas pessoas e não as defendendo. E não é só quando o jornal lança uma manchete, é mal se tenha conhecimento de algum facto deste género”, vinca Felisbela Lopes. Depois, sublinha, aumentando o trabalho de escrutínio nos bastidores, “não é em público, erguendo mais exigência ética”. “A confiança recupera-se não repetindo estes erros de recrutamento, isto tem que ser estancado imediatamente. Há um conjunto de pessoas que se dedica à atividade política que é digna. E estes casos facilmente suscitam tomar a parte pelo todo.”

Partidos entoam críticas em coro

Vamos a contas. Desde 2015, ano em que se formou o primeiro Governo de António Costa, são cinco os nomes que ainda se mantêm – além do primeiro-ministro, Mariana Vieira da Silva, José Luís Carneiro, Ana Mendes Godinho e João Costa. E é a maioria absoluta, conquistada há cerca de um ano, que está a revelar o mais instável Executivo de Costa. Numa entrevista recente à Renascença e ao jornal “Público”, o secretário-geral adjunto do PS (de onde também já se fazem ouvir vozes descontentes com o rumo atual), João Torres, admitia a necessidade de “reforçar a transparência, o sentimento de confiança nos governantes”. Mas garantia, ao mesmo tempo, que “estes casos não resultam da falta de coordenação política”.

E entre o pára-arranca de Costa e Marcelo sobre o “mecanismo prévio de fiscalização”, as inquietações da Oposição, em bancadas unidas na crítica, faziam ouvir-se num coro estridente. Luís Montenegro recuperava o “diabo”, termo usado por Pedro Passos Coelho para antecipar uma crise financeira em 2016, para condenar os socialistas (embora o PSD se tenha abstido da moção de censura ao Governo, deixando Iniciativa Liberal e Chega isolados). “Neste momento, o diabo está dentro do Governo. Ou o Governo muda de vida ou os portugueses vão querer mudar de Governo”, afirmou Montenegro.

Na ala esquerda, o país em stand by é a preocupação maior. Pedro Filipe Soares, líder parlamentar do Bloco de Esquerda, aponta o dedo à “incapacidade” do Governo “em garantir que quem chama tem condições para cumprir mandato”. “Organize-se o Governo e responda-se ao país”, diz. É preciso trazer “estabilidade à vida das pessoas” e “o Governo não está a governar para a estabilidade do país”. Na mesma linha, a deputada Paula Santos, do PCP, apesar de garantir não “desvalorizar estes casos”, sustenta que o cenário atual não pode “contribuir para ocultar os problemas que hoje afetam os trabalhadores, o povo, e que continuam a não ser resolvidos”. É essa a questão central para os comunistas, que criticam o “alheamento do Governo daquilo que são os problemas reais, do dia a dia das pessoas”.

Mas há partidos a avançar, tal e qual o primeiro-ministro, com propostas de solução. E todas vão no sentido de entregar ao Parlamento o papel de fiscalizador. Inês Sousa Real, do PAN – que defende ser importante “não normalizar o que aconteceu”, para “não criar a perceção de que só vem para a vida pública quem não interessa” – pede a António Costa “que assuma o compromisso de maior envolvimento da Assembleia da República”, através de uma audição aos novos membros do Governo. Mas, ressalva, não vale a pena procurar melhorar a máquina do escrutínio antes de Costa “fazer uma reforma total, com um novo governo, ao invés de andarmos aqui com demissões atrás de demissões, esse seria um sinal de viragem, de limpeza de imagem”.

Aliás, a audição prévia no Parlamento aos novos membros do Governo ainda antes da sua confirmação é também uma ambição do Livre, que já a tinha incluído nas propostas do partido à revisão constitucional que está em curso. Uma espécie de reprodução do modelo que há na Comissão Europeia, onde os comissários vão ao Parlamento Europeu e só depois são confirmados. A título de exemplo, em 2019, a comissária Elisa Ferreira vendeu ações da Sonae que suscitaram reservas aos eurodeputados antes de conseguir a validação.

“Isto seria melhor para a democracia em Portugal e também nos permitiria evitar alguns dos problemas que tivemos”, refere Rui Tavares, líder do Livre, que acredita ser “num interrogatório necessariamente exigente que muitas vezes são identificadas fragilidades”. O escrutínio aos governos, não tem dúvidas, é atualmente um desígnio inevitável. “As instituições governativas não podem ficar num mundo do passado, como se fosse possível governar em 2023 em maioria absoluta como governava o professor Cavaco Silva nos anos 1980, sem perceber que hoje há televisões privadas, redes sociais e por aí fora.”

Também à direita há intenções em cima da mesa. O Chega, mais radical na abordagem, vai avançar com uma proposta de audições parlamentares obrigatórias aos membros do Governo, antes da sua nomeação, mas com o Parlamento a ter poder de veto em todas as admissões no Executivo. Segundo Pedro Pinto, líder parlamentar, estes nove meses de Governo são um “descalabro” e quase “dá para rir, mas isto é demasiado sério”. “Quando convidamos alguém para um cargo governativo, temos de saber o passado da pessoa para além do currículo.” Até porque já “nada passa entre os pingos da chuva, o escrutínio é muito mais real, feito ao milímetro, há muito mais ferramentas”.

Na Iniciativa Liberal, Rodrigo Saraiva, líder parlamentar, responsabiliza o primeiro-ministro por esta “enorme instabilidade”. O liberal defende que, “em primeira instância, os governos têm que fazer o esforço para verificar todo o histórico das pessoas que convidam”. Por outro lado, a IL é favorável a soluções que possam aprofundar essas verificações no Parlamento, “com audições prévias como já existem para algumas funções públicas”. De qualquer forma, sublinha, as próprias pessoas que vão exercer cargos políticos devem “colocar em cima da mesa situações que podem revelar alguma fragilidade”. Com uma certeza: “Tem que terminar o clima de impunidade que existe, em que as pessoas acham que nada lhes acontece. A ética republicana não pode ser apenas um slogan”.

Um tiro à democracia e os aparelhos partidários

O slogan, é certo, não tem sido levado à letra e, no meio do pântano de demissões, há uma ameaça mais subtil, um dano menos visível, que está à espreita e que se agiganta. “Isto é um tiro à democracia. Já não são casos isolados, todos os dias nos deitamos a pensar quem é o próximo. Embora o povo tenha memória curta, vamos assistir, seguramente, mais às narrativas de que a democracia é a causa dos problemas e não a solução”, diz José Fontes. Aos discursos de que os políticos são todos iguais, de que são todos uns corruptos. E os extremismos aproveitam-se.

O populismo tem feito caminho sempre que as instituições não funcionam, sempre que caem na descredibilização e alimentam humor destrutivo. Paulo Morais, voz ativa no combate à corrupção em Portugal, cofundador da associação Transparência e Integridade e atual presidente da Frente Cívica, viaja até Itália nos anos 1990, quando foi eleita deputada a atriz de filmes pornográficos Cicciolina. “No mandato seguinte, não foi eleita. Porquê? Porque, entretanto, aconteceu em Itália um movimento chamado Operação Mãos Limpas que levou os cidadãos a perceberem que o Estado italiano estava a combater a máfia. A partir daí, deixaram de apoiar movimentos populistas.”

Voltando a Portugal, chegados a este ponto, Paulo Morais é perentório. “Não é apenas o Governo que é descredibilizado, é toda a classe política, o próprio sistema democrático. Com este comportamento de democracia moribunda compromete-se o futuro.” E isto não acontece por acaso, garante, “é porque a fonte de recrutamento para a política é maioritariamente dos aparelhos partidários, que têm atraído não pessoas com provas dadas, mas carreiristas, que tentam fazer carreira na política”. E nos últimos 25 anos, assinala, “os políticos têm vindo a diminuir na sua qualidade”. “Não é no tempo de António Costa, nem deste Governo. De ano para ano, a qualidade dos políticos é menor. Porque os partidos organizaram-se de tal forma como bandos de assalto ao poder, que inevitavelmente quando tomam o poder é para o distribuir pelo bando.”

A par disso, para o professor catedrático José Fontes, o escrutínio público que se vive hoje em dia também dificulta o trabalho dos executivos em recrutar fora dos partidos – algo que tem sido evidente no atual Governo socialista. “Porque esta forma de escrutínio não é atrativa para grande parte das personalidades da sociedade civil. Que tem carreiras, vencimentos que não têm comparação com o que ganha um ministro ou um secretário de Estado, e questionam-se muito se vale a pena sujeitarem-se a isso.”

Ainda assim, Paulo Morais ergue bem alto a bandeira da transparência, que é válida para todos os atores da vida pública. “Desde quem está no governo a quem é bispo, todas estas pessoas têm a vantagem de ter uma voz com uma dimensão diferente da dos outros cidadãos. E se têm uma voz com mais peso na sociedade têm que pagar o preço e isso significa credibilizá-la, permitir aos cidadãos que conheçam o seu património, rendimentos e como têm evoluído.” E quanto maior for o escrutínio, mais certo é que “pessoas com questões éticas no seu percurso não sejam capazes de aceitar cargos públicos”.

Como se desenha o futuro?

Só que o escrutínio tem feito mais caminho no lado de fora do mundo político do que no lado de dentro. Em setembro de 2019, foi constituída a Entidade para a Transparência, órgão para fiscalizar rendimentos, património e interesses dos titulares de cargos públicos. Os membros nunca foram nomeados, e embora se tenha decidido que vai ficar instalada em Coimbra, no Palácio dos Grilos, o edifício continua à espera de obras. “Se já estivesse a funcionar, situações como a de Alexandra Reis que recebeu 500 mil euros da TAP ou de Carla Alves, que recebeu numa conta conjunta 700 mil euros que não consegue explicar, teriam sido detetadas. Só que foi criada no papel e na prática nada”, critica Paulo Morais. Mais de três anos depois, não conta nem um único dia de trabalho, é um nado morto. “Porque o Governo não quis, o Parlamento não quis e o Tribunal Constitucional, entidade responsável pela instalação da entidade, também não quis. O TC é constituído por juízes nomeados pelos partidos e os juízes não querem fiscalizar os políticos dos partidos que os nomearam.”

A questão, para Paulo Morais, é clara. “Está demonstrado que o controlo dos políticos pelos políticos é impossível.” Recentemente, a Frente Cívica escreveu uma carta ao primeiro-ministro a propor a criação de um comité de acompanhamento de ética independente, constituído por personalidades da sociedade civil, “e não pela sociedade política”. “Que define balizas éticas para pessoas que desempenham cargos públicos. Isto pode ser criado de imediato, não tem custos, porque normalmente as pessoas exercem estas funções pro bono. Uma coisa é certa, o critério da legalidade não pode continuar a definir o que é a ética. Esse crivo é feito nos tribunais, não é na política. Na política, tem que se definir algo mais importante, a ética e idoneidade.” E entregar a fiscalização à sociedade civil parece-lhe a única saída possível.

Indiscutível é que é “necessário reforçar o escrutínio e dar confiança aos cidadãos”. É António Costa, mergulhado na balbúrdia de um Executivo sempre a girar, quem o assume. E, sanando-se ou não o problema, só as urnas poderão dar o veredito. Há um ano, a abstenção baixou (desceu de 51,4% nas legislativas em 2019 para 42,04%). E serão as próximas eleições a esclarecer se os portugueses estão mais afastados da política.