Matteo Zuppi: com o coração na rua

Matteo Zuppi é enviado do Papa à Ucrânia para mediar o conflito entre russos e ucranianos

Gosta de percorrer as ruas de bicicleta e partilha com o Papa o gosto pela simplicidade. O enviado de Francisco a Kiev é herdeiro de Bergoglio. Dizem até que é aquele que o argentino gostaria de ver suceder-lhe.

Chamam-lhe “a pequena ONU do Trastevere”, o centenário e colorido bairro operário de Roma. A comunidade de Sant’Egídio, fundada em 1968 no rescaldo do Concílio Vaticano II, proclama um Mundo melhor, mais justo, em palavras e atos. A amizade com os pobres começou com as crianças, mas depressa se estendeu às pessoas sem-abrigo, aos emigrantes, aos doentes terminais, aos que vivem em cadeias, em institutos e em campos de refugiados. Nascida em Roma e formada por leigos, é pacifista. Defende “o diálogo entre os povos”. A dignidade humana.

O guia espiritual e rosto maior da comunidade, em Itália, milita contra a pena de morte, discursa no 1.º de Maio, manda recados a Salvini, à extrema-direita e às políticas anti-imigração. “Odierai il tuo prossimo come te stesso. Perché abbiamo dimenticato la fraternità”, publicado em 2019, denuncia o ódio social. É dedicado pelo cardeal, dizem, ao líder da extrema-direita com quem partilha o nome próprio. “Odiarás o próximo como a ti mesmo.”

Chama-se Matteo Zuppi. E é o enviado do Papa Francisco a Kiev, na tentativa de ganhar a paz. Não é a primeira vez que Zuppi é chamado a cenários de conflito. Em nome da comunidade de Sant’Egídio, foi mediador em Moçambique, uma das figuras de um longo processo – 27 meses de negociações – que conduziria à paz, com a assinatura dos Acórdãos de Roma. Reconhecendo o esforço em pôr fim a 17 anos de sangrenta guerra civil, o italiano foi distinguido com a cidadania honorária de Moçambique.

O mais jovem cardeal italiano no momento da atribuição do título, em 2020, formado em Literatura, em Filosofia, Teologia e especialista em História do Cristianismo, gosta de frases simples. “Eu cuido dos últimos. Sempre fui um padre que se preocupou em encontrar os outros e não porque fosse um padre moderno, mas simplesmente porque esta é a principal tarefa da Igreja.”

O presidente da Conferência Episcopal Italiana está em perfeita sintonia com o Papa. Defende uma “igreja aberta” e é, diz-se no Vaticano, o herdeiro, aquele que Bergoglio gostaria de ver suceder-lhe na cadeira de Pedro. Falam a mesma linguagem. “Sempre vivi junto com os outros. Viver numa casa onde moram outros padres é para mim uma oportunidade de confronto num caminho em que sinto a necessidade de partilhar”, disse ao jornal “La Repubblica”, quando, nomeado arcebispo de Bolonha, trocou o palácio pela casa do clero.

Matteo tem o cristianismo no sangue. Quinto dos seis filhos do jornalista e fotógrafo Enrico Zuppi – antigo e icónico diretor do semanário do Vaticano “L’Osservatore della Domenica”, figura muito próxima de Paulo VI e de intelectuais da época – e de Carla Fumagalli – sobrinha de cardeal -, não resistiu ao chamamento.

Aos 22 anos, já licenciado em Literatura e Filosofia, entra no seminário da diocese de Palestrina, seguindo os cursos de preparação para o sacerdócio na Pontifícia Universidade Lateranense, com uma licenciatura em Teologia. A 9 de maio de 1981 é ordenado presbítero e assistente do pároco da basílica romana de Santa Maria in Trastevere, o bairro do seu coração, apesar dos vários cargos que ocupou desde aí, na capital: de 1983 a 2012, na Igreja da Santa Croce alla Lungara, como membro do conselho presbiteral diocesano, de 1995 a 2012; e, de 2005 a 2010, enquanto prefeito da terceira prefeitura de Roma.

Com “ligação profunda a Nossa Senhora”, é frequentemente visto em oração aos pés da Virgem do Rosário, obra do evangelista São Lucas, guardada no convento de clausura das freiras dominicanas. E pelas vielas do Trastevere, percorridas frequentemente de bicicleta. “Tem o coração na rua”, dizem dele. E ele responde. “Um padre está nas ruas, não nos salões.”

Matteo Maria Zuppi
Cargo:
enviado do Papa à Ucrânia para mediar o conflito entre russos e ucranianos
Nascimento: 11/10/1955 (67 anos)
Nacionalidade: Italiana