A praia, a digestão e os banhos de água fria

(Foto: Pixabay)

O "Consultório Médico" desta semana, por Dinis Brito.

É mesmo necessário esperar 30 minutos antes de entrar na água após a refeição?
Ana Marques, pergunta recebida por email

Tendo em conta a aproximação da época balnear será muito provável que voltemos a ouvir algo que todos já ouvimos da boca das nossas mães ou avós: não vás já para a água porque acabaste de comer! De facto, atrevo-me a dizer que é crença global que é necessário um tempo de espera, geralmente entre 30 minutos e duas horas, antes de entrar na água. Esse será o tempo médio de uma digestão, embora dependa do conteúdo e volume da refeição. Por outro lado, o racional para esta douta recomendação seria a convicção de que a ingestão de alimentos promove um aumento do fluxo sanguíneo junto do sistema digestivo, preparando assim a absorção de nutrientes. Durante este período, o desvio da circulação para os músculos (devido ao movimento)

e para a pele (para aumentar a temperatura) poderia provocar um compromisso da digestão e/ou cãibras musculares que, em última instância, poderiam provocar o afogamento do banhista. Esta é a crença, mas a ciência diz-nos algo diferente.

No processo de digestão, a temperatura corporal aumenta, mas a diferença é desprezível. Por outro lado, o volume de sangue oxigenado, mesmo que mais concentrado nos órgãos abdominais, é mais do que suficiente para suprir toda a atividade muscular dos membros. Pelo que não há qualquer correlação entre cãibras, resposta ao frio, afogamento e digestão.

Convém, contudo, ressaltar uma outra questão. A resposta à temperatura mais baixa da água pode causar um resfriamento súbito do corpo aquando o contacto com água mais fria. A resposta ao choque frio pode levar à inconsciência. Esta resposta ocorre principalmente (mas não só) quando os banhistas correm para a água (mar, rio ou piscina) sem perder tempo a habituar o corpo à diferença súbita de temperatura. É por isso recomendável que esse contacto se faça de forma gradual e progressivo de forma a que o corpo acomode a diferença de temperatura.

Em jeito de conclusão, não há justificação para acreditar que o banho a seguir à refeição seja perigoso. A refeição em si não representa nenhum perigo real a não ser perante consumo excessivo de álcool. Uma percentagem importante de acidentes com banhistas acontece em casos de embriaguez. Recomendo também que a entrada na água seja lenta e progressiva, de forma a evitar o tal “choque térmico”.

Bons banhos! Até breve.

*A NM tem um espaço para questões dos leitores nas áreas de Direito, Jardinagem, Saúde, Finanças pessoais e Sustentabilidade. As perguntas para o Consultório devem ser enviadas para o email [email protected].