Um ano que foi uma guerra

O portefólio do ano 2022.

Bombas, revolta, uma sombra omnipresente

Foi a 24 de fevereiro que o impensável aconteceu: uma guerra deflagrou em plena Europa, com os russos a lançarem bombas com fartura um pouco por toda a Ucrânia (1). Só que o que Vladimir Putin, presidente russo, pretendia que fosse uma “guerra-relâmpago” tornou-se afinal num conflito longo, penoso, sem promessa de epílogo. E as consequências vão ecoando por todo o continente, com os preços a disparar em flecha: da energia aos combustíveis, nem os bens essenciais escaparam. Para lá das fronteiras europeias, destaque para a revolta que há meses toma conta do Irão (3). Os protestos começaram em meados de setembro, depois da morte de Mahsa Amini, que foi detida por alegadamente estar a utilizar o hijab de forma indevida, e mantêm-se vivos até hoje. Com múltiplas detenções e condenações a registar. É ainda preciso lembrar várias eleições importantes, com um denominador comum: a sombra da extrema-direita. Em França, Macron acabou por bater Le Pen, nas eleições presidenciais, mas, nas legislativas italianas, triunfou Giorgia Meloni. No Brasil, Lula da Silva regressou ao poder, destronando Bolsonaro (2). E por falar em saídas de cena, uma nota ainda para o Reino Unido, com a demissão de Boris Johnson, após múltiplos escândalos, e a morte da rainha Isabel II.

Uma maioria agitada e ventos de mudança

Em Portugal, o ano político fica marcado pela maioria absoluta do PS, selada nas legislativas de 31 de janeiro (1). Se muitos prognosticaram que um tal resultado esmagador seria uma passadeira estendida a quatro anos de Governo tranquilos, a realidade tem contado uma história distinta. Desde a rocambolesca rábula entre o ministro Pedro Nuno Santos e o primeiro-ministro, António Costa, por causa do aeroporto, ao caos na Saúde com o encerramento de vários serviços de urgência de Obstetrícia – que levou mesmo à demissão da ministra da Saúde, Marta Temido -, sem esquecer o episódio do pavilhão transfronteiriço que ditou o adeus de Miguel Alves, secretário de Estado Adjunto de Costa durante apenas dois meses, muitos têm sido os casos a ensombrar o Executivo. De registar ainda mudanças de líderes em partidos dos vários quadrantes: no PSD, Luís Montenegro rendeu Rui Rio; no PCP Jerónimo de Sousa saiu ao fim de 18 anos, sendo substituído por um quase desconhecido Paulo Raimundo (2). Alterações à vista também na IL, visto que João Cotrim de Figueiredo já anunciou que não irá continuar.

Seca, incêndios, inflação, abusos

Para lá do turbilhão político, 2022 foi também o ano da pior seca ocorrida em Portugal (2). E aquele em que o nosso país registou a maior percentagem de área ardida em toda a Europa (1). Mas estas não foram as únicas más notícias a ensombrar o ano. À boleia do que aconteceu por todo o Mundo, a inflação disparou, chegando a atingir os 10,2% em outubro (o valor mais alto desde 1992). Foi ainda o ano em que se pôs o dedo na ferida relativamente aos abusos sexuais cometidos no âmago da Igreja Católica Portuguesa. Foi criada uma comissão independente para apurar a dimensão do fenómeno e vários bispos têm sido acusados de encobrir casos que lhes foram denunciados ao longo dos anos.

O Bolhão de volta, as cheias também

A nível local, e começando pelo Porto, é incontornável a inauguração do centenário Mercado do Bolhão, após mais de quatro anos de obras (1). “É uma emoção difícil de conter”, confessou Rui Moreira, o autarca portuense que também foi um dos protagonistas do ano. Primeiro, em janeiro, foi absolvido no caso Selminho; depois, em maio, a Câmara do Porto deixou a Associação Nacional de Municípios Portugueses, descontente com a forma como a associação estava a conduzir o processo de descentralização. Em Lisboa, as cheias voltaram a atacar em força na capital e arredores, provocando prejuízos de milhões de euros, dezenas de desalojados e uma morte (2).

O ocaso de Ronaldo num ano azul e branco

Este foi o ano em que Sérgio Conceição, treinador do F. C. Porto, voltou a conduzir os portistas à glória nacional. Os portistas não só foram campeões, como venceram a Taça de Portugal e a Supertaça (2). Só não fizeram o pleno porque o Sporting ficou com a Taça da Liga. Mais atípico foi o facto de as coisas não terem corrido bem a Cristiano Ronaldo. Depois de um verão marcado pelos rumores da saída do Manchester United, CR7 continuou mesmo nos “red devils”, mas a história não teve final feliz. Em novembro, deu uma entrevista em que deixou duras críticas a Ten Hag, treinador do United, acabando a rescindir contrato. No Mundial, disputado no Catar, também não foi feliz: marcou apenas um golo, foi “apanhado” a dirigir palavras pouco simpáticas a Fernando Santos (que entretanto saiu), foi para o banco, viu Portugal ser eliminado nos quartos de final (1) e ainda teve de assistir à coroação do maior “rival” que teve ao longo da carreira – Messi. O ano estava destinado a ser azul e branco.