Todos os nomes
Rubrica "A vida como ela é", de Margarida Rebelo Pinto.
Os nomes que damos a quem amamos, inventados pela nosso desejo e imaginação, são só nossos e deles, constituindo por si só um reino privado e exclusivo.
Desde pequena que a minha mãe me chama Mariazinha quando está feliz comigo e Maria Margarida quando me quer ralhar, ou chamar a atenção para alguma coisa que ela considera não estar bem, ou que eu possa melhorar. E eu chamo-lhe mãe, minha mãe, ou Queen Bee, consoante o contexto. Alcunhas, diminutivos e “petit noms” que inventamos para aqueles que amamos são uma das muitas expressões do nosso amor. Tal como os abraços apertados, sempre dados pela esquerda, coração com coração, coisas boas que o meu filho me ensinou, a quem chamo Criatura, Pequeno-Grande Lourenço e outros mimos.
Aquilo que chamamos aos outros também é um espelho de como os vemos ou do que sentimos por eles. Claro que esta mania de pôr alcunhas tem os seus perigos. Se for um interesse passageiro e registarmos o contacto sob a alcunha, corremos o risco de esquecer o nome próprio. Convém por isso alguma ponderação em escolher nomes codificados, acredito que o critério se define pela importância e pelo lugar que as pessoas ocupam na nossa vida. E quanto mais importantes forem, mais nomes irão ganhar ao longo do tempo, adquiridos e merecidos, pois o tempo não respeita o que é feito sem ele. Tais designações classificadas fazem parte do património afetivo que vamos construindo, cada dia mais um bocadinho, peça a peça, como uma casinha de Lego, ou tijolo a tijolo, se for para a vida.
Este bom hábito também é válido para as amizades. Tenho, entre os mais próximos, uma Mini, uma Guerreirinha, um Robocop, uma Fada Azul e um Bradley Cooper. Um amigo do Rio de Janeiro, jornalista e escritor, chama-me Marquerida. Saiu-lhe há duas décadas, numa troca de emails sobre a vida, o amor e a literatura. Ficou-me colado à pele, retrato da minha paixão pela cidade maravilhosa onde me sinto em casa, no meio das águas de coco, da confusão do Posto 10 e da magia do Parque Lage. Foi uma invenção inspirada e feliz porque contém o afeto no adjetivo, o mundo que nos separa e nos junta no substantivo, e é prova de que a distância, a ausência e a saudade são líquidas como o amor.
Os nomes que damos a quem amamos, inventados pelo nosso desejo e imaginação, são só nossos e deles, constituindo por si só um reino privado e exclusivo. E quanto mais amamos alguém, maior é a lista. Por isso, caro leitor ou leitora, se sentir que lhe está a bater à porta alguém especial, com vontade e capacidade de o fazer voar sem partir a asas em aterragens forçadas, escolha um nome ou alcunha que lhe assente como uma luva e que fique como a marca de água de algo maravilhoso e bom que a vida lhe trouxe. E depois invente outro, e mais outro, deixe-se encantar por todos os nomes que a sua imaginação criar. Ao fim de uns meses, a lista será como um segredo, um tesouro, uma caixa azul com um código de abertura que só os dois conseguem decifrar.
É quando damos nomes às pessoas que elas crescem no nosso coração.