Jorge Manuel Lopes

Taylor Swift fora de horas


Crítica musical, por Jorge Manuel Lopes.

No som e no tom, “Midnights” (Republic/Universal) retoma a narrativa de Taylor Swift pré-pandemia. É um sucessor lógico de “Lover”, de 2019, dando assim à dupla “Folklore” e “Evermore” (2020), mais recolhida e naturalista, um estatuto de parêntesis no percurso. Este é também o disco em que a aliança é mais forte com o produtor, compositor e multi-instrumentista Jack Antonoff: .a dupla tem mão em 17 das 20 faixas da versão mais extensa, a “3am edition”, de “Midnights”.

O título não engana. Há uma aura noturna a envolver as canções, o ar espesso graças a texturas sintéticas, com versos que prolongam um estado de graça amoroso e as inescapáveis dúvidas e êxtases e receios e memórias perfeitas, a sós ou a dois. Funk cinemático atravessa o alinhamento, com particular inspiração em “Karma”, em que o sangue ferve. “Midnight rain” e “Dear reader” estendem os braços até ao ritmo arrastado do trap. A propulsão é urgente em “You’re on your own, kid”, um clássico futuro, que recupera a ânsia que torna todas as coisas transcendentes na adolescência.

Taylor Swift continua a ser o assunto favorito nas canções de Taylor Swift, com várias implicações positivas – uma delas, possivelmente, a parcimónia no recurso a vozes convidadas. Por “Midnights” passa apenas Lana Del Rey, aliança natural perante as afinidades sonoras entre ambas, discretíssima na languidez de “Snow on the beach”.

Uma boa mão cheia de canções de “Midnights” não sobreviveria a uma filtragem mais sensata, mas a chegada de “The great war”, a primeira das sete faixas adicionais da “3am edition”, é uma bem-vinda corrente de ar, com Aaron Dessner (The National) a substituir Antonoff e a criar condições para um idioma com mais nuances e sobriedade. E é com Dessner que Taylor Swift entrega a canção mais pungente do álbum, “Would’ve, could’ve, should’ve”, entre o arrependimento, a acusação e a assimilação de uma relação traumática na adolescência com um homem mais velho – um regresso ao caso com John Mayer.