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Quando a campanha é uma comédia

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No corrupio eleitoral, que chegou com uma maratona de debates às costas, não tem faltado matéria para humor. Os votos só serão contados no dia 30, mas até lá faz-se caminho no riso. Doze perguntas, cinco humoristas e (alguma) política à mistura.

Janeiro já vai longo, mais de 30 debates. Foram esclarecedores ou aproximaram-se mais a um filme de Quentin Tarantino?

FERNANDO ROCHA: Acho que se aproximaram mais aos “Batanetes”.

SALVADOR MARTINHA: Comeram-se muitas pipocas. O filme “Kill Ventura” trouxe público às salas.

ANA ARREBENTINHA: Foi o mesmo de sempre. Das repetições infantis à “Teletubbies”, às revelações tipo “Aberto até de Madrugada” do Quentin Tarantino.

ANTÓNIO RAMINHOS: Aproximam-se mais de um filme de David Lynch, principalmente daqueles que chegam ao fim e fico sem perceber metade do enredo. Por outro lado, há aqui argumentos de novela… o tipo (PS) que foi traído pelos melhores amigos (CDU e BE), o arqui-inimigo que tenta conquistar o seu lugar (PSD), o vilão (CHEGA) e depois uma data de figurantes e personagens secundárias pelo meio.

HERMAN JOSÉ: Não só foram esclarecedores como resultaram em excelentes audiências. Bom sinal.


Quem é que está a ter mais tempo de antena nesta campanha eleitoral: candidatos ou comentadores?

FERNANDO ROCHA: Tempo de antena não sei, mas quem tem as antenas maiores é o Ventura.

SALVADOR MARTINHA: O Sebastião Bugalho. Nas últimas eleições ainda tinha de pedir aos pais para ficar acordado até ao Marques Mendes dizer boa noite.

ANA ARREBENTINHA: É melhor perguntar ao VAR. Perdi-me enquanto fui buscar pipocas à cozinha.

ANTÓNIO RAMINHOS: Os comentadores claramente e, por essa ordem de ideias, acho muito mal a CMTV não ter metido o Octávio Machado, o Futre e o Malheiro a comentarem as eleições.

HERMAN JOSÉ: Na minha televisão, os tempos de antena estão adjudicados à quadra Netflix, HBO, Disney Channel, Amazon Prime.


Ideologia de género, casamento gay, prisão perpétua foram tema nos debates. No campo das apostas, em que ano terá acontecido esta campanha?

FERNANDO ROCHA: Ui, estes assuntos vieram para aí de 1920.

SALVADOR MARTINHA: 1 a.C.

ANA ARREBENTINHA: Foi mesmo em 2022… É o que é… É o que temos…

ANTÓNIO RAMINHOS: Vejo facilmente o seguinte diálogo entre viajantes do tempo que acabam de vir do futuro para Portugal em 2022:
– “Ahhhh catano! Pessoal enganei-me nos botões! Devo ter carregado em 2000!“
– “Não! Deves estar certo!”
– “Será? Olha! Está a dar o Big Brother… claramente 2000”

HERMAN JOSÉ: Da esquerda para a direita, as ideias começam em 2022, descansam longamente nos anos 1980, passam pelos anos 1970, e vão desaguar em 1022 no “Tribunal Público contra a Heresia”.


Um dos maiores desafios da próxima década, o bicho papão das alterações climáticas, ainda não entrou na corrida às eleições. Ninguém está interessado em medir a temperatura ao fim do Mundo?

FERNANDO ROCHA: Talvez os gajos do PAN sejam os mais preocupados nesta matéria.

SALVADOR MARTINHA: O ambiente é a sobremesa naqueles almoços em que se salta do prato principal para o café.

ANA ARREBENTINHA: Acho que na Comporta um ou dois grauzitos a mais até vem a calhar. Se houver problema cria-se uma comissão independente para coordenar uma outra comissão coordenadora de outra comissão e inventa-se uma solução com a velha geringonça. A geringonça luso-climática.

ANTÓNIO RAMINHOS: É o clássico. Chama-se falta de empatia ou visão pelas gerações futuras. Também todos sabíamos da possibilidade de uma pandemia. Provavelmente vão lembrar-se das alterações climáticas quando, um dia, um líder político sair de casa e entrar em combustão espontânea.

HERMAN JOSÉ: No subconsciente de maior parte da humanidade, estão impressas duas máximas: “Salve-se quem puder” e “Quem vem atrás que feche a porta”.


A cultura da Cultura também não tem sido regada. Será por falta de água ou por falta de chá?

FERNANDO ROCHA: Acho que é por excesso de estrume na cabeça de alguns… de alguns políticos.

SALVADOR MARTINHA: Eu acho que para os políticos a cultura é um encenador a fumar dinheiro.

ANA ARREBENTINHA: Água mole em pedra dura, tanto bate até que fura. É preciso continuar a lutar contra a falta de água dos artistas e a falta de chá dos legisladores.

ANTÓNIO RAMINHOS: Ainda esta semana tive dois espetáculos cancelados pela confusão das regras. Lá está, falta de bom senso, de empatia, compreensão. Pode ser que sintam falta dos artistas agora nas arruadas…

HERMAN JOSÉ: Diz o povo “casa onde não há pão, não há razão”. A versão cultural: “Casa onde não há Eça, Pessoa e Camões, não há euros, nem dólares nem tostões”.


Sobre as muitas páginas de ideias para o país, façamos uma eleição antecipada: qual é a pior?

FERNANDO ROCHA: Logo na primeira página borraram tudo.

SALVADOR MARTINHA: São nove páginas, tem dois minutos? É o tempo de um encenador fumar um subsídio.

ANA ARREBENTINHA: Venha o Diabo e escolha.

ANTÓNIO RAMINHOS: Todas as que envolvem demagogia pura e populismo. Parecem as eleições para as associações de estudantes, onde se prometem as coisas mais banais sabendo que são impossíveis de cumprir. Ao menos, nas associações de estudantes ainda se consegue uma mesa de matraquilhos, aposto que aqui nem isso.

HERMAN JOSÉ: São todas más e ficarão cada vez pior, até ao dia em que o voto seja ferozmente obrigatório e passível de ser feito em casa por computador ou telemóvel com recurso a assinatura digital.


A questão que importa aos portugueses. No mundo do humor, qual dos candidatos não tem graça nenhuma?

FERNANDO ROCHA: André Ventura.

SALVADOR MARTINHA: Talvez pelo tom, diria que é a Catarina Martins. O tom com que dizemos determinada piada é uma coisa que se trabalha. Se formos muito arrogantes há qualquer coisa que se desliga no público. Não sei se na política se perde público assim.

ANA ARREBENTINHA: Acho que disso não nos podemos queixar. Temos humoristas em todos os partidos. Até temos o Tino de Rans a concorrer pelo partido RIR. Somos uns felizardos.

ANTÓNIO RAMINHOS: Não vou dizer! Fiquem a adivinhar! Seja qual for que diga, é estar a dar demasiada importância a quem, pelo menos a mim, não me interessa!

HERMAN JOSÉ: Todos aqueles que tentam usar o humor forçado como arma de arremesso e propaganda.


Em matéria de decibéis, quem é que está a conseguir gritar menos?

FERNANDO ROCHA: Acho que é a menina do PAN e o do Livre, estão os dois empatados.

SALVADOR MARTINHA: Chicão. Estou a brincar.

ANA ARREBENTINHA: Outra questão para o videoárbitro.

ANTÓNIO RAMINHOS: O camarada Jerónimo de Sousa, que espero que esteja já bem de saúde. Grita menos pela postura calma que tem, mas também pela idade… A CDU defende a reposição da idade da reforma para os 65 anos, mas o camarada Jerónimo já a ultrapassou há nove. Com todo o respeito pelo líder Jerónimo de Sousa, faz lembrar aqueles senhores que continuam a não querer reformar-se para não estarem em casa. Acho que a CDU ganhava com líderes mais novos e o camarada Jerónimo passava só a ir lá à sede para jogar sueca e dar uma dicas.

HERMAN JOSÉ: São muitas vezes os que menos gritam que ecoam mais alto. Lá diz a velha canção dos The Tremeloes “Silence is golden”.


Num mar de divisões entre o SNS, política fiscal, apoios sociais, justiça ou TAP, que candidato parece ter engolido uma cassete?

FERNANDO ROCHA: O André Ventura. Não se cala sempre com a mesma merda.

SALVADOR MARTINHA: Os políticos estão mais modernos. Em vez de cassetes ou álbuns, lançam singles. O PS lançou um hit: Aumento do salário mínimo em 2026. As pessoas não sabem a letra toda mas cantam o refrão.

ANA ARREBENTINHA: Por mais que tentem, nunca mais ninguém conseguiu chegar aos calcanhares do saudoso Aquiles, o ilustre Cassete Carvalhas.

ANTÓNIO RAMINHOS: Todos… todos eles têm a sua cassete. Volta e meia a fita enrola e tem de se ir lá com a caneta para aquilo voltar a tocar… não sei é onde se mete a caneta.

HERMAN JOSÉ: Deixou de haver cassetes para passar a haver navegação à vista. Tenho saudades dos tempos em que era preciso mais do que só tendências e sondagens para mudar o discurso.


Entre muitas fotocópias e incoerências, que líderes partidários se estão a ver mais aos papéis?

FERNANDO ROCHA: Quem se está a ver mais aos papéis acho que é mesmo o Rui Rio.

SALVADOR MARTINHA: Curiosamente, o mais novo de todos é o que tem menos noção de si mesmo. É um meme e parece-me que não sabe bem porquê. Mais depressa confiava nele para vender rifas ou organizar uma boa noite de Trivial.

ANA ARREBENTINHA: Eles são a típica família disfuncional que todos conhecemos. Odeiam-se em público e amam-se em privado. Para quando trocarem os gráficos e as fotocópias por uma batalha de dança no TikTok?

ANTÓNIO RAMINHOS: Não sei… acho que não é tanto ver-se aos papéis mas tentar tempo de antena. Partidos menos representativos como o IL ou o Livre parecem-me às vezes eu na minha adolescência a tentar chamar a atenção das raparigas enquanto elas só ligavam aos populares da escola.

HERMAN JOSÉ: O “Mike” Cotrim Figueiredo tem de aprender com o “Melga” Ventura a colocar os papéis que utiliza em frente ao peito. A maior parte dos que mostrou estavam fora do enquadramento.


Quando chegarmos a dia 30 e a vitória for a mesma de sempre, da abstenção, quem é que mais vai contribuir para isso? A covid ou o sol de inverno?

FERNANDO ROCHA: Nem uma nem outra. O descrédito político que paira sobre todos os portugueses é que faz com que a malta se esteja a cagar e não vá votar por causa disso. E pensei seriamente em fazer o mesmo. Mas o dever chama-me e irei sempre votar.

SALVADOR MARTINHA: Se a abstenção baixar vou a pé até Fátima. Fátima Lopes porque acredito que vai baixar.

ANA ARREBENTINHA: É tão difícil decidir qual o nosso M&M favorito. Diferentes cores, mas sempre o mesmo sabor. O problema é que esta imposta indecisão é sempre boa para as mesmas pessoas.

ANTÓNIO RAMINHOS: Provavelmente os dois… a abstenção não é um protesto, é preguiça… um protesto é votar contra a corrente, é votar em branco. Por exemplo, se não querem que sejam sempre os mesmos no poder, então há que votar nos mais pequenos para que os partidos maioritários sejam forçados a estabelecer acordos.

HERMAN JOSÉ: A contribuição é dada por um sistema de votação obsoleto, anacrónico e desmotivador. Numa época onde se compram carros online, não percebo como é que o desconforto para votar consegue ser maior do que o de estar na fila para a vacina.


Dizem que as sondagens estão doentes. Ainda assim, estas eleições antecipadas podem bem vir a ser um “baralhar tudo e voltar ao mesmo”. Não será uma perda de tempo?

FERNANDO ROCHA: Não. Eleições nunca é uma perda de tempo. É sempre uma oportunidade. As pessoas ao não aderirem ao voto é que estão a fazer com que a luta dos nossos antepassados pela democracia tenha sido em vão e se tenha tornado numa perda de tempo. Não vamos fazer com que o 25 de Abril seja uma perda de tempo e vamos todos às urnas, vamos todos votar.

SALVADOR MARTINHA: Eu acho que ganhámos tempo. Quanto mais falarmos de política menos nos passam a perna. Continuo sem perceber muito de política, mas já salto em algumas rasteiras.

ANA ARREBENTINHA: Já que o circo vem à cidade mais do que uma vez, é preciso aproveitar.

ANTÓNIO RAMINHOS: É… e as legislativas também… para mim isto resolvia-se tipo Big Brother… todos os líderes dentro de uma casa fechados… passadas duas semanas começavam a revelar as suas verdadeiras facetas… Cristina Ferreira a apresentar e galas ao domingo para expulsões!

HERMAN JOSÉ: Os sistemas de sondagens continuam os mesmos de sempre: esforçados e sérios. Os eleitores é que aprenderam a toureá-los. E divertem-se com isso. Cada vez mais.