Princesa Diana, as memórias portuguesas

Mergulhou, às escondidas, numa piscina no Cacém, brindou com vinho do Porto no dia do casamento com o príncipe Carlos, enviou cartas de agradecimento a uma fã e a uma corporação de bombeiros. Quando passam 25 anos sobre a sua morte, as histórias da ligação de Diana de Gales ao nosso país, contadas por quem as viveu e para quem continua bem viva na memória. Testemunhos exclusivos de Maria Cavaco Silva e Manuela Ramalho Eanes.

Apesar de avisados com antecedência pelo Palácio de Buckingham, os poucos homens da Associação Humanitária de Bombeiros Voluntários de Agualva-Cacém quiseram ver para crer naquela manhã fria e chuvosa de fevereiro de 1987. Rodeada de seguranças, dentro e nas imediações do quartel, Diana de Gales preparava-se para entrar na piscina aquecida para cumprir as suas braçadas diárias, naquilo que seria uma “fuga” discreta do Palácio de Queluz, onde estava instalada com o marido, Carlos, o príncipe de Gales, durante a visita do casal real britânico a Lisboa e ao Porto entre 11 e 14 de fevereiro daquele ano. Quiseram ver para crer, mas não conseguiram. Apenas duas damas de companhia inglesas acompanharam Diana de Gales aos balneários, antes de colocar a touca e o fato de banho. Houve, ainda assim, espaço para a imaginação. Na altura, o presidente dos bombeiros voluntários, Artur Lage, confessava ao extinto jornal “A Capital”: “Não a vi em fato de banho, mas deve ser um brinquinho!”. Eram oito horas da manhã quando a mulher que já tinha os olhos do Mundo postos em si chegou ao regimento e seguiu-se meia hora de treinos, que ficaram na memória coletiva do aquartelamento. Até hoje.

Vinte e cinco anos depois da sua morte, a 31 de agosto de 1997, num trágico acidente no “Túnel da Alma”, em Paris, aos 36 anos, na fuga a vários “paparazzi”, o atual presidente da direção da Associação Humanitária de Bombeiros Voluntários de Agualva-Cacém recorda o episódio insólito ocorrido há três décadas e meia. “Todos os dias a princesa Diana praticava natação. Na altura, houve a feliz coincidência de estarmos próximos do Palácio de Queluz e de no concelho de Sintra termos a única piscina aquecida e coberta, ainda por cima em fevereiro, no inverno”, lembra Luís Batista. “As entidades oficiais de Inglaterra solicitaram, no âmbito da visita, a colaboração da nossa instituição no sentido da cedência do espaço durante alguns minutos.”

Luís Batista, presidente dos Bombeiros de Agualva-Cacém, na piscina que, há 35 anos, recebeu a princesa. Diana nadou meia hora e só foi acompanhada por duas damas de companhia inglesas
(Foto: Paulo Spranger/Global Imagens)

O clima “foi de maior secretismo”. “Aqui foram poucos os bombeiros que sabiam e só duas pessoas tiveram a oportunidade de estar presentes no momento da receção: o comandante da altura, Artur Laje, e um membro da direção, um vice-presidente”, desfia Luís Batista. “Foi um cumprimento meramente de circunstância, uma coisa muito rápida, porque nem o pessoal de apoio da piscina teve possibilidade de estar presente.”

Os recortes dos jornais da altura recordam que a corporação batizou uma ambulância com o nome da ilustre visitante
(Foto: Paulo Spranger/Global Imagens)

A colaboração com a realeza valeu à Associação uma carta de agradecimento dos príncipes de Gales que, até hoje, mantém viva a memória de Diana. “Apesar de algumas pessoas não terem conhecimento da visita da princesa e de não haver outra associação de bombeiros que se possa gabar de a ter recebido, é um facto que as pessoas quando sabem acham curioso e é um testemunho de uma figura estimada que tentamos passar.”

O princípio do fim do casamento

Diana tinha “escapado” durante uma hora do Palácio de Queluz, onde ficou instalada com o príncipe Carlos, e foi no Pavilhão Dona Maria I que terá acontecido o ponto de viragem na relação, como escrevem vários biógrafos da princesa. A própria admitiu publicamente: “Em 1987, em Portugal, foi a última vez que estivemos juntos como marido e mulher”. À época, a comunicação social deu ênfase à utilização de quartos separados no Palácio, insistindo em rumores de separação, mas a verdade é que se terá tratado de uma mera questão… protocolar: o Pavilhão D. Maria I tem, de facto, quartos distintos para a realeza, conforme a NM testemunhou numa visita dirigida por Conceição Coelho, conservadora do Palácio Nacional de Queluz e responsável pelo projeto museográfico daquela área.

Conceição Coelho, conservadora do Palácio Nacional de Queluz, fez com a equipa da NM uma visita guiada às áreas mais privadas do Pavilhão D. Maria I
(Foto: Paulo Spranger/Global Imagens)

O átrio principal da residência dá acesso aos aposentos privados, que ficam na zona nobre, no primeiro andar. A partir daí não há qualquer outro acesso ao espaço mais privado da residência. “Esta visita não teve um caráter oficial e foi das poucas exceções que o Estado português fez”, conta a responsável.

À época, Simonetta Luz Afonso era a conservadora do Palácio. “Os príncipes de Gales foram agradáveis e simpáticos. Muito corteses e ‘friendly’”, refere quem também foi comissária da Expo’98, em Lisboa. “Falámos sobre o palácio e a vida dos portugueses. Voltei a encontrar o príncipe Carlos na Expo’98. Falou-me de arquitetura, era muito interessado no tema.”

O quarto de Diana no Palácio de Queluz. Na altura, a imprensa noticiou que os príncipes dormiram separados, até porque o protocolo indicava outra divisão para Carlos
(Foto: Paulo Spranger/Global Imagens)

Particularmente sobre Diana, as referências de Simonetta Luz Afonso são as melhores. “Era muito bonita, simpática e curiosa. Preocupava-se muito com o que ia usar e aquilo que os outros podiam pensar sobre ela”, acrescenta a antiga conservadora do Palácio de Queluz. “Foi uma morte trágica, que entrou no imaginário das pessoas por tudo aquilo que se disse… e ainda continua a dizer.”

Os príncipes de Gales escolheram esse mês de fevereiro de 1987 para retribuir a visita que o presidente Mário Soares fizera a Londres no ano anterior, para assinalar os 600 anos do casamento do rei português D. João I com a britânica Filipa de Lencastre. A viagem de Carlos e Diana incluiu diversas visitas – Castelo de São Jorge, Palácio Nacional da Pena, Mosteiro dos Jerónimos, Palácio da Ajuda, Fundação Calouste Gulbenkian, navio Crioula. Seguiu-se o Porto. No Palácio de Cristal, os príncipes de Gales inauguraram uma exposição de bens e serviços da Grã-Bretanha. Junto à Sé Catedral, pisaram as capas dos estudantes universitários e celebraram a aliança mais antiga do Mundo entre os dois países. Foi então que, junto à população que aguardava ansiosamente os príncipes, uma criança com seis anos se destacou no meio da multidão e entregou um ramo de flores a “Lady Di”. Trinta e cinco anos depois, Nádia Bastos recorda aquele momento. “Foi a minha mãe que pediu no próprio dia para eu ir. Não estava previsto, mas ela falou com uma pessoa da organização face à minha insistência”, conta a agora professora do 1.º Ciclo do Ensino Básico. A “insistência” tinha um motivo. “Faço tratamentos aos olhos em Londres desde os meus oito meses de idade e um dos meus sonhos era conhecer a princesa pessoalmente.” E sonho tornou-se realidade. “A princesa fez-me uma festa na cabeça, disse ‘lovely girl’ e agradeceu. E ficou surpreendida por as flores serem acompanhadas por uma carta da minha mãe a agradecer o tratamento e a hospitalidade que sempre recebi em Londres.”

Nádia Bastos hoje é professora do Ensino Básico

Diana não ficou indiferente ao gesto e retribuiu a simpatia, também com uma carta, enviada pelo seu gabinete: “O príncipe e a princesa de Gales pediram-me para lhe agradecer e à sua filha as cartas e fotografias. Suas Altezas Reais estão muito agradecidas pelos seus simpáticos desejos para eles e família”, assina Humphrey Mews, na altura secretário dos príncipes de Gales. “Ela foi muito simpática e sorridente. Tinha um sorriso aberto e lembro-me muito bem do nosso encontro”, prossegue Nádia, que não é uma fã qualquer: “O meu vestido da primeira comunhão foi igual ao das suas damas de honor”.

A carta de agradecimento dos príncipes a Nádia Bastos, a jovem que recebeu a princesa com flores, no Porto

Para a professora, o momento do acidente foi um tremendo abalo emocional. “Quando ela faleceu naquele trágico desastre fiquei chocada, juntamente com a minha mãe, afinal ela era a Princesa do Povo”, sublinha. “Por vezes ainda oiço a música que o Elton John adaptou para ela, a ‘Candle in the wind’. Naquele ano, como fui a Londres em tratamento, tive a oportunidade de deixar o meu tributo em Kensington Palace.”

Nádia garante que a memória prevalece. “Sim, passados tantos anos a sua memória ainda está bem presente. Penso que não só em mim, mas em todas as pessoas e sobretudo nas crianças que ajudou nas suas enormes manifestações de caridade e solidariedade. Quebrou e refrescou a monarquia com a sua visão genuína e próxima do povo.”

Outros “encontros imediatos”

Se Diana de Gales teve encontros fortuitos, como é o caso dos anónimos portugueses relatados, foram mais frequentes os contactos com diplomatas, assessores ou, até, com uma figura do jet set nacional. Francisco Seixas da Costa, antigo embaixador, lembra-se bem de quando viu a princesa num restaurante da moda de Londres. Estávamos em 1992 e Francisco entrou no San Lorenzo, um restaurante italiano em Beauchamp Place, na capital inglesa, onde almoçava com um amigo inglês que lhe elogiou a escolha: “É aqui que a princesa Diana costuma vir”. E assim foi. Diana apareceu e Francisco Seixas da Costa constatou que “era mais bonita ao vivo do que em fotografias”.

“Mais tarde, na embaixada de Portugal em Inglaterra, durante uma visita de Mário Soares, em 1993, voltei a vê-la. E houve ainda uma receção no Palácio de Buckingham ao corpo diplomático”, salienta. E quais eram os atributos de Diana? “Era uma mulher encantadora, muito simples, agradável e simpática, de fácil trato. Numa família real que era toda ela um pouco artificial, onde havia alguma tensão, a princesa Diana trouxe autenticidade e frescura, ainda não tinha quaisquer tiques.”

A princesa Diana com o então presidente da República, Mário Soares
(Foto: Arquivo)

José Bouza Serrano cruzou-se com a princesa também em Inglaterra. “Baixei a cabeça em Ascot (nas corridas de cavalos às quais os membros da realeza assistem), durante um ‘Lady’s Day’, e as senhoras fizeram uma vénia”, diz. “Ela ainda se mantinha na família real, mas a situação já estava tremida”, recorda, para elogiar Diana: “Tinha uma certa aura, era lindíssima, estava sempre bem arranjada”. O diplomata e monárquico convicto explica a razão por que a princesa sobressaiu. “Creio que chegou junto do coração dos britânicos e percebeu a força que tinha dentro dela. O príncipe Carlos sempre quis estar, como ela, no coração dos súbditos.” Depois, a princesa Diana “abraçou várias causas, como a luta contra a SIDA, a questão das minas em Angola…”, refere o antigo diplomata, que vai lançar um livro sobre os Windsor chamado “A viúva de Windsor”.

E porque é que Lady Di continua na memória coletiva bem viva? “Pelo efeito impensável que produziu na sociedade britânica, tão avessa a demonstrar sentimentos, mas que transbordou por ocasião da sua morte inesperada. Em certo momento, ela era a mulher mais conhecida e fotografada do Mundo.”

Carlos Ventura Martins, antigo assessor de Mário Soares, também se cruzou com a princesa. “Estive com ela duas vezes. Uma em Londres, em visita de Estado com o doutor Mário Soares, quando o príncipe de Gales organizou um banquete e, mais tarde, na receção aos príncipes em Portugal.” “Havia expectativa naquela figura muito popular e rodeada de tanto misticismo”, reconhece. “Conheci pessoalmente, não trocámos mais do que um aperto de mão, mas pareceu-me uma pessoa simpática e agradável. Em Portugal voltei a vê-la na Fundação Calouste Gulbenkian.”

Carlos Ventura Martins, antigo assessor de Mário Soares, esteve duas vezes com a princesa Diana
(Foto: DR)

Carlos Ventura Martins ter-se-á cruzado uma terceira vez com a princesa, agora a título particular, e a história é curiosa. “Depois de ter estado com ela voltei a Londres. Passo por um restaurante famoso quando vejo a Diana a entrar num Bentley, acompanhada por um segurança. Disse-me ‘hello’ e seguiu a toda a velocidade. Fiquei muito admirado”, realça. “O mais curioso disto tudo é que mais tarde, em conversa com amigos, disseram-me que em Londres havia sósias da princesa Diana, que ostentavam também esses luxos. Na altura fiquei convencido que era ela.”

A socialite Paula Bobone cruzou-se também mais do que uma vez com Diana. A primeira foi em 1987 quando, na visita a Portugal, os príncipes de Gales passaram pela Fundação Calouste Gulbenkian. “Houve uma receção por causa da aliança de 600 anos entre Portugal e Inglaterra, por causa do casamento de D. João I com D. Filipa de Lencastre. Trocámos sorrisos e palavras de simpatia e assistimos a uma exposição com documentos da época.” A memória da princesa está bem viva. “Ela ia de preto, não me esqueço, porque foi a primeira vez que deixei a minha filha em casa entregue a uma ama. A dada altura o príncipe Carlos olhou para mim e também sorriu.”

“A segunda vez que nos cruzámos foi numa festa em Versailles, em Paris, em novembro de 1994. Fiquei embasbacada”, confessa. “Recordo-me que o Elton John [grande amigo de Diana e que cantou ‘Candle in the wind’ no funeral] foi tocar a esse evento. Estava lindíssima, de vestido preto, decote geométrico e, à mesa, conseguia observá-la ao lado de outras personalidades importantes”, rebobina.

Diana e Carlos separaram-se em 1992 e divorciaram-se em 1996, depois de uma relação em que nasceram William – o segundo na linha de sucessão do trono – e Harry e de anos de alegadas traições mútuas. O príncipe nunca deixou de se encontrar em segredo com a paixão de adolescência, Camilla Parker Bowles – casaram-se em abril de 2005 -, enquanto a princesa de Gales terá mantido um relacionamento infiel com o oficial do Exército James Hewitt. Em 1995, no programa “Panorama”, do jornalista da BBC Martin Bashir, naquela que é considerada uma das entrevistas mais polémicas do século XX, Diana não teve papas na língua para com Camilla: “Bem, éramos três neste casamento, por isso estava um pouco lotado”. No entanto, para convencer Diana a dar o seu testemunho, Martin Bashir informou-a que o príncipe de Gales mantinha uma relação amorosa com a ama dos dois filhos, Alexandra Pettifer. Só que a alegação era falsa e a BBC foi forçada a pedir desculpa publicamente e a garantir que a entrevista nunca mais seria exibida.

Diana de Gales era uma princesa muito acarinhada pelo povo (Foto: Pool-John Stillwell/AP Photo)

Mais tarde, foi público o namoro da princesa com o cirurgião Hasnat Khan e com o milionário Dodi Al-Fayed. A 31 de agosto de 1997, Diana de Gales perdia a vida na sequência de um acidente de carro num túnel de Paris, quando era perseguida por dezenas de “paparazzi”, à procura de melhores fotos da relação com o egípcio Dodi Al-Fayed. Os repórteres fotográficos chegaram a ser apontados como culpados, mas uma investigação francesa em 1999 descobriu que o motorista, Henri Paul, estava alcoolizado e sob o efeito de medicamentos quando perdeu o controlo do potente Mercedes. Apesar dessa investigação, mantêm-se algumas teorias da conspiração de que a princesa terá sido assassinada e que estaria grávida, o que não se veio a confirmar, de acordo com exames realizados.

Na semana passada, Victor Mishcon, conselheiro legal de Diana de Gales, afirmou que a princesa terá previsto a sua morte dois anos antes do acidente fatídico em Paris. Teorias deixadas na nova série documental “The Diana investigations”. Num encontro para “partilhar algo que ia na sua cabeça”, Diana terá dito a Victor Mishcon que “fontes seguras lhe asseguraram que um acidente de carro estaria a ser preparado”. Diana previu que “acabaria morta ou ferida com gravidade”, assinala Mishon no documentário, ao qual o site norte-americano “The Daily Beast” já teve acesso.

A morte, aos 36 anos, enlutou o Mundo de uma forma sem precedentes e o funeral foi assistido por quase três biliões de pessoas, com a rainha de Inglaterra, Isabel II, a consentir a transmissão televisiva, mas a ser acusada pelos súbditos britânicos de ter reagido muito tarde à tragédia, por ter mantido os netos na discrição do castelo de Balmoral, na Escócia, ao invés de preferir o Palácio de Buckingham.

Hoje, o interesse sobre a vida de Diana continua bem vivo em todo o Mundo. Na imprensa, sucedem-se os artigos sobre a malograda princesa. E não faltam empresas, particularmente nos Estados Unidos, onde era muito apreciada, que mantêm a produção de bonecas que são autênticas sósias de Lady Di. De Inglaterra surge a reação de Richard Fitzwilliams, relações públicas britânico e comentador de assuntos relacionados com a realeza. “Diana deixou um legado de caridade enorme. Os seus feitos durante a sua curta vida incluem a campanha contra as minas terrestres, o seu trabalho em prol dos portadores de HIV/Sida e as campanhas pelos sem-abrigo”, começa por referir. “Estava infeliz na sua vida pessoal e era uma pessoa de contradições. Mesmo assim, vinte e cinco anos depois, permanece única.”

O comentador de realeza Richard Fitzwilliams recorda o legado da princesa na área social
(Foto: DR)

E como ficou a família real depois da tragédia de Paris? “A família real muda e reinventa-se a si mesma periodicamente. Tem uma linha inquebrável há mais de mil anos. A sua aposta na informalidade foi influenciada por William e Harry, com campanhas em prol da saúde mental. Mais importante, os herdeiros do trono puderam casar por amor e para Carlos foi mais complicado, depois de se casar com Diana, levou aquilo que conhecemos como um pesadelo.”

Sarah Ferguson, duquesa de York e amiga de infância de Diana, lembra a princesa, 25 anos depois do seu desaparecimento. “Penso sempre na minha amiga e sorrio. E sempre com agradecimento pelo seu apoio e amizade. Ela foi uma inspiração e tão única”, diz à NM.

Sara Ferguson, duquesa de York e melhor amiga da princesa, lembra Diana “com um sorriso”
(Foto: Gerardo Santos/Global Imagens)

De volta à piscina dos Bombeiros de Agualva-Cacém, as águas estão longe de ser tão agitadas como as que a princesa de Gales conheceu, sobretudo nos últimos tempos de vida. Os voluntários acreditam que a nossa reportagem poderá fazer com que a ligação da Princesa do Povo à corporação ganhe finalmente a dimensão pública que sempre desejaram. “Quando a princesa morreu, entendeu-se fazer-se uma homenagem, atribuindo o seu nome a uma das viaturas que iam ser inauguradas. Estava ainda previsto descerrarmos uma placa lembrando o facto de ela ter passado por cá. Mas isso não aconteceu. Agora, a propósito dos 25 anos da morte da princesa, daremos eventualmente cumprimento a essa intenção”, promete o presidente Luís Batista.

Os 25 anos da morte de Diana serão o mote para os bombeiros descerrarem uma placa de homenagem a Lady Di
(Foto: Paulo Spranger/Global Imagens)

O testemunho das antigas primeiras-damas

Manuela Ramalho Eanes e Maria Cavaco Silva aceitaram associar-se à nossa reportagem, através de dois testemunhos, escritos pelo próprio punho, sobre a princesa de Gales. A primeira assistiu ao casamento dos príncipes, em julho de 1981, na companhia do marido, António Ramalho Eanes, na altura presidente da República. Em 1987, Maria Cavaco Silva esteve ao lado do então primeiro-ministro, Aníbal Cavaco Silva, na receção aos príncipes de Gales.

Maria Cavaco Silva: dois momentos com a princesa Diana

“Nas cerimónias solenes em Windsor, em 1986, para celebrar o sexto centenário da assinatura do Tratado de Windsor, com a presença da rainha e do nosso presidente da República, Mário Soares, ficara acordado que no ano seguinte se comemorariam em Portugal os 600 anos do momento-chave da Aliança entre Portugal e Inglaterra, o casamento do nosso rei D. João I com Filipa de Lencastre, com a presença dos Príncipes de Gales, Carlos e Diana.

Em 1987, coube à família do primeiro-ministro, meu marido, acompanhar o casal real e alguns momentos especiais foram organizados para honrar a presença entre nós dos ilustres visitantes.

A princesa Diana com Maria Cavaco Silva, o príncipe Carlos e o então primeiro-ministro, Aníbal Cavaco Silva
(Foto: Arquivo)

Decidiu-se que Sintra era obrigatório – Lord Byron, claro – e pedi à minha filha Patrícia que nos acompanhasse para fazer a ponte entre gerações e porque fala muito bem inglês.

Fomos recebidos pela diretora do Palácio da Vila, à época a doutora Matilde de Sousa Franco, e a visita correu sem incidentes, exceto o de uma borla, que devia ter puxado um pano e não puxou nada, e que ficou nas mãos do futuro rei de Inglaterra.

À saída havia um grupo de cidadãos britânicos entusiasmados, que agitavam bandeiras e queriam cumprimentá-los. Diana avançou de mãos estendidas e sorriso acolhedor, mas o príncipe Carlos ficou para trás com um ar ligeiramente constrangido. Foi um sinal, que não esqueci, do que viria mais tarde a acontecer.

O outro momento, a que achei muita graça, foi no Porto, no jantar de cerimónia no Palácio da Bolsa. Achei que Diana era uma criança tímida que tentava adaptar-se a um Mundo que não era nada fácil.

A princesa Diana com o então primeiro-ministro, Aníbal Cavaco Silva
(Foto: Arquivo)

No dia seguinte, havia um “Te Deum” na Sé do Porto, presidido pelo bispo do Porto, D. Júlio Tavares Rebimbas. Durante o jantar, as senhoras discutiam o protocolo dos fatos exigido na Sé, pondo a tónica na necessidade do uso de chapéu.

À saída, Diana comentou, como se dissesse uma banalidade sobre o tempo: “I am afraid I have not a hat to wear tomorrow in the Cathedral”. As senhoras entreolharam-se com um ar de quem pensa: “Afinal tantas preocupações para nada”.

De facto, no dia seguinte, as portuguesas estavam todas de casacos compridos – era fevereiro – e Diana apareceu com uma indumentária ligeira, de saia de balão, o que espantou muito por não parecer adequada à solenidade do “Te Deum” e ao frio que fazia.

Maria Cavaco Silva para
(Foto: Gerardo Santos/Global Imagens)

A seguir, os príncipes iam para Toulouse, em França, visitar uma fábrica de aviões. Estava explicado o mistério do vestido.

Achei que Diana era uma jovem um pouco aflita com a tarefa de princesa de Gales e tentava muito acertar e ser bem aceite. Não merecia de maneira nenhuma o que a curta vida lhe reservou.”

Manuela Ramalho Eanes: “Conheci-a no dia do casamento”

“Conheci a princesa Diana só no dia do casamento. Com 19 anos sonhou com um casamento feliz com um homem que já tinha uma relação com outra pessoa, casada com outro homem que – parece – não se incomodava com essa situação.

Era uma jovem bonita, com um ar tímido, que sonhava ser feliz com o seu príncipe. Depressa descobriu que não era assim.

Entretanto, a comunicação social começou a endeusá-la porque era bonita, tinha sempre um sorriso, vestia-se com elegância, e além dos atos oficiais começou a descobrir o outro lado do Mundo. As crianças, os pobres, os deficientes e até a terrível questão das minas, que teve uma enorme repercussão quando foi a África. Encontrou-se com a Madre Teresa de Calcutá, com quem tive também a bênção de estar em Lisboa.

Manuela Ramalho Eanes
(Foto: Jorge Firmino/Global Imagens)

O casamento foi uma cerimónia lindíssima e ficámos ao lado do presidente Miterrand e da mulher. Os brindes foram com vinho do Porto. E, num jantar na véspera, na mesma mesa, pudemos conversar com o presidente Delors, que, na minha opinião, foi o presidente da Comissão Europeia mais importante.

Por último, tenho pena que tivesse sido mal aconselhada com a questão daquela entrevista [ao programa “Panorama” da BBC]. Entendo que a nossa intimidade – por mais dolorosa que seja – deve ser um sacrário.”