Jorge Manuel Lopes

O lápis de John Steinbeck


Crítica de literatura, por Jorge Manuel Lopes.

O tempo tem tratado bem a escrita panorâmica de John Steinbeck. O autor californiano, nascido há 120 anos neste 27 de fevereiro, era magistral num registo de secura realista, ocasionalmente salpicada com humor. Pintava com drama e compaixão q.b. narrativas em que os protagonistas pertenciam às classes trabalhadoras, homens e mulheres que moldavam a terra, muitas vezes explorados por um sistema que os destratava. Steinbeck deixou testemunhos sombrios e profundamente humanos da devastação económica e social trazida pela Grande Depressão em obras como “A um deus desconhecido” (1933), “Ratos e homens” (1937) e “As vinhas da ira” (1939). Depois da Segunda Guerra Mundial, a sua escrita apontou em direções mais vastas, com uma leveza trazida pela experiência. Tornou-se épica em “A leste do paraíso” (1952) e mais interior em “O inverno do nosso descontentamento”, publicado em 1961, um ano antes de colher o Nobel da Literatura, sete anos antes de partir.

No macro dos assuntos do Mundo e da Humanidade também urge haver espaço para o micro. Em “Journal of a novel: The east of eden letters”, publicado postumamente em 1969 e formado por uma série de cartas que Steinbeck endereçou ao seu editor durante a criação de “A leste do paraíso”, lê-se esta consideração acerca dos seus hábitos de trabalho: “Sabe, eu sou mesmo estúpido. Durante anos procurei o lápis perfeito. Encontrei alguns muito bons mas nunca o perfeito. E o tempo todo o problema não eram os lápis, mas eu”.