Nuno Maulide. O cientista que quer descomplicar a Química

Nuno Maulide é professor catedrático e investigador

O português Nuno Maulide é um prodígio com o dom da comunicação, um autêntico fenómeno que saltou para a ribalta por querer desmistificar a ciência.

Estava no 12.º ano, a música era caminho certo, mais do que decidido, o sonho de ser pianista profissional na algibeira, uma vocação evidente. Não queria ir para a universidade, mas concorreu ao concurso de acesso ao Ensino Superior só porque sim (depois cancelou a matrícula) e haveria de ser isso a ditar-lhe um futuro que estava longe de estar escrito em fórmulas. De uma mente brilhante, capaz de descomplicar a Química Orgânica para o cidadão comum, eleito Cientista do Ano na Áustria em 2019, onde vive há quase dez anos, Nuno Maulide é um produto do talento e de bonitos acasos. Tem conquistado largos auditórios, muito graças ao livro “Como se transforma ar em pão?”, que lançou em dezembro em Portugal e que o catapultou para a ribalta.

“Queria muito retribuir à sociedade, que tem uma impressão errada do que é a Química, queria desmistificar. Sempre quis ensinar coisas complicadas, fazendo-as simples.” É o que tem feito. Mas voltemos ao princípio. Filho de dois médicos, a Medicina era caminho óbvio, sobretudo para um aluno brilhante que bem sentia essa pressão, mas que sabia não estar talhado para ser clínico. Quis seguir música na Escola Superior de Música de Lisboa (sempre estudou piano durante os anos de escola, também praticava ginástica no Sporting), num alvoroço familiar de quem temia que se desgraçasse, que “desperdiçasse o potencial intelectual” e “acabasse a tocar piano num cabaré”. Foi contra a vontade dos pais, mas a exigência de um treino muito rígido e solitário, sem rotinas, trocou-lhe as voltas. “Ao fim de poucos meses percebi que não ia fazer o curso de piano, não aguentava três anos daquilo.” Quis, afinal, ir para a universidade. Tinha entrado em Química, no Instituto Superior Técnico, curso escolhido na altura ao calhas, por gostar da disciplina. E um fenómeno acontecia: descobriu a Química Orgânica. “Faz-se com desenhos, tem uma componente artística e de intuição. Não tenho que decorar nada, é um jogo de lógica, parecido com cozinhar. Isto reage melhor com isto.”

Ficou de tal maneira viciado que passava horas na biblioteca a explicar aos colegas, fez cadeiras dos anos seguintes por antecipação, acabou o curso com média de 18, teve 20 no estágio final, ainda hoje a “sebenta do Maulide” rende fotocópias para os mais jovens alunos. Os professores punham-no num pedestal, mas percebeu, ao ler uma revista sobre Química Orgânica do ano em que nasceu, 1979, “que não era o suprassumo”. “Li e não percebi nada.” Por isso, fez as malas e foi estudar para Louvain-la-Neuve, na Bélgica, em Erasmus, a saborear estar por sua conta. Tinha 20 anos, nunca mais voltou, “numa altura em que não era de todo comum ir estudar para fora”. Acabou a fazer aí o doutoramento, a convite de um professor, mas só porque conquistou uma bolsa. Seguiu-se o pós-doutoramento em Stanford, na Califórnia, e começou a carreira de investigador, qual sorte grande, no prestigiado Instituto Max Planck, na Alemanha. “Só o consegui por ter conhecido o Benjamin List [Nobel da Química em 2021] num congresso em 2006. Deixei-lhe uma impressão tão forte que dois anos depois ele foi à procura do meu e-mail para me perguntar se queria concorrer ao lugar de investigador no Max Planck.”

Estreou-se aí a liderar um grupo de investigação, publicou resmas de artigos nas mais relevantes revistas científicas, conseguiu milhões de euros em financiamento. Uma rampa de lançamento, numa ascensão meteórica, que quase cinco anos depois o levou até à Universidade de Viena, onde se tornou professor catedrático de Síntese Orgânica, aos 33 anos. É ainda o mais novo membro permanente e o único estrangeiro fora dos países germanófonos a integrar a Academia de Ciências austríaca. “Gosto muito de dar aulas, de explicar coisas difíceis, se for capaz de perceber uma coisa muito bem, sou capaz de a explicar de forma simples e intuitiva.”

Nuno Maulide
Localização: Viena, Áustria 48° 12’ N 16° 22’ E (GMT+1)
Cargo: Professor catedrático e investigador
Idade: 42 anos