José Ornelas: o discípulo José

José Ornelas é bispo da Diocese de Leiria-Fátima e presidente da Conferência Episcopal Portuguesa

Sensibilidade social, visão universalista, cultura, muito sentido de humor. Pedra basilar na constituição da Comissão para o Estudo dos Abusos Sexuais na Igreja Católica.

“Um bispo cristão”, diz Anselmo Borges, relevando a centralidade do evangelho na vida de José Ornelas, na linha de Francisco, em contraste com alguma hierarquia católica, “que tantas vezes prioriza o que pouco ou nada” tem a ver com Jesus. “Um homem do Mundo”, acrescenta o padre e professor universitário, experiência acumulada como superior geral da Congregação dos Sacerdotes do Coração de Jesus (2003-2015), líder máximo dos dehonianos, religiosos vocacionados para a obra social em povos e nações de todo o Mundo. “É muito fraterno e com grande sensibilidade social”, afirma Januário Torgal Ferreira. Sabe do que fala: “Conhecemo-nos há mais de 30 anos”.

Presidente da Conferência Episcopal Portuguesa (junho de 2020), cargo elegível, e recém-empossado como bispo da Diocese de Leiria-Fátima cedo demonstrou interesse por outros horizontes: Moçambique (dois anos depois de ter emitido a primeira profissão religiosa, em 1972, partiu em missão), Alemanha, Jerusalém e Itália, onde preparou doutoramento e tomou conhecimento do que é a Cúria Romana. “Todas estas viagens e estadias em lugares muito diferentes deram-lhe uma visão de uma Igreja mundial e variada”, observa Anselmo Borges.

“Defende sempre o pluralismo social e religioso, com enorme abertura ao Mundo e tolerância a posições diferentes”, realça Torgal Ferreira, confirmando as palavras do teólogo. “Um homem muito culto, cientificamente muito competente”, frisa ainda o bispo emérito das Forças Armadas e Segurança, destacando o reconhecimento ao intelectual especialista em Ciências Bíblicas e docente universitário.

“Um homem de palavra.” Januário Torgal recorda uma conversa antiga. Falava-se na altura em José Ornelas para bispo auxiliar do então cardeal José Policarpo. “Bateram-lhe à porta, mas disse que não. E explicou-me a razão: estava comprometido com a congregação dehodiana e determinado em cumprir a missão, como líder máximo da mesma.”

Pedra basilar na constituição da Comissão Independente para o Estudo dos Abusos Sexuais de Crianças na Igreja Católica Portuguesa, aderindo imediatamente à proposta do Papa, garantiu total autonomia ao coordenador, Pedro Strecht. E foi com um cumprimento personalizado que recebeu e saudou, a 26 de abril, os seis elementos do grupo de trabalho.

Não lhe apontam defeitos. José Ornelas solta uma gargalhada. A propósito, conta a anedota da senhora que, acusada de roubar, paga ao advogado duas vezes: por ter convencido o juiz e por ela própria ter ficado convencida. “Quer um defeito? Pouca paciência.” Outro: “E também pouca memória”.

Em funções como bispo de Leiria-Fátima desde março, ainda se sente “acampado”. Entre duas reuniões, confessa a pressa. Mesmo não apreciando a burocracia, sabe que agora terá de remeter contactos para “o gabinete episcopal”.

Apesar do conhecimento recente, Daniel Sampaio anotou já “o ecletismo e a visão universal da Igreja” como marca do bispo. “Um homem com muito sentido de humor”, nota o psiquiatra, salientando “o trato fácil”.

Filho, entre oito, de António Tomás Carvalho e Benvinda de Ornelas, família “simples e humilde, dedicada à agricultura”, estudou no Seminário Menor Diocesano do Funchal entre 1964 e 1967. Desejando ser missionário, pediu para ingressar no Colégio Missionário da Congregação dos Sacerdotes do Coração de Jesus, no Funchal (1967-1969), prosseguindo depois os estudos no Instituto Missionário, em Coimbra (1969-1971). Foi ordenado presbítero da terra onde nasceu, Porto da Cruz, a 9 de agosto de 1981. Trinta e quatro anos depois, foi nomeado bispo de Setúbal. Pelo meio, foi um dos nomes falados para suceder ao patriarca de Lisboa.

“Homem muito cordial, muito simpático, muito educado, com um trato pessoal muito bom”, foi a primeira impressão deixada em Daniel Sampaio. Mas o fundamental veio depois, em eficácia: “Quando surge um problema, procura sempre resolvê-lo”. lm

José Ornelas Carvalho
Cargo:
bispo da Diocese de Leiria-Fátima e presidente da Conferência Episcopal Portuguesa
Nascimento: 05/01/1954(68 anos)
Nacionalidade: Portuguesa (Porto da Cruz, Madeira)