O controlo da respiração e as técnicas de relaxamento transmitem tranquilidade. E a conexão entre corpo e mente traz serenidade perante mudanças tão avassaladoras. De qualquer forma, atenção às posições e aos limites.
Bárbara Pinto tinha feito ioga antes de engravidar, experimentou, não se sentiu muito identificada com a prática na altura, o clique não aconteceu. “Quando fiquei grávida, quis fazer exercício físico, nada que fosse agressivo para o corpo”, partilha. Voltou ao ioga, encontrou a professora certa, sentiu-se bem nas aulas feitas online a partir de setembro de 2020. “Ajudou-me imenso a aliviar as dores nas costas, na parte da flexibilidade, bem-estar, energia. Consegui manter-me ativa também. Só trouxe benefícios.”
A professora dava-lhe exercícios específicos para determinada dor, ajustava sempre que necessário. Mãe de primeira viagem, Bárbara Pinto, de 25 anos, gestora de redes sociais, começou a fazer ioga no segundo trimestre da gravidez e manteve as aulas até às 40 semanas. Alongar as costas, trabalho pélvico, movimentos de flexibilidade das pernas, respiração invertida, a posição de cão e de vaca. “Não podia ficar tanto tempo nas posições”, lembra. Evitava esforços nos abdominais e exercícios que puxavam pelo equilíbrio porque o centro de gravidade tinha mudado. Trabalhava a respiração. “Sabia que estava a preparar o meu corpo de outra forma e tranquilizou-me porque sabia que ia estar mais preparada do que se não tivesse feito nada.” Sofia, a sua bebé, nasceu em abril de 2021.
A gravidez é um estado de transformações hormonais e emocionais constantes, o corpo e a mente têm de se adaptar à nova condição. Marta Fernandes, mentora do MYM Movimento, Yoga, Mulher, fundadora da Escola Be the Change Portugal, em Matosinhos, destaca alguns benefícios do ioga na gravidez. São vários, desde a ligação com o bebé, ao reposicionamento de órgãos. “A consciência dos movimentos respiratórios e relaxamento profundo, que ajudam a aliviar o desconforto e emoções desafiantes. A regulação da circulação sanguínea. A regulação do sistema nervoso. A preservação do alinhamento da coluna e bacia. A promoção do bom funcionamento dos rins, fazendo diminuir a retenção de líquidos e reduzindo o inchaço.”
Natacha Monteiro, professora e formadora de lu jong, ioga terapêutico tibetano, em Fão, Esposende, realça a serenidade que o ioga e a meditação transmitem e que se transfere para o ser que cresce no ventre. Fala como professora e fala como mãe. “Em termos gerais, uma grávida pode e deve praticar ioga.” Melhora a postura, diminui o risco de doenças associadas à gravidez, como o bloqueio de artérias e dores nas costas. É um trabalho do corpo e da mente. Relaxa o corpo e os músculos, liberta tensões e stresses, alivia o peso. Com as devidas reservas. “Existem imensas práticas disponíveis no momento e algumas podem não ser as mais aconselháveis a grávidas devido ao seu alto impacto. É importante a grávida ter um conhecimento prévio de qual o tipo de modalidade escolher para este período delicado e precioso da sua vida.” Conhece bem o lu jong. “É uma prática suave e sem riscos para a mãe e o seu bebé. Isto desde que naturalmente a grávida se responsabilize em ouvir o seu corpo e limitações”, salienta.
Equilíbrio, oxigenação, energia
Eduardo está quase a fazer um ano e Joana Ferreira, a mãe, fez ioga durante a gravidez por zoom, em contexto pandémico. A professora em Portugal, Joana em Londres, onde vive há sete anos, uma a duas vezes por semana. Não era total novidade, já tinha praticado ioga. “Sempre procurei o equilíbrio entre a mente e o corpo”, revela. O ioga foi importante nesta fase. “A importância do respirar, a conexão comigo e com o bebé, uma prática que me fazia ir ao encontro comigo mesma ao final do dia.”
Joana trabalhava numa farmácia, todo o dia de pé, começou a praticar ioga integral no segundo trimestre da gravidez. “Conseguia relaxar em toda a prática, tive momentos muito bons, muito relaxantes.” Pelas 32 semanas, Joana, agora com 30 anos e mãe a tempo inteiro, sentiu o bebé a bater no nervo ciático, vieram as dores, a professora de ioga recomendou exercícios específicos para aquela zona do corpo. As dores aliviaram. “Não é só o equilíbrio na questão da mente, é também focar em zonas que nos doem num determinado momento”, especifica. “Adorei fazer ioga enquanto estive grávida, é uma prática que aconselho e que para mim faz todo o sentido”, diz Joana, acrescentando que, “em cada alongamento mais profundo, aprendemos a respirar”.
No primeiro trimestre de gravidez, até às 16 semanas, é tempo de adaptação às mudanças hormonais, a respiração consciente e profunda do ioga, feita sem os pulmões muito cheios ou muito vazios, dá fluidez ao processo de respirar.
No segundo trimestre, entre as 16 e as 34 semanas, os níveis hormonais estabilizam, já se pode aumentar a força e a energia da respiração, até porque o organismo precisa de muita oxigenação. E a coluna tem de estar alinhada. Na prática do ioga, é sempre aconselhável que a respiração se faça de modo completo, recomenda-se também a respiração pela boca, bastante importante na altura do parto.
Terceiro trimestre, a partir das 34 semanas, reta final da gravidez. O corpo está mais pesado, o que é normal, o foco está no nascimento, como é natural, o ioga tem a tarefa de preparar física, mental e espiritualmente para o grande dia. O máximo de conforto possível com o ioga orientado para a execução de momentos mais demorados de alongamentos, respirações profundas, relaxamento, tonificação dos músculos pélvicos.
Um mês depois do parto, Bárbara Pinto estava novamente a praticar ioga. Sabia que esse período era essencial, que voltar ao normal não era fácil. “O ioga fez com que o meu corpo recuperasse mais rapidamente”, adianta. Sete meses de ioga pós-parto, Bárbara passou para o ioga normal há bem pouco tempo. E Sofia, a filha, começou o mais cedo possível, frequentou aulas de ioga para bebés até fazer nove meses de vida.
Escutar o corpo
Natacha Monteiro fala em sabedoria e consciência. “Geralmente, as grávidas conhecem instintivamente os seus limites, quais os tipos de movimentos que são benéficos e quais os que representam um esforço excessivo para o seu corpo”, assinala. É preciso escutar o corpo, respeitar cada situação, ter sensibilidade para as necessidades do corpo e do bebé, para as limitações e reações.
Eduardo nasceu de cesariana, estava sentado na reta final da gravidez. Joana Ferreira ainda fez vários exercícios para tentar que mudasse de posição. Sem sucesso. Depois do parto, fez apenas uma aula, mas espera retomar o ioga logo que lhe seja possível.
Depois do nascimento do bebé, e dependendo do tipo de parto, nas duas primeiras semanas, aconselham-se apenas exercícios respiratórios. Aos poucos, é importante recuperar uma boa postura, fortalecer as costas, tonificar os músculos. Há técnicas de relaxamento que ajudam a compensar a falta de descanso e a adaptação a uma nova vida. “O retorno a uma rotina de exercício físico deve ser feito de forma gradual e suave”, aconselha Marta Fernandes. O trabalho do ioga na fortificação da musculatura abdominal e do soalho pélvico também ajuda na recuperação pós-parto. “A orientação nas duas semanas após o parto consistirá apenas em exercícios respiratórios. A partir daí, devemos começar a recuperação para uma boa postura, bem como a trabalhar a mobilidade e tonificar os músculos mais profundos. Além disso, fortalecer as costas nesta fase será prioritário”, refere Marta Fernandes.
Natacha Monteiro, por seu turno, sugere aguardar três a seis meses antes de fazer qualquer tipo de exercício físico depois do nascimento. “Muitos canais quebram-se durante o parto e é possível destruir ainda mais canais se não se der tempo suficiente ao corpo para a sua recuperação.” É necessário, em cada etapa, avaliar, perceber o que o corpo pede e a mente precisa em nome do bem-estar da mãe e do bebé.
O que fazer e quando
1.º trimestre de gravidez. Fluidez na respiração, pulmões nem muito cheios, nem muito vazios.
2.º trimestre, mais oxigenação, coluna alinhada.
3.º trimestre, reta final da gravidez, foco no nascimento. Momentos mais demorados de alongamentos, respirações profundas, relaxamentos, tonificação dos músculos pélvicos.
Pós parto
Primeiras semanas, apenas exercícios respiratórios. Depois disso, recuperação da postura, fortalecimento das costas, tonificação dos músculos mais profundos.