Aniversários, batizados, casamentos e bodas. O regresso dos eventos trouxe uma dúvida: é sustentável ter roupa nova sempre que festejamos? Bom para a carteira e para o ambiente, há cada vez mais gente a apostar em vestidos, fatos e calçado com uma segunda vida.
“Da mesma maneira que eu encontrei um vestido que me fez feliz, espero que outra pessoa possa agora encontrar nele a mesma alegria.” Esta é a mensagem deixada por Mariana Gil, de 28 anos, ao dar uma segunda vida à indumentária que utilizou no seu casamento. Na verdade, o vestido já chegou à jovem de Lisboa com uma história. Comprou-o em segunda mão na New Story Bridal.
Assim que soube que ia casar, teve certeza de que a roupa seria comprada dentro deste conceito, já que também no dia a dia opta por comprar roupa usada. “Mas, na verdade, acabei por comprar um que nunca tinha sido usado, porque a antiga noiva vendeu-o por ter engravidado e já não caber nele.” Ainda assim, o vestido estilo princesa vai ter uma terceira história para contar.
Do processo, não há defeitos a apontar. Foi tudo feito na primeira visita. Estava em perfeitas condições. E ainda ficou melhor “servida” do que esperava. O porquê da escolha é simples, afirma: o conceito, o preço e o ambiente. Fica assim resumido.
Tal como Mariana, há cada vez mais noivas a optar pelo mundo da segunda mão. Teresa Simões acredita que é uma tendência em crescimento, que veio para ficar. Ainda que, confessa, “em Portugal, a primeira mão continue a prevalecer”.
Já habituada ao mercado das roupas com uma segunda vida, Teresa lançou-se na criação da New Story Bridal, com showroom em Lisboa, em outubro de 2021. Para trás ficou o “Troca-te”, um evento, mais do que comercial, social, que juntava pessoas que queriam comprar e vender artigos de vestuário usados. No início eram 20 participantes e, nos últimos encontros, chegaram a ser 200.
Uma tendência crescente
Estes números mostram o crescimento da moda em segunda mão. E foram o motor perfeito para que Teresa Simões se lançasse num novo desafio: uma peça que (frequentemente) é comprada e utilizada apenas uma única vez. Os vestidos de noiva. Quase sempre porque a roupa do casamento vem, muitas vezes, de uma tradição geracional, reaproveitando-se o vestido da mãe ou da avó. Para quem não tem essa possibilidade, optar por um serviço como o da New Story Bridal pode trazer uma carga igualmente emotiva. “Desafio as noivas que vendem o seu vestido a deixar um bilhete para a próxima pessoa.”
A nota que acompanha o vestido pode ser um simples “boa sorte” ou a história de amor que aquela peça uniu. O importante é que, além de um vestido, “a compradora leve consigo um valor emocional acrescido”.
Mas o grande argumento de um vestido de noiva em segunda mão é, incontornavelmente, o preço. Dependendo da condição e dos anos, um vestido da New Story Bridal pode custar até metade do original. Teresa Simões tem vestidos a partir de 400 euros, um valor difícil de encontrar nas lojas tradicionais. Mas apesar de os fatores económicos serem importantes, a fundadora da loja lisboeta descreve três tipos de noivas: “temos as que vêm apenas pelo preço, as que escolhem vir pelo conceito de partilhar uma história e há ainda as clientes informadas, que conciliam a sustentabilidade económica com a ambiental”.
E como é que chegaram a este conceito? Teresa afirma que uma grande fatia das clientes procura propositadamente vestidos em segunda mão, mas há também quem esteja apenas a pesquisar ideias na Internet e se surpreenda com o conceito da New Story Bridal. “Há ainda as noivas que chegam aqui depois de correrem as lojas tradicionais e ficarem dececionadas.” Na segunda mão, pela variedade de oferta, com vestidos novos, usados, de anos anteriores ou atuais, quase sempre o vestido de sonho está ali à espreita.
E no mundo dos casamentos, não é só a roupa que pode ser poupada. São cada vez mais as ourivesarias que anunciam a venda de alianças ou anéis de noivado em segunda mão. Depois de uma separação ou de um divórcio, há quem não queira manter memórias físicas do ex-cônjuge e, por isso, opte por dar uma nova oportunidade àquele objeto. Além de, entretanto, rentabilizar uma peça que já não é utilizada.
Cuidar da carteira e do ambiente
Apesar da contínua importância monetária, a questão do ambiente tem sido, cada vez mais, a razão para o aumento de procura por roupa de cerimónia em segunda mão. Para Daniela Oliveira, consócia da Retry junto com Camila Moutinho, 20% dos clientes escolhem a moda de festa em segunda mão por redução da pegada ecológica. Os restantes procuraram poupar na carteira.
A Retry baseia as suas vendas em roupa de luxo e premium em segunda mão, maioritariamente de festa. Surgiu em 2019 e as peças são cuidadosamente selecionadas e categorizadas de A a C, consoante o estado em que se encontram.
O vestuário de cerimónia foi, aliás, o conceito basilar da BigCloset, criada em 2020. Mas, com a pandemia e o cancelamento dos convívios sociais, decidiram expandir para roupa casual. Nem por isso o vestuário de festa ficou esquecido e, este verão, foi o segmento com maior procura na loja online gerida por Vânia Morais e Inês Madureira. “É raro querermos repetir roupa num casamento, num batizado ou numa festa especial, mas é também insustentável comprarmos uma, duas ou três peças por ano que sabemos que usaremos apenas uma vez”, explica Vânia.
Este ano tem sido, aliás, um desafio, dado o regresso dos eventos e a quantidade de casamentos, batizados e festas que muitos têm tido fim de semana sim, fim de semana sim. A solução parece residir em lojas como a BigCloset. “Por um preço mais reduzido do que a venda primária e com um impacto positivo no ambiente, podemos ter um armário diferente em cada evento a que vamos.” Armário, sim. Porque estas lojas não vendem apenas a roupa. Acessórios, como lenços ou bolsas, e calçado de cerimónia, ainda que não sejam os mais procurados, têm tido um aumento de vendas.
Roupa nova é “investimento sem sentido”
Inês Araújo é uma das fãs do conceito. Atualmente soma já sete casamentos em que a roupa em segunda mão da Retry foi a primeira opção. “Investir em roupa nova para eventos especiais, pela sua pontualidade, não faz sentido”, argumenta a portuense de 31 anos. Fica caro, é de utilização única e causa um grande desgaste ao Planeta. Para Inês, estas três razões levaram-na a ficar rendida às peças com uma segunda vida.
No início, pensava que não tinham qualidade. E, por isso, durante anos, resistiu ao conceito. Mas já não parece haver o estigma de outros tempos – nem em Inês, nem na maioria dos compradores. “As pessoas afirmam orgulhosamente que compraram em segunda mão, pois sentem-se bem por terem poupado dinheiro e estarem a ser mais sustentáveis”, afirma Daniela Oliveira, da Retry.
E valores? A consócia exemplifica: “um vestido de 300 euros pode estar disponível na nossa loja por apenas 90, sempre com a garantia de que passa por uma rigorosa seleção e uma categorização do seu estado”. Para Inês, há ainda um último ponto diferenciador: a apresentação. “Só via lojas online em segunda mão com fotografias caseiras, sem qualquer cuidado. Na Retry é diferente. Parece que se está a comprar numa qualquer loja de retalho mundialmente conhecida.”
Comprar, alugar ou vender
Apesar de a moda feminina continuar a ser a grande aposta e procura, também há opções de vestuário de cerimónia para homem e criança. Será o próximo passo da BigCloset, já que recebem questões diárias sobre se estão disponíveis conjuntos infantis ou fatos masculinos. Brevemente estarão.
Além da compra, o aluguer de roupa começa a ser um conceito também em crescimento. A opção está disponível na BigCloset, sendo o preço o fator chamativo. Por uma ou duas dezenas de euros, um vestido no valor de mais de 300 euros pode ser levado a uma qualquer festa.
E a venda de produtos também tem feito sucesso. As peças chegam agora a ser em terceira ou quarta mão, sem comprometer a qualidade. Na New Story Bridal, destaca Teresa Simões, são mais as pessoas a querer vender do que a comprar. “Querem aproveitar as peças que têm paradas em casa para rentabilizar, ainda para mais numa época que se avizinha difícil economicamente.”
Inês Araújo, a portuense consumidora habitual de moda em segunda mão, corrobora, apontando estas lojas como uma das soluções para contornar a inflação. “Estamos a entrar num momento de recessão mas, se pudermos, não devemos deixar de ir a um evento especial de quando em vez.” Com a roupa em segunda mão, sublinha, a “festa fica feita”. Por um preço reduzido para a carteira e para o Planeta.