Aos 53 anos, Francisco descobre que tem cancro do rim. O choque e a superação

A vida de Francisco Rodrigues virou de pernas para o ar quando descobriu que tinha cancro do rim, mas sabia que tinha de seguir em frente

É um dos dez tipos de cancros mais comuns do Mundo. Em 2020, foram diagnosticados 1191 novos casos em Portugal e morreram 524 pessoas. Março é o mês de sensibilização desta doença. A história de uma associação e um testemunho na primeira pessoa.

O mês de janeiro de 2016 ia a meio e Francisco Rodrigues, então com 53 anos, teve um episódio de hematúria, ou seja, sangue na urina. Ecografia, TAC e logo a seguir o diagnóstico, o pior, cancro do rim, carcinoma renal. “Fui ao urologista, na CUF, que me agendou logo a cirurgia e, no início de fevereiro, fiz nefrectomia radical esquerda, retirada da totalidade do rim esquerdo, por laparoscopia. Correu tudo bem e, duas semanas depois, estava na minha vida normal”, recorda.

Em julho, a primeira TAC de revisão e as notícias não eram boas. Os dois nódulos que Francisco Rodrigues tinha, à data da cirurgia, tinham crescido para o dobro e não havia dúvidas de que eram metástases. “Foi um choque muito grande, pois o aparecimento de metástases significava que não havia cura e que a esperança de vida era reduzida”, conta. “Passei a ser seguido no IPO, pois o plafond do seguro de saúde era demasiado baixo (15 mil euros) para poder fazer a terapêutica.” Iniciou os tratamentos.

Dois anos depois, a doença progrediu para os ossos com várias metástases desde a cervical ao fémur. “Em seguida, fiz diversas radio-cirurgias, na Fundação Champalimaud, para aproveitar o seguro de saúde, conseguindo que, desde então, as metástases ósseas tivessem ficado inativas.” Mas houve efeitos secundários: “A radio-cirurgia no ilíaco afetou o nervo ciático e, desde então, fiquei com limitações de locomoção e ando com o auxílio de canadianas.” Na altura da progressão, passou para uma segunda linha de tratamento, o axitinib, terapêutica que tem resultado até agora.

Mais de 50% dos casos são diagnosticados de forma acidental, uma vez que a localização anatómica dos rins permite que o crescimento do tumor passe despercebido, sem sinais de alerta

A vida de Francisco Rodrigues virou de pernas para o ar, mas sabia que tinha de seguir em frente. “Para a superação da doença, especialmente depois do aparecimento das metástases, tenho feito um esforço muito grande de aceitação. É um processo contínuo e infinito… Nunca está completo e fui mudando o meu foco: do tempo de sobrevida que me falta para a qualidade do tempo que me falta e, com isso, tenho tido uma sobrevida mais feliz e que me realiza enquanto pessoa”, diz. “Digamos que o segredo é manter-me ocupado e a pertencer ao mundo dos vivos!”, acrescenta.

Nos dois primeiros anos da doença, fez diversas viagens, algumas de trekking nos Alpes e Pirinéus, conseguiu vencer o circuito dos Annapurnnas, no Nepal, ao subir aos 5.416 metros em trekking. Mesmo depois da progressão para os ossos, continuou a viajar, a última vez foi ao Vietnam. “Só depois de ficar de canadianas é que deixei de fazer viagens, mas, mesmo assim, este ano que passou, ainda consegui passar uma semana no Porto Santo, onde fiz praia”, conta. Tem vários hobbies e continua a trabalhar, não a tempo inteiro. “Mas vou sempre fazendo alguma coisa.”

Neste tempo da doença, dedicou-se de corpo e alma à constituição de uma associação dedicada ao cancro do rim. Em dezembro de 2019, o esforçou deu frutos e nasceu a associação AC RIM, da qual é presidente. Um feito de que muito se orgulha.

Há esperança quando se recebe a notícia de um cancro do rim? “Se o cancro estiver localizado dentro do rim, sim. Existe uma esperança enorme de que o cancro possa não voltar mais e se possa viver uma vida plena. Se houver metástases, significa que as células malignas circulam na nossa corrente sanguínea e isso quer dizer que o cancro pode aparecer em qualquer local do nosso corpo. Nessa situação, a esperança é diminuta pois, mais tarde ou mais cedo, vai haver progressão”, responde.

Até agora ainda não há uma cura para este cancro. As terapêuticas que existem limitam-se a atrasar a progressão da doença

Francisco Rodrigues é claro e direto, não há voltas a dar para contornar o assunto. “Nenhuma das terapêuticas existentes conseguiu, até agora, curar o cancro – as referidas abordagens limitam-se a atrasar a progressão. A taxa de sobrevida ao fim de cinco anos é inferior a 50%. Não há muito a dizer, por isso, temos mesmo de mudar o foco.”

O cancro do rim é uma doença silenciosa, sem sintomas relevantes. A doença diagnostica-se através de ecografia e TAC aos rins. Os sinais podem ser hematúria, sangue na urina, mas também dores na zona dos rins. O diagnóstico precoce é o mais importante nesta patologia. “Na nossa opinião, o que deveria ser feito era uma TAC obrigatória por volta dos 40,50 anos para detetar anomalias nos rins, o cancro de rim ainda localizado e, assim, poupar-se-ia muito dinheiro aos hospitais, uma vez que os tratamentos para o cancro de rim metastizado são extremamente caros”, defende.

A AC RIM tem atuado a vários níveis. Em primeiro lugar, no apoio aos novos doentes, para os quais criou um grupo de WhatsApp com o objetivo de promover a entreajuda. “Os doentes chegam à associação completamente perdidos e com os nossos conselhos, resultantes da nossa experiência, ajudamo-los a serenar e a posicionarem-se perante a doença. Por outro lado, temos feito um grande esfoço no sentido de chegarmos à classe médica, principalmente urologistas e oncologistas, para dar a conhecer a associação e para que possam reencaminhar os doentes para nós”, refere Francisco Rodrigues. Além disso, há informação sempre atualizada no site e nas páginas no Facebook, Linkedin, Twitter e Instagram da AC RIM, onde podem ser encontrados conteúdos sobre a doença, as novas terapêuticas e todo o género de notícias relacionadas com o cancro do rim.