Vem do lado materno os pergaminhos antifascistas. Ângelo Santos, militante comunista e referência familiar, contava aos netos histórias dos dias vividos em cativeiro, na prisão do Aljube. E também relatos de glória nos estádios, enquanto jogador de futebol, esquerdino da CUF.
No dia em que fez 14 anos, filiou-se na Juventude Socialista. A ideia germinava desde 1985, tinha nove anos, marcado pelo embate entre Mário Soares e Freitas do Amaral nas eleições presidenciais realizadas já em janeiro de 1986. Os dois candidatos dividiam a escola ao meio. “Em vez de trocarmos cromos, trocávamos autocolantes”, relembrava em 2020, na TSF, em “Uma questão de ADN”. A mãe, num gesto raro, levara-o, juntamente com os irmãos, a celebrar a passagem do histórico socialista à segunda volta. António, o mais novo, empunhava a bandeira do MASP que João, o mais velho, guardava para as ações de campanha que viriam.
António Mendonça Mendes nasceu numa família politizada. Vem do lado materno o sangue de esquerda, os pergaminhos antifascistas. Ângelo Santos, militante comunista e referência familiar, contava aos netos histórias dos dias vividos em cativeiro, na prisão do Aljube, testemunhos de resistência transmitidas ao neto mais novo em caminhadas pelos pinhais da Marinha Grande. E também relatos de glória de um avô jogador de futebol, esquerdino da CUF, com direito a cromo da bola, talento que um olheiro do Sporting chegou a cobiçar. Mas é da avó, seguidora indefetível dos jogos do Sporting, que vem a paixão desportiva pelos leões. O ramo paterno, ligado ao antigo regime, fez o contraste e determinou que o casamento dos pais, advogado e professora, não fosse familiarmente pacífico.
Tinha quatro anos quando se deu o divórcio. Mãe e filhos formaram desde então “um grupo muito unido, o grupo dos cinco”, referiu ainda à TSF, num programa em que participaram também os irmãos Pedro, o chef responsável pela confeção da maior omelete do Mundo, e Ana Catarina, atual ministra dos Assuntos Parlamentares. “Um bloco” em que todos se dizem de esquerda. Agem de facto, em bloco, desde miúdos, como da vez em que, não podendo participar por não estar ainda no terceiro ciclo, António ofereceu aos irmãos a história com a qual venceram um concurso literário.
“Não se pense que anda a reboque da irmã. Ele tem pensamento próprio e vincado”, dizem camaradas de partido, mas em off, evitando a todo o custo declarações assumidas sobretudo sobre a relação familiar. É ele quem desafia a irmã, única rapariga de quatro irmãos, a filiar -se na Jota, depois de a ver liderar, com dois colegas comunistas, a contestação estudantil à Prova Geral de Acesso. Com a irmã já filiada, haveriam de ajudar a reconstruir a JS em Almada, em despique com a Juventude Comunista, maioritária na vida académica de um concelho marcado por forte corrente interventiva na política, na música e no teatro.
Foi secretário de Estado dos Assuntos Fiscais dos ministros Mário Centeno, João Leão e Fernando Medina, apesar do perfil mais político do que técnico. Foi chefe de gabinete de Ana Jorge, quando esta foi ministra da Saúde de José Sócrates, e de Ana Paula Vitorino, então secretária de Estado dos Transportes. Enquanto líder da Federação de Setúbal ajudou à construção da maioria absoluta conquistada nas legislativas de 30 de janeiro.
“Demonstra uma enorme capacidade de diálogo e de conciliação das várias e legítimas necessidades locais, não se limitando a gerir”, diz Inês de Medeiros. Para a presidente da Câmara de Almada, António Mendonça Mendes “promove a renovação dos quadros e dá sinais muito importantes de modernidade. A distrital apresenta sempre a bandeira da inclusão e a paridade é uma realidade desde 2015”.
No início da carreira de jurista, passou por Macau (Gonçalves Pereira, Rato, Ling, Vong & Cunha) e pelo grupo empresarial Geocapital, de que Diogo Lacerda Machado, o melhor amigo de António Costa, foi administrador. E só um convite para o Governo o impediu de colaborar com o escritório de António Pinto Ribeiro. “É um belíssimo jurista, grande trabalhador, lúcido e responsável”, descreve o ex-ministro da Cultura.
“Costista” convicto, “conhece o partido de cor”, dizem do Rato. Na cadeira que já foi de Mariana Vieira da Silva e de Duarte Cordeiro tem por tarefa promover a coordenação e zelar pelo entendimento e coesão do Governo. Pela imagem pública do Executivo. Substitui um caso polémico, sabendo que o convite de António Costa, aposta alta, quebra uma regra imposta pelo próprio primeiro-ministro em resposta ao “Familygate”. Elogiam-lhe a capacidade de trabalho. E trabalho não lhe vai faltar.
António Veiga Santos Mendonça Mendes
Cargo: secretário de Estado Adjunto do primeiro-ministro
Nascimento: 19/12/1976 (45 anos)
Nacionalidade: Portuguesa (Coimbra)