Alexander Dugin: o neofascista

Alexander Dugin é cientista político e filósofo russo

Ator de bastidores com ambições de estrelato ou guru de Putin? A resposta não é taxativa. Sabe-se, porém, que recentemente exigiu 500 euros por entrevista a órgãos de comunicação ocidentais.

O homem que em 2014 – o ano em que a Federação Russa anexou a Crimeia e promoveu no Donbass uma guerra civil – proclamou, em vídeo enviado a seguidores, “matar, matar, matar [ucranianos], não pode existir qualquer diálogo, chega de conversa” chora hoje as mortes da filha e da neta, assassinadas a 23 de agosto num atentado terrorista que Moscovo atribui a Kiev, e Kiev ao Kremlin.

Com a mão a encobrir-lhe o rosto, o filósofo russo curva-se perante o caixão aberto de Darya. A comentadora política seguia as pisadas ideológicas do progenitor: o neofascismo, o ocultismo, o antissemitismo, as simpatias neonazis. E, sobretudo, o eurasianismo, base para o imperialismo pós-soviético, apresentado por Alexandre Dugin em Fundamentos de Geopolítica. O tratado neofascista, publicado em 1997, é talvez o livro que maior influência exerceu sobre as elites militares durante o período pós-comunista. “Todo o conteúdo da Modernidade é satanismo e degeneração. Nada vale a pena, tudo deve ser limpo. Tudo está morto com modernidade. Então deve acabar.”

Best-seller, o livro rendeu a Dugin uma carreira académica e a expansão gradual das suas ideias da margem para o centro do debate político na Rússia. Reavivando a “Novorossiya” ou Nova Rússia, expressão usada por Vladimir Putin quando, em 1997, declarou a a Crimeia parte da Federação. “Guia espiritual” do presidente russo, garantem alguns comentadores, de quem disse em 2007: “Putin não tem mais adversários, e mesmo que eles existissem, são mentalmente doentes e devem ser enviados para exames médicos. Putin está em toda a parte, Putin é tudo, Putin é absoluto, Putin é insubstituível”. Ou oportunista político, vendendo o poder que não tem, dizem outros. “Trata-se da caricatura pseudointelectual, não faz parte certamente do sistema decisório”, considerou recentemente Leonid Volkov, aliado de Alexei Navalny, o grande opositor de Putin, preso desde 2020.…

A longa barba, o olhar, seco e penetrante, combinam com o retrato físico de um filósofo louco. Ou, citando, Charles Clover, “de um eremita Dostoievskiano”. O antigo correspondente do “Financial Times” em Moscovo conheceu Dugin. “Porém, na verdade, era um tipo divertido, na moda e fácil de se gostar, bem como um dos intelectuais mais interessantes e com mais leituras que já conheci.”

Que se trata de um neofascista perigoso é consensual. O homem que defende o domínio dos russos étnicos sobre as terras que se estendem “de Dublin a Vladisvostok” nasceu em 1962, filho, neto e bisneto de oficiais militares russos. Jovem brilhante e precoce com um talento para aprender línguas estrangeiras – fala nove idiomas -, integrou um grupo secreto de intelectuais moscovitas interessados em misticismo, paganismo e fascismo, militância que lhe valeria uns meses de cárcere e a o afastamento compulsivo do Instituto de Aviação de Moscovo, onde estudava desde os finais dos anos 1970. Em 1987, durante o segundo ano do período de governo de Gorbachev – para Dugin os anos Gorbachev (1985-1991) representam uma das mais dolorosas derrotas geopolíticas da história milenar da Rússia-Eurásia-URSS -, emergiu como um líder da notória organização nacionalista russa antissemita, Pamyat. Aproveitando a abertura da Perestroika, passou a maior parte do ano de 1989 em viagens por países da Europa Ocidental, fortalecendo laços com figuras da Nova Direita Europeia. Regressou a casa, decidido a fundar um jornal e uma editora, a “Arktogeya”. Da publicação, em 1997, de Fundações de Geopolítica à aproximação ao centro do poder em Moscovo foi um passo curto. Em 2001, tinha já laços estreitos com elementos da Administração Presidencial, dos serviços secretos, dos militares russos e da liderança da Duma. Em 2001, numa entrevista, comenta o desempenho de Putin nas reuniões do G8: “Está esplendidamente percebendo o modelo político eurasiático”. Modelo cujo centro “é o povo russo”. Nessa medida, o conflito na Ucrânia é parte de uma batalha existencial entre a “lassitude do Ocidente e uma sociedade construída sobre tradição, hierarquia e a fé cristã ortodoxa”.

Apesar da rede de ligação ao Kremlin e do eco dos seus escritos, não há fotografia em que apareça ao lado do líder. Tão pouco desempenhou qualquer papel oficial na estrutura do Estado russo ou viajou, dentro ou fora da Federação, com segurança, sinal de uma relevância política relativa. “É um ator de bastidores com ambições de estrelato”, dizem alguns analistas. Exagerará Dugin a sua influência junto do Kremlin para ganhos pessoais, perguntam. A resposta não é taxativa. Sabe-se, porém, que recentemente exigiu 500 euros por entrevista a órgãos de comunicação ocidentais.

Alexandre Gelievitch Dugin
Cargo:
cientista político e filósofo russo
Nascimento: 07/01/1962 (60 anos)
Nacionalidade: Russa