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Ramirez: cinco gerações conservadas pelas latas

Fotos: Igor Martins/Global Imagens

As primeiras latas não continham o nome da marca (Foto: Igor Martins/Global Imagens)

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A caminho da sexta geração Ramirez no negócio das conservas, a genética é o segredo da longevidade e a inovação a via para o sucesso. Uma história que começou há 168 anos no Algarve e que agora se escreve no norte.

Ia o século XIX a meio e, entre guerras e conflitos no país vizinho, Sebastian Ramirez foge para Portugal. Uma fábrica de juta e de conservas de peixe em sal, duas matérias abundantes em Vila Real de Santo António em 1853, foram o início. Hoje, passado mais de século e meio, o legado está marcado na parede da que é considerada a “sala oval” da fábrica Ramirez, sediada atualmente em Lavra, Matosinhos. Quatro gerações de liderança nas conservas de peixe, homenageadas em retratos, que já têm sucessão na família.

A primeira unidade da Ramirez situava-se em Vila Real de Santo António

Da primeira unidade fabril, no Algarve, à atual em Matosinhos houve mais cinco, em Olhão, Albufeira, Setúbal, Peniche e Leça da Palmeira (Matosinhos). Agora, resta a fábrica que aloja toda a produção da Ramirez, contando já com 15 marcas e mais de 200 referências em 55 países.

À frente da empresa centenária está atualmente Manuel Ramirez, o pai. O filho, também assim chamado, representa a quinta geração, juntamente com o irmão Vasco. E o neto, formado em Economia em Barcelona, já quer seguir os passos da família.

Filho e pai, ambos Manuel Ramirez, duas gerações à frente dos destinos da conserveira

“Nasceram-me os dentes com os atuns”, diz Manuel Ramirez, que aos 80 anos tem lúcida a primeira memória que o apaixonou pela indústria. Um atum com mais de 500 quilogramas. “Era tão grande que eu não conseguia ver para o outro lado, por cima do peixe. Nunca mais vi um assim.”

Uma liderança com cinco décadas

Foi ainda na adolescência que começou a pisar os corredores da fábrica, na altura, em Leça da Palmeira. “O meu pai levava-me quando havia serão e fui-me embrenhando no negócio.” Que nunca mais largou. Especializou-se na Alemanha, trabalhou no Reino Unido e ainda estudou em Paris. Aos 22 anos, o pai “fez a marotice” de o mandar para Monte Gordo tomar conta da unidade fabril. Foi o primeiro contacto profissional com a empresa que hoje, passadas quase cinco décadas, ainda lidera.

Transporte de atuns da lota para a fábrica, ainda situada no Algarve

A quinta geração seguiu as pisadas familiares. “Os meus filhos cresceram aqui e estudaram todos fora, tal como eu e o meu pai.” E Manuel Ramirez, o filho, também tem a memória marcada pela indústria das conservas: “A primeira lembrança que tenho é olfativa, do cheiro intenso do peixe”.

Genética, longevidade e inovação

Para o administrador orgulhoso da nova geração, a longevidade tem parte do segredo na genética. “Temos tido gente à altura em todas as gerações.”

Sebastian Ramirez “teve a ousadia de começar”. Já a segunda geração, com Manuel Ramirez, avó do atual administrador, foi pioneira na internacionalização e na criação de novas marcas. Com Emílio Ramirez surgiu o futuro a norte, abrindo a fábrica de Leça da Palmeira em 1945. Depois são tomadas as rédeas por Manuel Ramirez, responsável pelas inovações que marcam grande parte do nome da empresa.

Atum e sardinha são as principais conservas da Ramirez

Hoje, são várias as marcas centenárias agregadas à Ramirez, entre elas, as líderes de mercados internacionais, como a Cocagne ou a La Rose. Nomes que foram sendo oferecidos, comprados ou criados pela família Ramirez. Os produtos são tão ou mais variados como o Mundo abrangido pela empresa – atum e sardinha são os clássicos que iniciaram a história, mas há cavala, bacalhau, lulas, polvo, mexilhões e anchovas. À procura de inovar, a conserveira decidiu ainda produzir refeições prontas a consumir, como bacalhau com grão ou atum assado à algarvia.

A lata de abertura fácil, hoje globalizada, surgiu pela mão do atual administrador. Foi também o primeiro a trazer um frigorífico para a indústria agroalimentar em Portugal, ainda antes da Revolução de Abril. A novidade na refrigeração permitiu avanços a nível laboral. Manuel Ramirez afirma ter sido o primeiro a implementar a jornada de oito horas de trabalho por dia.

A fábrica tem uma creche para os filhos dos funcionários

Com base nas necessidades, criar sempre foi a solução. Desenvolveram a primeira máquina de desencabeçar sardinhas, abriram o Cenutra – Centro de de Nutrição Ramirez, que promove a alimentação saudável, e produziram o Tunacol e o Tunafunctional, pensados para melhorar a saúde. Também inovadora é a creche, aberta desde Vila Real de Santo António. “A creche aparece com um propósito histórico, porque antigamente só se trabalhava quando havia peixe. Tocava uma sineta e iam todos trabalhar. Criou-se a creche para esses momentos. Agora tem um significado social.” Quem o explica é Fernando Machado, antigo gerente da marca, amigo e braço-direito do líder da conserveira.

Os dois conheceram-se na primeira fábrica a norte. “Foi preciso um gerente e eu fiz uma coisa impensável na altura, que foi não ir buscar o empregado mais velho da empresa.” Chamou Fernando Machado para a gerência e, desde então, são amigos inseparáveis.

Mas a história de Machado na Ramirez começa muito antes. Mais precisamente a 9 de janeiro de 1969, segunda-feira. Lembra-se como se tivesse sido ontem. “O mais difícil é que passaram 50 anos demasiado depressa.”

Fernando Machado, antigo gerente, esteve 50 anos na empresa

Entrou aos 29 anos na fábrica de Leça da Palmeira, ainda com Emílio Ramirez na liderança, e a reforma chegou aos 79, já na unidade em Lavra, que ajudou a “erguer”, como gosta de lembrar. Manuel Ramirez reclama: “Não pediu autorização para ir para a reforma, porque eu não o deixava ir, não quero que ele morra”. E Machado não saiu da fábrica. Aos 81 anos, continua à frente de formações e palestras.

Nome: Ramirez 1853
Atividade: Conservas de peixe
Data de fundação: 1853
Morada: Rua do Passadouro, 135 – Lavra, Matosinhos
Número de funcionários: 220