Miudezas, detalhes da máxima importância

A sustentabilidade tem sido uma das preocupações da moda

São botões e são fechos, são molas e são fivelas, são colchetes e são ilhós, são linhas e são rebites. À vista ou no avesso, ora discretos, ora exuberantes. Uma minudência não é uma simples minudência.

Katty Xiomara sabe a relevância das miudezas da roupa. Exigências da arte, ossos do ofício. “De facto, parecem acessórios insignificantes, mas são de extrema importância, uma peça é o resultado da soma de muitos fatores, desde o design, a modelação, o corte, a confeção, o tecido e todos estes pequenos acessórios.” As minudências têm a sua função e a sua presença. “Um simples botão pode alterar o conceito previamente definido”, realça a designer de moda com ateliê na Rua da Boavista, no Porto. “Depois temos os acabamentos, as costuras interiores e os remates, aqueles que não estando à vista influenciam o conforto que a peça nos pode ou não oferecer e também a sua qualidade e durabilidade.” Os retoques finais linha a linha.

A maior fabricante de botões do Mundo está instalada em Louro, Vila Nova de Famalicão, de onde saem, todos os dias, entre nove a 12 milhões de unidades para marcas como a Armani, Hugo Boss, Valentino, Ralph Lauren, Massimo Dutti, Kenzo. A Louropel, que começou numa cave com duas máquinas de botões em 1966, exporta cerca de 85% da produção, sobretudo para a Europa e Estados Unidos. “Na moda, tal como noutras áreas, todos os detalhes são importantes. E, como tal, os botões são um acessório que vai para além do seu objetivo prático, e ao qual os estilistas dão bastante atenção, fazendo uma escolha cuidada, do tipo de botão a utilizar na criação das suas peças”, observa Hernâni Barros, que se move por diversas áreas da empresa, do aprovisionamento ao setor ambiental. Além de botões, a Louropel fabrica fivelas em vários modelos, formas, cores e materiais. Tem feitios já desenhados, tem uma equipa de design, e satisfaz pedidos personalizados ao gosto de cada cliente. Da mais pequena confeção de vestuário, às maiores marcas da moda.

Também em Vila Nova de Famalicão, a Manuel Sousa Lopes, conhecida pela marca Sepol, fabrica botões desde 1927, é a mais antiga do país a fazê-lo, sem pausas, sem mudança de número de contribuinte, na mesma família há três gerações. Modernizou-se, expandiu o negócio, alargou o catálogo, produz botões, molas, fivelas, colchetes, rebites, ilhós, tesouras, fitas métricas, pompons, e outros acessórios e ferramentas que a moda precisa. Há peças que se fabricam dez milhões de vezes por ano. Tem uma equipa de desenho, desenvolvimento e fabrico personalizado.

“Sem botões não há camisa”, comenta Dinis Lopes, neto do fundador, engenheiro industrial, na empresa há cinco anos e meio. “Na moda, é tudo para ontem, o prazo é muito importante.” A Sepol está preparada para produzir o que é pedido. Na pandemia, os fatos de treino estiveram em alta, a Sepol tinha uma máquina só a produzir ponteiras metálicas, a parte na ponta do cordão que segura as calças e que evita que o fio se desfaça. 2017 foi ano de ilhós e os pedidos não pararam. Depois são botões personalizados com vários furos, os pinos que seguram as etiquetas das meias, as molas com capas gravadas. “A nossa vocação está muito direcionada para o que o design pede”, resume Dinis Lopes.

Miguel Vieira usa botões e fechos personalizados desenhados no seu ateliê em São João da Madeira, produzidos por quem percebe da arte. O estilista dedica toda a atenção a essas miudezas. “Dou muita importância às matérias-primas, aos acessórios e detalhes.” Ir à máquina de lavar 10, 20, 50 vezes e manter a qualidade é pormenor que não descuida. “São pequenos detalhes, que não são visíveis a olho nu, e que fazem com que a pessoa fique dedicada à marca. Têm 100% de importância.”

Atilhos, trespasses, sobreposições

“Um fecho torna uma peça básica numa peça fora do comum.” Paulo Brandão, comercial e empresário, fabrica fechos de correr há 20 anos na Emyzipper, em Ermesinde. As marcas pedem, a fábrica faz. A maquinaria está calibrada para produzir tudo, de fechos de quatro centímetros a metros de comprimento, em espessuras de pelo menos quatro milímetros. Um milhão de unidades por ano, sobretudo para industriais portugueses de confeção que trabalham para nomes internacionais. Paulo Brandão é também representante de uma marca de linhas alemã.

O fecho tem a sua função e pode ser um elemento de destaque numa peça. “Independentemente da sua utilização quase obrigatória, muitas vezes, é usado como peça decorativa”, diz Paulo Brandão. Na roupa, no calçado, nas carteiras de senhora.

A sustentabilidade tem sido uma das preocupações da moda. O osso e o corno de boi são as matérias-primas mais antigas para produzir botões. A Louropel já incorpora materiais reciclados e naturais como borra de café, casca de arroz, sêmola de trigo, papel reciclado. “A Louropel, ao longo destes anos, desenvolveu e utiliza uma tecnologia amiga do ambiente, que promove e permite a incorporação no produto final, como algodão reciclado ou resíduos resultantes dos outros processos de fabrico internos”, adianta Hernâni Barros. A Sepol usa corozo, coco, madeira, madrepérola, e produtos recicláveis como aço inoxidável, latão, nylon.

Katty Xiomara aborda a questão ambiental, o cuidado na escolha dos materiais. “O design das nossas peças evoluiu no sentido de ter cada vez menos acessórios plásticos ou metálicos, tentando eliminar, por exemplo, o uso de fechos, substituindo-os por atilhos, trespasses e sobreposições.” Botões em materiais biodegradáveis, o interior das peças confortável e limpo, “escondendo” as costuras.

Miguel Vieira gosta de surpreender do avesso, do lado que não se vê, um bolso no interior que não se estava à espera de encontrar num casaco, forros estampados em calças de homem e senhora completamente lisas por fora. “Detalhes que o cliente vai descobrindo lentamente.”

A Emyzipper faz todo o tipo de fechos. O fecho invisível, que funciona ao contrário, dentes para dentro, tecido para fora, muito usado em roupas de cerimónia, vestidos de noiva, vestidos de gala, saias, blusas, em tecidos mais finos como a seda. Fecho de nylon com quatro milímetros de espessura. Fecho metálico simples ou com acabamentos em dourado, prateado, oxidado. O que o cliente pede, o cliente tem. Nas cores, igualmente. O catálogo tem 160 cores, a Emyzipper trabalha qualquer tonalidade. As empresas esperam cores diferentes, adaptamo-nos a esse colorido, recorremos a tinturarias.” Opções não faltam para abrir e fechar. “Moda é moda. Fazemos o que o cliente determina”, sustenta Paulo Brandão. Qualquer minudência para qualquer peça de roupa.