Incontinência urinária. Não é preciso sofrer em silêncio

A incontinência urinária não deve ser entendida como um fenómeno natural do envelhecimento

A obesidade, o tabaco e a diabetes são fatores de risco para a perda involuntária de urina. É um sintoma que não deve ser entendido como normal ou como um fenómeno natural do envelhecimento. As mulheres são as mais afetadas.

A incontinência urinária (perda involuntária de urina) é um sintoma e uma situação extremamente frequente. Em Portugal, afeta mais de 20% da população com mais de 40 anos, de ambos os sexos, sendo, porém, mais habitual em mulheres. A incidência aumenta com a idade, no entanto, pode afetar pessoas de qualquer faixa etária, incluindo jovens. “O facto de ser um sintoma relativamente comum pode contribuir para uma falsa sensação de normalidade, mas é importante salientar que a incontinência não é normal, podendo e devendo ser diagnosticada e tratada corretamente”, refere Ricardo Pereira e Silva, urologista no Hospital de Santa Maria, do Centro Hospitalar Universitário Lisboa Norte.

Há dois tipos de incontinência, a de esforço e a de urgência. A primeira manifesta-se por perdas de urina que acontecem quando há esforços físicos e em caso de tosse ou espirro. A segunda, incontinência de urgência, caracteriza-se por episódios de vontade súbita e inadiável de ir à casa de banho.

As causas e fatores de risco podem ser comuns a ambos os sexos, como a obesidade, o tabagismo, a diabetes e algumas doenças neurológicas. Há ainda fatores obstétricos que desempenham um papel fundamental na origem ou agravamento das perdas de urina no sexo feminino. “Os partos por via vaginal, principalmente de fetos pesados ou quando são instrumentados com fórceps ou ventosa, bem como quando ocorre laceração do pavimento pélvico ou existe necessidade de realizar uma incisão, são importantes fatores de risco”, adianta o neurologista.

Em Portugal, cerca de 600 mil pessoas sofrem de incontinência urinária em várias faixas etárias. As mulheres, entre os 45 e 65 anos, são as mais afetadas

O diagnóstico precoce da incontinência urinária permite um tratamento atempado e melhores resultados. Há, no entanto, obstáculos. “Infelizmente, a vergonha que as pessoas sentem em relação a este assunto leva frequentemente a que a incontinência seja avaliada bastante tarde, quando o doente utiliza já métodos de contenção mais avançados, pensos de grande absorção ou mesmo fralda-cueca, sendo estes casos de mais difícil abordagem pelo urologista”, sustenta.

“Ainda que possa constituir um assunto tabu para muitas pessoas, mesmo em pleno século XXI, é extremamente importante destacar que as pessoas afetadas não têm de sofrer em silêncio, podendo e devendo pedir ajuda médica para resolver o problema”, alerta o especialista. “Uma história clínica e um exame objetivo cuidados, suportados por exames complementares de diagnóstico adequados à situação do doente, permitem um diagnóstico preciso e um tratamento eficaz, com uma elevada taxa de cura.”

A incontinência urinária não deve ser entendida como um fenómeno natural do envelhecimento, mas sim como um sintoma com grave impacto na autoestima e na vida social, profissional e sexual. A promoção de estilos de vida saudáveis, como a atividade física, a perda de peso e cessação tabágica, bem como a fisioterapia pélvica, devem fazer parte das rotinas. Estes são os primeiros passos no sentido da diminuição das perdas e parte integrante do tratamento, permitindo a otimização dos resultados. Quando este tipo de abordagem é insuficiente, indicam-se outras terapêuticas.

Na incontinência urinária de esforço, o exercício físico, a tosse ou o espirro pressionam a bexiga. A uretra é incapaz de permanecer encerrada e há perdas de urina

O tratamento da incontinência urinária deverá ser, em primeira instância, conservador. Segundo o urologista do Santa Maria, para a incontinência urinária de esforço, o tratamento é sobretudo cirúrgico. Para as mulheres que perdem urina com esforços, salvo contraindicação, poderá ser feita uma cirurgia rápida, com bons resultados e uma baixa taxa de complicações. Implanta-se uma pequena fita por baixo da uretra, via vaginal.

A incontinência urinária de urgência é habitualmente tratada com recurso a medicação, em comprimidos, para controlar a bexiga hiperativa que, nesses casos, está na génese do sintoma. “Quando esta não é eficaz o suficiente, poderão ser ponderadas intervenções de segunda linha como a injeção de toxina botulínica nas paredes da bexiga (atualmente realizada, com excelentes resultados, sob anestesia local) ou neuromodulação de raízes sagradas”. Esta última, explica, consiste na colocação de um aparelho, semelhante a um pacemaker cardíaco, que permite modular a condução dos nervos pélvicos, permitindo o controlo da bexiga hiperativa.