A resposta não é linear, não há um sim redondo, depende de vários fatores como a proteína, a gordura, a temperatura, a técnica, os temperos. E, atenção, muita atenção: nada de mastigar partes queimadas da carne ou do peixe.
O processo não é difícil de perceber. Grelhar é uma técnica culinária que cozinha alimentos em lume vivo ou com calor por cima, por baixo ou pelos lados. A transferência de calor acontece por irradiação, quer seja através de grelha ou espeto, em contacto direto com a fonte de calor, que pode ser o carvão, a resistência ou uma chapa. Explicado. Mas o que acontece ao que se cozinha? O que é realmente importante nesta técnica? Será mais saudável?
Duarte Torres, professor na Faculdade de Ciências da Nutrição e Alimentação da Universidade do Porto, investigador dedicado a questões de avaliação dos riscos associados ao consumo de alimentos, coloca as coisas no seguinte ponto. “Comparado com outros métodos de confeção, não é o método mais saudável. Contudo, o consumo de carne ou peixe grelhados, numa ingestão alimentar saudável, com quantidades moderadas, não levanta qualquer preocupação em termos da nossa saúde.” A grande diferença de grelhar comparativamente a outros processos mais suaves, como cozer ou estufar, é a temperatura que a superfície dos alimentos atinge. Numa cozedura não ultrapassa os cem graus, na grelha pode passar dos 200 ou 250. O que significa a formação de determinados compostos com alguma toxicidade quando os alimentos aquecem a altas temperaturas durante muito tempo. No caso da grelha, a gordura que pinga no carvão faz com que se libertem vapores que contêm substâncias tóxicas.
Alexandra Bento, bastonária da Ordem dos Nutricionistas, alerta para essa questão. “Este método de confeção é, muitas vezes, considerado como mais saudável, uma vez que não pressupõe a adição de gordura”, refere. No entanto, há um pormenor que faz toda a diferença. É necessário dominar bem a técnica para diminuir a formação de compostos potencialmente prejudiciais à saúde, sobretudo quando se grelha carne ou peixe com carvão. São compostos que, na verdade, também podem surgir com outros processos e técnicas como assar ou defumar. “Contudo, os seus níveis dependem de fatores como distância da fonte de calor, combustível utilizado, nível de processamento, duração e métodos de cozimento.”
Adaptar a técnica à proteína
Óscar Gonçalves, chef premiado com Estrela Michelin, cozinheiro do G Pousada, em Bragança, concorda. Há vários aspetos a ter em consideração quando se fala em grelhar carne ou peixe e a resposta de ser mais saudável não é tão linear quanto isso. “Depende de como grelhamos, do tipo de carnes, da proteína – uma carne branca sem gordura é saudável, por exemplo -, da qualidade do carvão, da quantidade de sal, dos temperos que colocamos, do tempo de grelha, de uma série de fatores”, enumera. Um grelhado feito como deve ser com uma molhanga cheia de gordura em cima não pode ser.
Grelhar carne e peixe não é a mesma coisa. As temperaturas diferem, se o peixe é gordo ou é magro condiciona a forma de cozinhar, se a carne é branca ou vermelha também. “O tempo influencia o prato”, garante Óscar Gonçalves. Há ainda a temperatura, não se deve ter a carne o dia inteiro fora do frigorífico, mas também não se pode colocar uma peça na grelha demasiado fria. “A temperatura da carne não deve ser muito baixa.” Se é para chegar ao coração da carne ou do peixe, há que ter cuidado neste ponto.
Nada de queimar o que se grelha, evitar a formação de partes carbonizadas, se isso acontecer, removê-las, nunca ingerir o que está queimado ou esturricado. “Desprezar as partes do alimento que poderão ficar carbonizadas, não as ingerindo, uma vez que estas poderão conter propriedade tóxicas para o nosso organismo”, avisa Alexandra Bento. A dose é que faz o veneno, lembra Duarte Torres. A quantidade do que se consome é sempre importante para não levantar preocupações de saúde. “Não há nada que seja completamente inócuo e tem a ver com o nível de exposição a que somos sujeitos”, sublinha. Aconselha-se, por isso, consumo moderado de carne e peixe grelhados ou cozinhados de outras maneiras.
Ervas aromáticas e pouco sal
Há passos e cuidados a ter em consideração para um grelhado saudável. A bastonária da Ordem dos Nutricionistas recomenda temperar a carne ou o peixe antes de grelhar, utilizando, por exemplo, vinho ou vinagre, alho, limão, ervas aromáticas (salsa, coentros, louro, entre outros) e especiarias , como pimenta, colorau, cominhos. E deixar a peça a marinar, no frigorífico. Experimentar não adicionar sal ou apenas uma quantidade muito reduzida. “Assim, poderá saborear o sabor dos alimentos misturados com as ervas aromáticas e especiarias e não tem os malefícios do consumo de sal.”
Duarte Torres sugere fazer marinadas com ervas aromáticas, cerveja, vinho, alho, porque reduzem a formação dos compostos indesejáveis durante a grelha. E também estão comprovados os benefícios de saladas, vegetais e frutas a acompanhar carne e peixe grelhados. “Protegem as células dos eventuais efeitos tóxicos desses compostos”, adianta o professor e investigador.
Não usar qualquer tipo de gordura, manteiga, margarina, banha ou azeite. Alexandra Bento explica porquê. “Mesmo que seja apenas para untar, não se deve fazer, pois ao adicionar gordura estará a fazer um frito em pouca gordura.” Deve-se aquecer a grelha, a chapa ou o espeto, antes de colocar a peça de carne, peixe ou hortícola, e evitar grelhar os alimentos em demasia. Por uma óbvia razão. “Para que possa aproveitar o sabor dos sucos dos alimentos e para reduzir a hipótese de se formarem compostos prejudiciais à saúde”, diz Alexandra Bento. E nunca, em momento algum, colocar a carne ou o peixe ainda com sangue no prato, o alimento pode ainda estar cru e não garantir a segurança alimentar. Afinal, grelhar tem que se lhe diga.
Dicas para bem grelhar
• Temperar, antes de grelhar, com marinadas de ervas aromáticas, alho, limão, vinho, cerveja, vinagre.
• Não adicionar qualquer tipo de gordura. Nada de manteiga, margarina, banha ou azeite.
• Aquecer a grelha antes de colocar a carne ou o peixe a cozinhar.
• Evitar grelhar os alimentos em demasia. As partes queimadas não fazem bem à saúde.
• Não deixar a carne ou o peixe com sangue, o alimento pode estar cru e a segurança alimentar fica em risco.
• Acompanhar a proteína grelhada com doses generosas de saladas, vegetais, frutas. A ciência confirma que estes acompanhamentos fazem bem à saúde.