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Gravidezes não desejadas acontecem. E porque acontecem?

Fotos: DR

O acesso à informação sobre saúde sexual e reprodutiva é um direito fundamental

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As estatísticas revelam que 85 em cada 100 mulheres que não usam um método de contraceção engravidam ao fim de um ano. A Sociedade Portuguesa de Contraceção adianta que cerca de 30% dos jovens ainda não têm acesso à educação sexual. As gravidezes não planeadas são um problema de saúde a nível global.

A gravidez não planeada é um problema de saúde pública global. Segundo um estudo da publicação científica Lancet Global Health, entre 2015 e 2019, em todo o mundo, registaram-se cerca de 121 milhões de gravidezes não planeadas em cada ano. Em Portugal, em 2020, em pleno ano de pandemia por covid-19, contaram-se 1763 nascimentos de mães adolescentes e demasiado jovens entre os 13 e os 19 anos, segundo dados do Instituto Nacional de Estatística.

Porque é que uma mulher engravida de forma não planeada? “Devido à falha de eficácia do próprio método. Não temos métodos de contraceção 100% eficazes, pelo que a gravidez pode sempre ocorrer”, responde Teresa Bombas, especialista em Ginecologia e Obstetrícia, membro da direção da Sociedade Portuguesa da Contraceção. “No entanto, temos alguns dados sobre a eficácia de cada método. Com o uso de métodos de longa duração (implante, dispositivo intrauterino, sistema intrauterino) menos de uma mulher em cada 100 engravida ao fim de um ano de utilização”, acrescenta.

O uso de métodos contracetivos exige a colaboração de quem os utiliza. Os métodos hormonais, diários como a pílula, semanais como o selo, mensais como anel, têm a sua eficácia e nove mulheres, em cada 100, engravidam ao fim de um ano de utilização. Com preservativo, 18 mulheres, em cada 100, engravidam ao fim de um ano de utilização. No método do calendário, 24 mulheres, em cada 100, engravidam ao fim de 1 ano de utilização. Sem contraceção, 85 mulheres em cada 100 engravidam ao fim de um ano sem qualquer proteção.

Em Portugal, 78% das mulheres usam um método de contraceção. Na Europa, 70% das mulheres usam contraceção e apenas 9% não têm acesso a essa proteção

“A gravidez não planeada pode ocorrer, também, por relação desprotegida, ou seja, não utilização de contraceção ou por relação irregularmente protegida, ou seja, usa contraceção, mas irregularmente, por exemplo, esqueceu o preservativo, usou mal, ou falhou a toma da pílula. Pode, também, acontecer pela não utilização de contraceção de emergência nas situações em que verificou que a relação não foi protegida ou foi irregularmente protegida”, refere Teresa Bombas.

Há questões sobre contraceção e saúde sexual e reprodutiva que devem ser claras. As mulheres não devem parar temporariamente o seu método de contraceção hormonal em uso, parar a pílula um a dois meses por ano, por exemplo. Esta paragem não tem benefício para a saúde e coloca a mulher em risco de gravidez. Um método hormonal, como a pílula, usado durante muitos anos não interfere na fertilidade. Teresa Bombas lembra que, atualmente, “muitas mulheres por circunstâncias da sua vida pessoal e profissional deixam a gravidez para uma idade mais avançada (por exemplo depois dos 40 anos) e a fertilidade diminui à medida que a idade avança.”

“Mulheres saudáveis independentemente da idade e paridade (ou seja, se já tiveram filhos ou não) podem usar todos os métodos de contraceção.” Isto significa, por exemplo, que mulheres que nunca tiveram filhos podem usar métodos intrauterinos (dispositivo ou sistema intrauterino); que as adolescentes saudáveis podem usar todos os métodos de contraceção; e que um método hormonal pode ser iniciado (por necessidade de contraceção e/ou controle de sintomas relacionados com a menstruação, dores e fluxo abundante), quando for necessário depois da primeira menstruação (menarca).

“A ideia de que as mulheres utilizam o aborto como método de contraceção está completamente fora da realidade”
Teresa Bombas
especialista em Ginecologia e Obstetrícia

Nos países onde o aborto é ilegal, estima-se que ocorram 223 mortes maternas por 100 mil nascimentos e nos países onde o aborto está despenalizado, 77 mortes maternas por 100 mil nascimentos. Em Portugal, o aborto foi despenalizado em 2007 e a morte materna ligada ao aborto é atualmente residual. O número de abortos tem decrescido progressivamente, situando-se sempre abaixo da média europeia, atualmente 194 por mil nados vivos.

A taxa de aborto é um indicador de saúde pública e reflete o acesso e o uso de contraceção eficaz. De acordo com a lei portuguesa, todas as mulheres residentes em Portugal, portuguesas e não portuguesas, legais ou não legais, têm acesso à saúde reprodutiva, contraceção, aborto, vigilância de gravidez e assistência no parto nas mesmas condições e gratuitamente.

“A ideia de que as mulheres utilizam o aborto como método de contraceção está completamente fora da realidade. A decisão de interrupção de gravidez não é fácil, mas frequentemente está bem resolvida nas utentes, sem complicações emocionais. Frequentemente, os motivos prendem-se porque ‘não é a altura ideal’, ‘o orçamento familiar não é compatível com mais um filho’, ‘a relação não está estável’ ou ‘foi uma relação esporádica não protegida’.”

No mundo, 49% das mulheres vivem em países onde o aborto é ilegal. Na Europa, apenas seis países proíbem o aborto ou permitem em circunstâncias restritas: Andorra, Malta, San Marino, Liechtenstein, Mónaco e Polónia

“Não existe um tipo de mulher que recorre a uma interrupção de gravidez. Esta decisão é transversal a todos os tipos de mulheres independentemente do estatuto socioeconómico. Obviamente existem grupos mais vulneráveis, tais como as adolescentes, mulheres sem acesso ao sistema de saúde e que não fazem um método de contraceção seguro e eficaz”, sublinha Teresa Bombas.

O acesso à informação sobre saúde sexual e reprodutiva é um direito fundamental que permite às mulheres fazerem escolhas informadas sobre as suas vidas. Por isso, é da máxima importância informar e esclarecer sobre as opções disponíveis e aumentar a literacia na área da contraceção, da saúde sexual e reprodutiva, para que a vivência da sexualidade seja segura e plena.